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Dia: 18 de Janeiro, 2007

18 de Janeiro, 2007 Ricardo Alves

Portugal está mais secularizado do que a Espanha

O artigo do Semanário que a Palmira citou é um exercício de ficção política que raia a paranóia, e que foi nitidamente concebido para atacar Vital Moreira. Com todo o respeito por Vital Moreira, cujo currículo laicista é impecável, o jornal atribui-lhe duas acções que na realidade tiveram a sua origem em tomadas de posição da Associação República e Laicidade (o pedido de retirada dos crucifixos das escolas, e a nova lei do protocolo, na sequência da tomada de posse do PR). Mais, quando o Semanário atribui a Vital Moreira e aos «jacobinos ex-comunistas e anticlericais» intenções de «perseguir» a ICAR, esquece-se que a nova Lei do Protocolo de Estado é uma consequência directa do artigo 4º da Lei de Liberdade Religiosa, um diploma que levou a assinatura do católico militante António Guterres. E esquece-se também de que a presença permanente de símbolos religiosos em escolas públicas é vedada pela mesma lei e pela Constituição de 1976. Portanto, quando falam em «perseguição» a propósito destes assuntos, é o próprio regime constitucional que colocam em causa.

Mas, adiante. Escrevo este artigo principalmente porque a diatribe do Semanário merece ser refutada num ponto particular: afirma-se que «Sócrates não percebeu que essa deriva anticlerical em Portugal não teria o preço da espanhola (…) porque, ao contrário, em Portugal o peso da Igreja é ainda bastante significativo». O erro que consiste em considerar a Espanha actual «menos católica» do que Portugal é comum. Mas é um erro.

Vejamos alguns indicadores. A percentagem de casamentos realizados pelo registo civil, em Portugal, tem sido superior à percentagem espanhola pelo menos desde 1999, com ambas as percentagens em ascensão. Parece previsível, aliás, que o casamento civil passe a ser maioritário em Portugal já em 2008 ou 2009 (em 2005, a percentagem foi de 45%).

Quanto à percentagem de nascimentos fora do casamento, o cenário é o mesmo. Portugal tem maior proporção de nados-vivos de mãe não casada do que a Espanha, pelo menos desde 1999. Em 2005, Portugal já chegou aos 31%.

Conclui-se que, em Portugal, o afastamento em relação ao modelo de família católico é maior do que em Espanha. Os políticos deveriam meditar no significado político destes factos sociais.

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18 de Janeiro, 2007 Palmira Silva

Campanha de excomunhão – II

As manobras intimidatórias e a chantagem emocional sucedem-se a uma velocidade alucinante. Para além dos folhetos mais indescrítiveis de puro terrorismo psicológico, descubro via Renas e Veados que o cónego de Castelo de Vide e Portalegre, Tarcísio Fernandes Alves, no seu quarto boletim semanal sobre a Interrupção Voluntária da Gravidez, distribuído aos fiéis na missa do passado domingo, avisa que serão excomungados os que votarem SIM e os «que se abstiverem de votar cometem um pecado mortal gravíssimo que os irá impedir de participar na missa».

Acho que, tal como o João Oliveira, vou aproveitar o ensejo para ser retirada dos registos que me consideram católica pelo facto de a minha mãe me ter baptizado com alguns dias de vida. Face ao que explicou o empenhado pároco, espero que a minha desbaptização seja automática mal o pároco de Santos-o-Velho receba a minha carta registada confirmando a minha excomunhão e concomitante pedido para ser retirada da contabilidade que a ICAR esgrime para contar espingardas e exigir benesses. E espero que, a exemplo do que acontece em Espanha, o meu pedido não seja recusado. Suponho ser pouco católico fazer ameaças vãs…

Mas a próxima ameaça anunciada pelo cruzado contra a liberdade de consciência da mulher induz-me um frémito expectante pelas suas consequências. De facto, o pároco afirma que o próximo boletim avisará as católicas que «quem fizer aborto não poderá ter um enterro religioso».

