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Categoria: Política

3 de Novembro, 2020 João Monteiro

Oeiras: padre abençoa autocarros

Numa tentativa de fazer política bipolar, Isaltino Morais, presidente da Câmara Municipal de Oeiras, inaugurou uma nova carreira de autocarros gratuitos no Concelho, o Combus, aparentemente incentivando o transporte público, ao mesmo que tem promovido o transporte individual. Para alegrar a festa, esteve presente um padre que abençoou os autocarros. Esta cerimónia religiosa num evento público é mais um exemplo de um atentado à laicidade, em que deveria haver separação entre a igreja e o Estado, aqui representado na política local.

Fonte: Facebook – Município de Oeiras

14 de Outubro, 2020 João Monteiro

Militares da GNR receberam sacramentos cristãos

Uma notícia da Agência Ecclesia deu a conhecer que 27 militares do 42º Curso de Guardas da GNR receberam sacramentos cristãos (26 crismas e 1 batismo), num evento presidido pelo Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança de Portugal, cuja missa teve lugar no Centro de Formação de Portalegre da GNR. Estes militares foram orientados pelo capelão da unidade.

Recordamos que Portugal é um Estado Laico, pelo que a Igreja não deveria envolver-se em assuntos do Estado, como são as forças de segurança, assim como não se devia privilegiar uma religião face às demais.

Sobre as palavras do clero durante a cerimónia, concordo com a crítica que fazem ao isolamento e ao individualismo, pois trata-se de algo que tem tanto de generalista como de sensato.

No entanto, terei de manifestar o meu desagrado perante a afirmação de que os militares se encontram aptos a “desempenhar a (…) missão de Guardas na força do sentido de Deus”, porque a função das forças de segurança é alheia a qualquer manifestação religiosa.

Não se pode deixar de notar que a Igreja se está a tentar imiscuir numa esfera do Estado e, sub-repticiamente, a infiltrar e a recrutar nas suas estruturas. É algo inaceitável e que merece o nosso repúdio.

Fonte: Agência Ecclesia

5 de Outubro, 2020 João Monteiro

O ateísmo e a República

Mensagem do Presidente da Associação Ateísta Portuguesa, a propósito do 110º aniversário da Implantação da República.

Sendo o ateísmo a ausência de crença em deus, então pressupõe-se que, em teoria, o ateísmo seja uma postura filosófica independente do regime político. Quero com isto dizer que uma pessoa pode ser ateísta independentemente de ser republicana ou monárquica, de esquerda ou de direita política.

Contudo, sabemos que, na prática, por motivos históricos, sociais e fenómenos de grupo, em Portugal, a direita e a monarquia encontram-se mais próximas da religião cristã. Por a crença, ou a ausência da mesma, ser uma postura individual, há exceções ao que mencionei (como ateus de direita e comunistas cristãos, por exemplo).

Olhado para a história do nosso país, e estando nós a celebrar hoje, a 5 de Outubro, os 110 anos da Implantação da República, gostaria de recordar brevemente a importância do movimento republicano para a discussão religiosa.

Um dos argumentos que justificava o elevado nível de crendice no final do século XIX, durante a monarquia liberal, era atribuído à elevada taxa de analfabetismo do povo e ao controlo social pelo clero nos meios rurais. Por isso, os republicanos insistiam na instrução popular, com a criação de escolas, recorrendo à propaganda ou até mesmo à criação de associações para esse fim. Recordamos por exemplo o papel da Liga de Instrução Popular ou da Sociedade Promotora de Escolas – detentora da Escola-Oficina Nº1, em Lisboa.

Mas não bastava aprender, pretendia-se que as pessoas deixassem de ser súbditos e passassem a ser vistos como cidadãos, com liberdade de pensar e agir por si mesmos, sem condicionalismos externos. A este respeito, relembro a importância da Associação para o Livre Pensamento.

Para combater o poder e contrariar o discurso do clero na sociedade, foram várias as vozes que se levantaram e várias mãos que escreveram denunciando o poder e as incongruências da Igreja enquanto instituição, a maioria deles republicanos apelidados de anticlericais.

110 anos depois da Implantação da República, constatamos que somos hoje herdeiros deste espírito republicano, defendendo ainda hoje a instrução, criticando o que está mal nas religiões, defendendo a laicidade e o livre-pensamento e sem esquecer os valores republicanos da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, que esperamos que orientem a sociedade em direção a um mundo mais justo e solidário.

