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Dia: 12 de Setembro, 2005

12 de Setembro, 2005 Palmira Silva

Ontário rejeita tribunais religiosos

Dalton McGuinty, o governador de Ontário, afirmou à Canadian Press que Ontário não será a primeira jurisdição ocidental a permitir que «um conjunto de leis religiosas seculares chamadas Sharia regulem disputas familiares» e banirá todas as arbitrações religiosas na província.

O governador McGuinty anunciou que o seu governo avançará rapidamente com medidas que tornarão ilegais os tribunais religiosos existentes, cristãos e judaicos, possíveis ao abrigo do Acto de Arbitração de Ontario.

«Não existirá Sharia no Ontário. Não haverá arbitração religiosa no Ontário. Existirá apenas uma lei para todos os habitantes do Ontário».

Esperemos que esta seja a última vez que num país ocidental se discute sequer a possibilidade de uma aberração como a Sharia ser aplicada. E devemos agradecer a todos os que se mobilizaram contra a criminosa proposta de Syed Mumtaz Ali, que para além desta barbaridade pretendia ver punidos os apóstatas que preferissem seguir a lei canadiana em vez da Sharia. De acordo com a Sharia a punição para a apostasia é a pena de morte!

12 de Setembro, 2005 Palmira Silva

Brown demite-se

Michael Brown, o controverso mas piedoso director do FEMA, Federal Emergency Management Agency, demitiu-se há umas horas. Não ficou claro se também se demitiu da sua posição de sub-secretário do Departamento de Segurança Interna, Department of Homeland Security, a agência que depois do 11 de Setembro preparou um plano de 426 páginas para coordenar todas as agências nacionais no caso de um desastre, natural ou terrorista, atingir os Estados Unidos. O plano foi revelado com pompa e circunstância em Janeiro último e naufragou com a subida do nível de água em New Orleans.

12 de Setembro, 2005 Ricardo Alves

Multiculturalismo(s): identidade cultural é opressão individual

Na ressaca dos atentados de Julho no Reino Unido (ver este artigo da Palmira) e num momento em que o Canadá poderá estar prestes a reconhecer tribunais que apliquem a chária (ver este artigo da Mariana), verifica-se um questionamento crescente e inevitável do multiculturalismo, um conceito cujo sentido varia bastante.

Na verdade, alguns dos que mais veementemente afirmam «rejeitar o multiculturalismo» são fascistas mais ou menos envergonhados que pretendem aproveitar-se do fanatismo de uma minoria entre os muçulmanos e dos actos terroristas de meia dúzia para promoverem um programa político de uniformização «racial» (no caso dos racistas) ou religiosa (no caso dos clericalistas), que avançaria pela exclusão política e social dos imigrantes. A crítica que fazem do fascismo islâmico é portanto meramente oportunista e releva de intenções tão fascistas (ou clericalistas) como as dos jihadistas. Estas pessoas, quando rejeitam o «multiculturalismo», referem-se a um facto social (a presença de imigrantes e a consequente diversidade cultural) que enriquece as sociedades e as regenera demograficamente.

Numa segunda acepção, fala-se em «multiculturalismo» para descrever um discurso baseado na ideia de que os valores éticos ou mesmo os direitos políticos só podem ser criticados a partir «de dentro» de cada cultura, e portanto por «pessoas dessa cultura». Esta corrente de pensamento defende o máximo de tolerância (no limite, a indiferença) por qualquer prática apresentada com uma caução cultural ou religiosa, designadamente os casamentos forçados ou, em Portugal, a excisão do clitóris. Esta corrente aprisiona os indivíduos à sua identidade cultural ou religiosa de origem, e negligencia todos aqueles que desejam abandonar a religião ou cultura em que foram educados. Pior ainda, entrega a definição dessa religião ou cultura aos seus puristas, ou seja, aos mais integristas (Salman Rushdie acusa disto mesmo o governo britânico). Os produtores desta linha de pensamento são sobretudo académicos e educadores, tão intoxicados de pós-modernismo que são incapazes de olhar para uma pessoa sem verem a «identidade cultural» ou «identidade religiosa» a que essa pessoa pertence acidentalmente. E no entanto, por detrás desses efeitos da educação todos temos os mesmos instintos e necessidades.

