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Abaixo a hipocrisia católica

Ninguém de sã moral e equilíbrio mental se regozija com a desgraça alheia, rejubila com o sofrimento ou exulta com a morte. Às vezes o humor, mesmo o humor negro, é a forma de exorcizar a dor e fazer a catarse das desgraças que batem à porta, do infortúnio que chega ou da tragédia que se abateu.

Só as religiões, na sua demência, se alimentam da morte. Vendem-na em pedaços de medo ou provocam-na em acessos de ódio. Os cruzados e os suicidas islâmicos são o paradigma dos traficantes da morte para obterem uns trocos de eternidade. Nem os cadáveres estão em paz: uns exumaram-nos para serem queimados, outros acordam-se para a indústria dos milagres e a criação de beatos e santos.

O acidente de Fátima foi uma tragédia lamentável, mas não há que dar tréguas à religião que quer condicionar a reflexão que é legítimo fazer. Já em 24 de Março de 2001 um autocarro da Câmara de Viseu, vindo de Fátima, caiu numa ravina, em Santa Comba Dão e provocou a morte de 12 pessoas e numerosos feridos. Sem acidentes, o presidente da Câmara de Vila Nova de Famalicão, de uma só vez, disponibilizou autocarros para 10.200 idosos e, nas eleições seguintes, tinha a vitória assegurada.

Os presidentes de Câmara levam os peregrinos a Fátima para implorarem bênçãos e ganharem votos. Usam o nome da cultura e enviam-nos a um local de obscurantismo.

Ninguém se regozija com os mortos das peregrinações mas há quem os aproveite como mercadoria pia num acto pusilânime de superstição e misticismo. Só os clérigos são capazes de dizer, perante o sofrimento e a desolação: «Fez-se a vontade de Deus». O cinismo dos padres é que desperta a revolta pela exploração do medo e do sofrimento.

Nas exéquias fúnebres não faltará um bispo a explorar o espectáculo mórbido da morte. Far-se-á acompanhar das sotainas disponíveis e não faltarão, como diria o Eça, o «conjunto rançoso de cruzes, imagens, ripanços, opas, tochas, bentinhos, palmitos e andores».

Os ateus limitam-se a registar que há demasiados mortos sem qualquer milagre.