5 de Setembro, 2020 João Monteiro

Entidades Públicas e celebrações religiosas

Ontem partilhei aqui a notícia de que o bispo do Funchal, durante uma festividade em Agosto, atribuía a ausência de óbitos na Madeira à Nossa Senhora do Monte, padroeira da região, e apontei as várias falácias utilizadas pelo clérigo. Acontece que o evento em que o bispo interveio merece ser criticado por outra razão: a presença de Entidades Públicas numa celebração de cariz religioso.

Segundo a notícia do Observador, o evento “teve a presença do representante da República, Ireneu Barreto, do presidente da Assembleia Legislativa da Madeira, José Manuel Rodrigues, do presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, e do presidente da Câmara Municipal do Funchal, Miguel Gouveia entre outras entidades civis e militares”.

Vivemos num Estado laico, em que há separação da Igreja e Estado. Assim, não deveriam ter estado presentes estas entidades públicas em representação oficial numa iniciativa religiosa. Em eventos deste tipo, podem estar presentes forças de segurança apenas no exercício da sua função, ou os detentores de cargos públicos a título individual e não oficial. E mais uma vez, apenas uma religião é beneficiada com estas representações.

Imagem de lininha_bs por Pixabay

27 de Janeiro, 2019 Carlos Esperança

O PR e o Panamá

Quando li que o PR estava no Panamá, pensei que o dom da ubiquidade, atributo de um frade português que a mitologia católica colocou em Pádua e em Lisboa, à mesma hora, no mesmo dia, se repetia agora com Marcelo.

Dado que fujo dos telejornais, para preservar alguma sanidade mental, resolvi consultar o sítio da PR onde, de facto, estava anunciada a deslocação do PR ao Panamá para as XXXIV Jornadas Mundiais da Juventude.

A deslocação a festivais da juventude, de onde o julgava arredado pela idade, levou-me a indagar o que iria fazer ali o PR e a surpresa tornou-se azedume e a deslocação motivo de censura. Não foi procurar os papéis do Panamá que, noutros países, levaram pessoas à prisão, foi participar numa Via Sacra com os jovens, numa missa e assistir à bênção das obras de restauro de um edifício pio.

Se foi a expensas próprias, em merecidas férias, só me cabe respeitar a devota intenção, mas se foi em viagem de Estado fico com a vaga sensação de que desprezou o País laico que representa, num atentado à ética republicana e à neutralidade do Estado em questões religiosas.

Portugal elegeu um PR, não colocou em Belém, apesar do nome do palácio, uma figura do presépio, o sacristão que voa para as missas em vários continentes, um devoto, ruído pela fé, com um tropismo especial para beijar o anel do seu homólogo do Vaticano.

O encontro com jovens peregrinos portugueses não legitima a despesa e abre um grave precedente para encontros com jovens amantes do remo, do berlinde, da Música Pop, da vela, do andebol, do Rock ou da bisca lambida, sem necessidade de se ajoelhar na missa que o Papa Francisco vai dizer no exercício da sua profissão.

É natural que do encontro com o PR do Panamá, Juan Carlos Varela, resultem grandes vantagens para Portugal, mas podia aproveitar quando ele não estivesse ocupado com a receção ao chefe de Estado do Vaticano.

Marcelo, nesta fé que o devora, fere a laicidade e reduz-se a presidente dos portugueses amigos da hóstia e da missa. Parece o enviado da Conferência Episcopal Portuguesa.

20 de Dezembro, 2018 Carlos Esperança

A Igreja católica, o Estado e a Concordata

É-me indiferente o que cada religião decide com os seus crentes, mas não posso deixar de me interessar pelos reflexos decorrentes na estrutura legal do meu país.

Há dois anos, ao ver a notícia de 1.ª Página do JN, interroguei-me sobre as consequências civis da anulação de casamento pela Igreja católica. Podia estar enganado e, por isso, apelei aos juristas que visitam o D1A para nos esclarecerem sobre as consequências de uma anulação do casamento canónico.

Quanto às consequências nefastas da Concordata para a igualdade religiosa não existem dúvidas. Quanto às da anulação do casamento por um Estado estrangeiro (o Vaticano), penso que a razão que leva o Registo Civil a aceitar a validade do casamento canónico o obriga a registar a anulação que os tribunais portugueses serão obrigados a confirmar?

