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Eutanásia

O respeito pelos direitos individuais e pela dignidade humana estão a mudar as pessoas. É um processo lento que não acompanha a rápida secularização, umas vezes por cálculo político dos partidos, outras por preconceito e hipocrisia.

A eutanásia é uma palavra que, tal como a morte, parece ser do domínio do obsceno. É preciso que haja coragem para as trazer para a discussão pública, para fazer reflectir os que nunca têm dúvidas e gostam de verdades imutáveis.

Mal se avança num interdito beato e logo o apodo de assassinos carimba os que ousam pôr à discussão assuntos dolorosos ou dramáticos. Invocam Deus, em vão, à espera de que a Idade Média refulja em apoteose por entre fogueiras, torturas e banimentos.

É neste caldo de cultura que ganha relevância a afirmação de João Lobo Antunes, neurologista, membro do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida e mandatário nacional de Cavaco Silva na última candidatura presidencial: «Há situações em que acho que a devia ter feito [eutanásia]».

Não admira, pois, que – segundo um inquérito – 24% dos médicos oncologistas fariam eutanásia e 39% defendem a sua legalização. Estes médicos portugueses são os que melhor conhecem o paroxismo da dor e a crueldade de prolongar o sofrimento inútil.

Claro que aparecem os ressentidos do costume, incapazes de respeitar a vontade alheia, possessos de uma pulsão totalitária que pretendem impor a todos os outros as legítimas convicções que os outros lhes respeitam.

A eutanásia já se encontra legislada em países civilizados que têm pela vida e bem-estar das pessoas mais respeito do que aqueles que se opõem à discussão e que confundem o eventual direito com a imposição da obrigação.

A experiência holandesa é um bom ponto de partida para a reflexão serena e urgente.