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Dia: 10 de Dezembro, 2007

10 de Dezembro, 2007 Carlos Esperança

Momento zen de segunda. Encíclica Spes Salvi

«Tudo morre neste mundo. Morrem pessoas e árvores, ideologias e línguas, morrem projectos, sonhos e civilizações. Tudo morre, mas o nosso povo sabe quem é a última a morrer: a esperança». É com este truísmo banal que João César das Neves (JCN) inicia a homilia de hoje, no DN, antes de citar uma frase fútil: «Toda a acção séria e recta do homem é esperança em acto». [Bento XVI, encíclica Spes Salvi (SS 35)].

JCN nada diz de útil ou relevante, limita-se a fazer o panegírico da encíclica papal como se fosse uma obra grandiosa do pensamento, da literatura ou da ciência.

JCN não pretendeu escrever um artigo de opinião, limitou-se a imprimir um folheto de propaganda à última encíclica e reverenciar este papa como o faria a qualquer outro.

Depois de cinco das oito citações da encíclica, JCN começa a ensandecer e afirma:

«A ânsia do progresso revelou-se no martírio da Igreja. Paroxismos de fúria e crueldade desabaram sobre os cristãos a partir precisamente das ideologias progressistas. Do marxismo ao nazismo, no México, Espanha, Alemanha, URSS, Vietname e tantos outros, confirmou-se a profecia de Daniel: «Vi um quarto animal, horroroso, aterrador, e de uma força excepcional. Tinha enormes dentes de ferro; devorava, fazia em pedaços e o resto calcava-o aos pés. Era diferente dos animais anteriores».

Não se vê como se confirmou a profecia mas aconselham-se os pais a guardá-la para os filhos que recusam a sopa, sobretudo graças «aos enormes dentes de ferro».

A má fé com que JCN considera o nazismo uma ideologia progressista só tem paralelo na ligeireza com que omite a sedução dos cristãos perante tal ideologia e o entusiasmo anti-semita que despertou, bem como o apoio do Vaticano ao Estado fantoche nazi da Croácia (década de 40), sob o general Ante Pavelic, cuja violência no extermínio dos judeus e na conversão forçada dos cristãos ortodoxos levantou protestos dos oficiais nazis. Isto para não falar da reiterada recusa do Papa Pio XII em tomar uma posição contra o nazismo, ao contrário o que fez contra o comunismo.

JCN pergunta ainda de forma lancinante: «Porque [sic] razão o progresso tomou a Igreja como inimiga?»

No artigo, que seria imperdoável não ler na íntegra, JCN ainda tem tempo para citar a Bíblia e terminar com o Papa:

O homem de hoje quer «Ser como Deus», como prometeu a serpente do Éden na suprema tentação (cf. Gn, 3,5).

– Tudo morre. Apenas Um ressuscitou dos mortos. «Chegar a conhecer Deus, o verdadeiro Deus: isto significa receber esperança» (SS 3).

Nota: O verdadeiro Deus é o de JCN e Bento XVI, naturalmente.

10 de Dezembro, 2007 Helder Sanches

Alemanha poderá banir Igreja de Cientologia

De acordo com a CNN, a Alemanha considera banir a Igreja de Cientologia do seu território. As autoridades alemãs alegam que aquela religião não respeita a constituição do país, sendo alvo de observação pelas autoridades há já uma década.

Sem dúvida que será um assunto a seguir, até porque a Igreja da Cientologia parece estar na moda entre algumas elites.

10 de Dezembro, 2007 Hacked By ./Localc0de-07

Jean Meslier, o padre anarquista (1664-1724)


«No início do século das Luzes, entre os verdadeiros precursores do anarquismo conta-se uma personagem admirável, Jean Meslier. Padre na aldeia de Étrépigny, na região francesa de Champanha, deixou à data da sua morte um volumoso manuscrito que contém a confissão do mais resoluto dos ateísmos e uma crítica às autoridades religiosas e políticas. Em 1762, Voltaire publicaria extractos do Testamento de Meslier, destacando, sobretudo, a sua faceta irreligiosa. Contudo, os ataques de Meslier visam tanto o poder político como a autoridade religiosa. Para ele, a religião e a política ajudam-se mutuamente: “Entendem-se como gatunos. […] A religião apoia o governo político, por pior que este possa ser. O governo político apoia a religião, por mais estúpida e vã que esta possa ser.“.

Este sacerdote desejava que “todos os poderosos da Terra e todos os nobres fossem enforcados com as tripas dos padres“. […] A casta política, reis, nobres ou detentores de cargos, ou seja, aqueles que hoje se designam por burocratas, grandes ou pequenos, bem como o alto clero e os ricos ociosos, são violentamente atacados.

Aliás, o nosso padre conta bastante com o assassinato político como forma de livrar o bom povo dos seus dirigentes: “Onde estão aqueles generais matadores de tiranos que vimos nos séculos passados? Onde estão os Brutos ou os Cássios? Onde estão os generais que mataram Calígula e tantos outros monstros semelhantes? […] Onde estão os Jacques Clément e os Ravaillac da nossa França? Deviam viver ainda no nosso século, […] para espancarem ou apunhalarem todos esses detestáveis monstros e inimigos do género humano e, deste modo, libertarem todos os povos da Terra do seu domínio tirânico!“.

Meslier protesta também contra a apropriação individual dos bens e das riquezas da terra e preconiza o comunismo social. Nos seus escritos, lança um verdadeiro apelo ao povo, que deve agir: “A salvação está nas vossas mãos. A vossa liberdade só depende de vós, se todos souberdes entender-vos. […] Uni-vos, pois, povos, se sois sábios. […] Começai por comunicar entre vós secretamente os vossos pensamentos e desejos. Divulgai por toda a parte, e o mais habilmente possível, os escritos deste tipo, por exemplo, que dêem a conhecer a todo o mundo a vanidade dos erros e das superstições da religião e que tornem odioso o governo tirânico dos príncipes e dos reis da Terra.“.

Jean Meslier chega até a considerar a greve dos trabalhadores e dos produtores, de maneira a levar as autoridades – políticas e religiosas – e os seus serviçais ao arrependimento, privando-os daquilo que lhes é necessário.

Solitário e clandestino, o padre Meslier aparece retrospectiva­mente como um autêntico espírito libertário. Ao redigir em segredo, no silêncio do presbitério rural, o seu Testamento, teve certamente o sentimento de ser um precursor e, apesar da sua visão pessimista do género humano, acreditou que as suas ideias poderiam ter alguma influência póstuma, como o prova a adver­tência que anexou ao papel que envolvia o seu manuscrito, como nos é relatado por Voltaire: “Vi e reconheci os erros, os abusos, as vaidades, as loucuras e as maldades dos homens; odiei-os e detestei-os. Não o ousei dizer durante a vida, mas di-lo-ei pelo menos ao morrer e depois da morte; e é para que se saiba isto que faço e escrevo a presente memória, para que possa servir de testemunho de verdade a todos os que a virem e a lerem, se a acharem boa.”.»

Préposiet, Jean, História do Anarquismo, Edições 70 (p. 32-34)

Também publicado em LiVerdades