A dissolução do casamento pelo Vaticano obrigará o Estado português a aceitar uma decisão que os tribunais nacionais só têm de corroborar, tornando um Estado soberano num protetorado de uma teocracia?

Não obtive resposta, mas, a ser assim, o vexame do Estado deve envergonhar todos os portugueses e levá-los a exigir a revogação de um tratado que nunca devia ter celebrado. 

6 de Dezembro, 2018 Carlos Esperança

Hoje, no 40.º aniversário da Constituição espanhola (6-12-2018)

A Constituição Espanhola de 1978 foi ratificada em referendo a 6 de dezembro de 1978, sancionada pelo rei a 27 de dezembro e publicada no Boletim Oficial do Estado, 2 dias depois, pondo fim ao período de transição.

Era ainda o tempo de todos os medos, o medo dos fuzilamentos cujo eco ressoava nas praças de touros, o medo do garrote, o medo das brigadas assassinas, ao cair da tarde, que muitos ainda recordavam, o medo da ressurreição do ditador, o medo dos sequazes, chamados à negociação, com pinças, o medo de desobedecer à vontade do ditador e ao rei que ele impôs.

Adolfo Suárez, falangista que entrou na política pela mão de Fernando Herrero Tejedor, um falangista ligado ao Opus Dei, que o apoiou antes e depois da morte do genocida, foi um liberal pragmático que compreendeu o fim de uma era e teve o mérito de reunir falangistas convertidos à democracia, social-democratas, liberais e democrata-cristãos nas eleições de 15 de junho de 1977, as primeiras depois de 1936, que venceria ao leme de uma coligação de direita com poderes constituintes.

Foi um referendo, a forma de passar de contrabando o que se quer e o que se recusa, com todos os medos ainda presentes, que legitimou uma Constituição que fez a transição pacífica da ditadura e manteve no poder o aparelho franquista e na Igreja os cúmplices, nas dioceses e paróquias, com o Opus Dei, força que deu força aos genocídios, a manter vivo o respeito pelo franquismo, que ora ressurge.

A Constituição impôs dissimuladamente o regime que o ditador fascista quis, com o rei que escolheu e educou. As sucessivas sondagens, que davam preferência à República sobre a monarquia, como confessou Adolfo Suárez, presidente do governo de Espanha de 1976 a 1981, e primeiro presidente democrático após a ditadura, levou a que a Constituição fosse referendada com a monarquia dentro.

A Constituição permitiu a transição possível face ao medo de confrontar a herança de Franco no país onde o franquismo manteve o poder nas forças armadas e de segurança, nas autarquias e no aparelho de Estado, nos Tribunais e sacristias, recordado ainda das centenas de milhares de mortos e vindictas franquistas.

Não era fácil impor a um aparelho de Estado indemne, moldado pela Falange, uma Constituição que consagrou o regime pluripartidário. E isso foi conseguido. As futuras alterações cabem aos espanhóis, mas, por ora, é de celebração a instauração do regime pluripartidário a que deu origem quando ganham terreno o fascismo e a nostalgia da mais cruel ditadura da Europa.

E os bispos já comandam o regresso à ditadura.

30 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

Luta de gerações

Sente-se que uma época chega ao fim. Esgotam-se os combustíveis fósseis, o ar torna-se irrespirável, escasseia a água, faltam alimentos, aquece o Planeta, os solos aráveis dão lugar aos desertos, a bomba demográfica explode e Deus é cada vez mais cruel.

Não acredito, como os cínicos, na incapacidade dos atuais políticos mundiais e na inconsciência dos líderes dos países mais ricos e poderosos.

O radicalismo religioso e o regresso ao fundamentalismo fazem o seu percurso perante a cumplicidade de setores sociais mais empenhados na salvação da alma do que no futuro coletivo da humanidade.

Há muito que a bomba demográfica devia ter sido desativada, que a economia baseada em combustíveis fósseis, como se fossem eternos, podia ter mudado e procurado novos rumos, que esta geração que confiscou os recursos globais devia ter sentido vergonha de se apropriar do que as gerações passadas deixaram e do que as vindouras necessitam.

O consumo atual é insustentável, os horizontes dos jovens tornam-se sombrios e a luta de classes, que levou o pânico à burguesia, dará lugar à luta de gerações e à invasão de países ricos por multidões de famintos com um Deus que não lhes tira a fome mas pode tirar a vida a todos.