Olhando para as estatísticas internacionais disponíveis sobre a taxa de aborto, considerando que Portugal tem uma taxa de natalidade das mais baixas da Europa e que não há qualquer razão para considerar que cá no burgo a eficácia dos contraceptivos sobe vertiginosamente em relação à que apresenta no resto da Europa, diria que, com base no indicador médio europeu sobre o número de abortos por mulher, no mínimo metade das mulheres portuguesas não terão direito a um funeral religiososo. Por exemplo nos Estados Unidos, com uma taxa de natalidade em 2004 de 2,05, muito superior à nacional de 1,42, em média 7 em cada 10 mulheres faz um aborto.

Na realidade, embora a clandestinidade a que o condicionalismo católico remeteu o aborto não permita qualquer tipo de estatísticas, uma vez que o mesmo condicionalismo e falsa moralidade inibem a educação sexual e o planeamento familiar encontrados nos países livres das teias de aranha religiosas, – que curiosamente são os que apresentam maiores taxas de natalidade na Europa – diria não ser arriscado extrapolar que a taxa de aborto em Portugal deve ser substancialmente superior à verificada nos restantes países europeus – com excepção das ex-Repúblicas soviéticas – e estar mais próxima das estimadas para a América Latina. Países em que todas as mulheres realizarão em média entre 1 a 1,5 abortos ao longo da vida!

Assim sendo, e acreditando mais uma vez que estas não são ameaças em vão, seria útil que os nossos governantes começassem a pensar seriamente na construção de tanatórios em todo o país já que espero que os portugueses não se deixem coagir pelas manobras da Igreja de Roma e o resultado do referendo de 11 de Fevereiro mostre claramente a maturidade cívica e de cidadania nacional!

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18 de Janeiro, 2007 Palmira Silva

Campanha de excomunhão


Que a questão do referendo à despenalização da IVG é encarada pela ICAR como uma guerra sem tréguas, uma forma de pressão política para mostrar aos partidos quem manda em Portugal, é óbvio para todos sem precisarem de ler esta amostra de péssimo jornalismo, que mistura oráculos à la Pat Robertson com a contumaz vitimização católica.

Se alguém acreditasse no monte de disparates que passa por jornalismo no Semanário, só podia esperar de um José Sócrates, que a imaginação delirante do jornalista apresenta como profundamente arrependido, um mea culpa na Conferência o SIM RESPONSÁVEL – a realizar já no próximo sábado, dia 20, no Teatro Camões, Parque das Nações -, pela suposta perseguição à ICAR do seu governo manifesta no referendo que se avizinha! E será desenganado dessa ilusão quando as televisões transmitirem excertos da dita já daqui a uns dias!

Na realidade, a perseguição «implacável» carpida pelo jornalista ao serviço da ICAR e cruzado contra Vital Moreira reduz-se ao cumprimento (parcial) da Constituição. Nomeadamente traduziu-se na recente alteração do protocolo de Estado – episódio que o devoto jornalista descreve como lamentável e uma «humilhação da posição da Igreja Católica»- e na remoção de (alguns) crucifixos nas escolas públicas onde se registaram queixas pela sua presença. Mero cumprimento da lei máxima nacional que a Igreja Católica e seus cruzados, que se acham acima da lei dos homens, transformou numa guerra das cruzetas.

Mas especialmente, de acordo com o devoto jornalista do Semanário, a «perseguição» à Igreja Católica aduz-se da convocação do referendo de 11 de Fevereiro! Isto é, deixar os portugueses decidir sobre um problema de saúde pública e sobre o cumprimento da Declaração dos Direitos do Homem, nomeadamente sobre a liberdade de consciência da mulher, só pode ser uma «perseguição» à Igreja!!

Perseguição a que o Vaticano não podia deixar de responder e traduziu-se na recusa de Ratzinger em visitar o país, mais concretamente Fátima, em retaliação! Concordo plenamente que todos os episódios descritos sejam encarados como «perseguição» pela Igreja de Roma, que se acha no direito de impor a todos os seus dislates e se ulula perseguida quando coarctada nas suas ambições totalitárias e integristas. Mas parece-me um pouco bizarro que o mesmo Ratzinger que se deslocou com pompa e fanfarras à Espanha de Zapatero se recuse por estes motivos visitar o Portugal de Sócrates!

Mas suponho não necessitar a sucursal nacional da Igreja de Roma, que nunca se engana e sequer alguma vez tem dúvidas, da ajuda de Ratzinger para delinear a cruzada pelo NÃO ao referendo.

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(continua)