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Momento Zen da Segunda

João César das Neves (JCN) andava a descurar a propagação da fé e a desprezar os santos e rectos caminhos que hão-de conduzi-lo aos altares. Mas é tal o medo do Inferno e do azeite fervente onde mergulham as almas dos réprobos que regressou em força.

Ontem, em entrevista ao DN, comentada pela Palmira em «Momento Zen de Domingo», o bem-aventurado voltou a um dos temas que excitam a ICAR – a homossexualidade.

Hoje, veio ressarcir-se de duas ou três semanas em que perdeu o tempo e o espaço do DN, com assuntos de economia, para mergulhar no recorrente tema da interrupção voluntária da gravidez (IVG).

JCN partilha os pontos de vista da defunta Santidade JP2 e da actual. Tem o mesmo tino que revelaram os piedosos sacerdotes Nuno Serras Pereira (o do anúncio sobre a eucaristia), Domingos Oliveira o medidor da gravidade dos pecados e aquele pároco de Lisboa que exortou os fiéis a votar CDS por ser o único contra o aborto.

Quando afirma que o Governo ameaça impor a descriminalização do aborto na AR, se o povo não concordar, JCN sabe que mente por uma boa causa, capaz de lhe render abundantes indulgências.

No seu maniqueísmo, bebido em Santo Agostinho, JCN atribui um novo referendo sobre a IVG «à honra ferida da esquerda e à infantil fome de desforra», ocultando que há na esquerda partidários do «Não» e quem, na direita, seja adepto do «Sim». Será o deputado Pires de Lima um perigoso esquerdista que se infiltrou no CDS para defender a descriminalização da IVG, à semelhança de outros que se introduziram no Governo para ordenarem a IVS (interrupção voluntária dos sobreiros)?

A legislação sobre a IVG só foi referendada, com os resultados catastróficos que se conhecem (refiro-me à baixíssima participação popular, não ao veredicto) porque dois amigos do peito e da hóstia, do PS e do PSD, Guterres e Marcelo, assim o decidiram. Não é matéria obrigatória de referendo.

JCN esquece que a ICAR, que o há-de elevar aos altares logo que se fine com um terço numa das mãos e na outra a bíblia, é contra o divórcio e, tal como o seu homólogo Islão, pretende que a violência da lei se abata sobre o adultério. No fundo é contra a liberdade que as religiões se erguem.

Num aspecto tem razão JCN em relação à legalização do aborto: «essa campanha está a ser conduzida de forma tão infame, tão vergonhosa, tão canalha…». Mas não se refere aos padres que eu citei. Refere-se aos que não pensam como eles.

Adenda – Foi finalmente descodificada a frase «matar uma criança no seio materno ainda é mais violento do que matar uma menina de 5 anos». O embrião podia dar origem a um indivíduo do sexo masculino, ao contrário da menina assassinada.