Finalmente, a palavra «multiculturalismo» é ainda usada em política para designar os modelos comunitaristas, em que os cidadãos não são tratados como indivíduos iguais em direitos e deveres e destinados a conviver uns com os outros, mas sim como membros de «comunidades culturais» com direitos distintos, condenadas a coexistirem separadamente. Evidentemente, estas políticas legitimam-se com o discurso criticado no parágrafo anterior. A Holanda ou o Reino Unido são exemplos (imperfeitos) de multiculturalismo de Estado, que em ambos os casos foi o sucessor histórico do multiconfessionalismo. Refira-se, concretamente, os tribunais arbitrais islâmicos que neste momento estão em discussão no Canadá, o financiamento público de escolas privadas confessionais (protestantes, católicas, judaicas, muçulmanas) ou a indiferença perante o elogio da violência feito por alguns imãs. Existe um sector importante da esquerda que é politicamente comunitarista, mas alguma direita (mais religiosa ou mais identitária-racista, conforme os casos) está também interessada no separatismo étnico-religioso que lhe conforta os preconceitos e lhe afasta da frente os indesejáveis.

Felizmente, o debate sobre o multiculturalismo está a conduzir muitos à conclusão de que, nestes tempos conturbados, só a laicidade à francesa, com a sua separação clara entre uma esfera pública neutral e uma esfera privada onde se pratica facultativamente a religião, e também com a sua igualdade de direitos entre cidadãos independentemente da religião, poderá responder ao desafio que a integração dos muçulmanos representa. É esse o argumento de Giles Kepel, e Salman Rushdie já concluiu o mesmo. Convém esclarecer que ser racista não é criticar as culturas ou religiões minoritárias, mas sim conferir direitos diferentes (que inexoravelmente separam e discriminam as minorias) a pessoas dessas culturas ou religiões, conforme afirma Maryam Namazie.

Nós, ateus, estamos numa posição excelente para recordar ao mundo que o muçulmano que abandona a sua religião não é nem uma anomalia estatística nem um traidor à sua comunidade. É um indivíduo que exerce a sua liberdade de pensamento. E apenas uma República laica lhe permitirá seguir o seu caminho, livre da opressão identitária e dos mulás que o tentam instrumentalizar.

12 de Setembro, 2005 Mariana de Oliveira

Não à Sharia

Na passada quinta-feira, cerca de quatrocentas pessoas manifestaram-se em Toronto para exigirem que o governo canadiano não permita que questões familiares sejam julgadas por tribunais arbitrais que decidam de acordo com leis religiosas.

Vinte minutos após o início da manifestação, o Procurador Geral canadiano, Michael Bryant, fez o seguinte comunicado: «ouvimos claramente os que procuram maior protecção para as mulheres. Constantemente, temos de seguir em frente para erradicar a discriminação, proteger os vulneráveis e promover a equidade… Somos guiados pelos valores e direitos constantes na nossa Carta de Direitos e Liberdades. Asseguraremos que a lei da nação não seja comprometida no Ontário, que a arbitração que use um conjunto de regras ou leis discriminadoras das mulheres, em questões de família, não será vinculativa».

Esperemos que, em nome da Democracia, este seja um sinal que o governo canadiano recue na intenção de permitir que os muçulmanos recorram à Sharia para regular questões como o divórcio e a regulação do poder paternal.

O segundo protesto internacional contra a instituição de tribunais da Sharia no Canadá também se realizou em Ottawa, Victoria, na Alemanha, nos Países Baixos e na Suécia.