A fome, o desespero e o medo da morte despertam a fé em Deus, seja lá isso o que for.

25 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

Guarda — Cidade Natal

O pio autarca, Álvaro Amaro, decidiu que entre 1 e 25 de dezembro deste ano a Guarda seja “cidade Natal”. O Jornal do Fundão, desta semana, diz que é uma reincidência, com comunicado, onde o edil declara que “a Guarda brilha mais alto com a cidade Natal”, um slogan capaz de erguer presépios em cada esquina e atrair turistas a todos os becos.

A ideia não é original, já Fernando Ruas, há anos, proclamou Viseu “capital do Natal”, o que hilariou autóctones e forasteiros. Álvaro Amaro, mais modesto, retirou a “capital” à lucubração litúrgica, e manteve o brilho das boas ideias com um slogan à sua altura.

O grande timoneiro teve uma ideia brilhante e, ao contrário do poeta, “Natal é quando um homem quiser”, decidiu amputar seis dias ao mês do Natal das gentes cristãs.

Se a fúria litúrgica for contagiosa, como a gripe ou a tuberculose, os autarcas do distrito correm atrás dos rituais e teremos Seia, cidade da Páscoa; Gouveia, cidade do Advento; Pinhel, cidade da Quaresma; Sabugal, cidade da Semana Santa; e, esgotados os tempos litúrgicos, as outras autarquias confiscam as festividades cristológicas.

Meda será a cidade da Epifania; Sabugal, cidade do Batismo do Senhor; Foz-Coa, cidade da Apresentação do Senhor; Trancoso, cidade d’A Ascensão do Senhor; Fornos de Algodres, vila do Pentecostes; Aguiar da Beira, vila da Santíssima Trindade; Celorico da Beira, vila do Sagrado Coração de Jesus; Figueira de Castelo Rodrigo, vila do Cristo Rei; ficando a minha querida Almeida, a vila do Corpus Christi.

Ámen.

Apostila – Aproveitei para recordar aos meus leitores mais pios os tempos litúrgicos e as festas cristológicas que as minhas catequistas me ensinaram, por entre terrores do Inferno e ameaças de tuberculose e cegueira originadas por pecados que ignorava ainda.

21 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

A Áustria e o véu islâmico

A Áustria tem um governo que integra a extrema-direita onde a xenofobia não é apenas a imagem que lhe está associada. A política contra os imigrantes, sejam eles refugiados, a fugir à fome ou à guerra, ou outros, à procura de trabalho, não têm uma vida fácil.

O racismo e a xenofobia jamais serão virtudes democráticas, mas nem todas as medidas que um governo desta natureza tome, são igualmente condenáveis.

O Parlamento austríaco, através dos partidos que formam o governo, aprovou hoje, dia 21, a proibição do véu islâmico nas escolas do ensino primário, abrangendo as crianças do sexo feminino, entre os seis e os dez anos.

Nota-se a intenção anti-islâmica da medida, mas ela devia ser uma decisão na defesa da laicidade, incluída na proibição de símbolos religiosos no espaço da escola pública. Se a defesa da laicidade fosse a prática dos governos europeus, sempre prontos à genuflexão pia, os símbolos ostensivos de qualquer religião deviam ser retirados do espaço público, sobretudo das escolas, onde a cidadania se deve sobrepor ao comunitarismo.

Há quem pense que a proibição das vestes eclesiásticas na via pública, fora das práticas religiosas autorizada, é um atentado à liberdade individual, tal como a proibição do véu islâmico ou da burka, e não imaginam que, no último caso, por cada mulher que deseja usar esses símbolos há dezenas a quem é imposto pelos maridos, pais e irmãos.

Longe de ser o direito que se exerce, é uma provocação com que se desafia a civilização que se repudia, e que abomina a integração. Sob o pretexto do respeito pelas liberdades de cada um, é a sujeição da mulher em contexto islâmico que se perpetua. A conivência dos países de acolhimento desperta a onda de racismo que cresce na Europa, e é o húmus onde a extrema-direita medra.

Uma escola que não eduque para a igualdade entre os sexos, a cidadania e a liberdade, não cumpre a função cívica que lhe cabe.

A proibição do véu islâmico devia ser encarada por todos os países laicos como uma obrigação equivalente à frequência escolar, às vacinas e normas de higiene.

Estou bem longe do governo austríaco e tão perto do apoio à proibição de hoje!