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Dia: 13 de Abril, 2006

13 de Abril, 2006 Palmira Silva

Poenitentiale Ratzinger

O papado de Ratzinger tem sido pautado por um crescendo de fundamentalismo que passa pela negação crescente do concílio Vaticano II e pela recuperação das praxis mais anacrónicas da já de si anacrónica ICAR. A última, que nos remete aos tempos tão elogiados pelo actual e último papas, a era gloriosa da Cristandade, tem a ver com a recuperação da celebração da penitência na semana dita santa.

Na realidade, esta semana «santa» foi marcada por uma série de declarações que isoladamente passariam despercebidas entre as profusas banalidades habituais emanadas da Santa Sé mas que vistas globalmente indicam inequivocamente o rumo obscurantista traçado por Ratzinger.

Assim, num claro recado aos católicos ditos «liberais» o Vaticano lembrou que «Não há Teologia católica» sem aceitação do Magistério da Igreja – isto é que ser católico implica a subordinação total aos ditames do Vaticano e é heresia pensar temas de religião pela própria cabeça. Reforçando a mensagem aos jovens de Ratzinger para que estes rejeitem o secularismo e aquilo a que chamou «religião faça você mesmo».

Por seu lado o representante-mor do Vaticano local adverte os católicos portugueses para os perigos da ciência e da análise racional, destacando que «os discípulos de Cristo não podem cair nesta tentação [usar a razão]».

Como confirmado pelo arcebispo Piero Marini, mestre de celebrações litúrgicas pontifícias, a mais recente adição às práticas ICARianas é um rito que era tradicional em Roma até ao Renascimento, abandonado quando as teses obscurantistas tão queridas à santa madre igreja, nomeadamente as de Bernardo de Claraval (ou Clairvaux) no século XII, foram destronadas e deixou de ser heresia o novamente execrado uso da razão.

Assim, pensar pela própria cabeça continua anátema para a Igreja de Roma que, pela voz do cardeal americano James Francis Stafford, o penitenciário-mor do Vaticano, introduziu três novos pecados no léxico pecaminoso dos católicos. Três pecados que tentam obstar a que a era da informação trespasse as idiotices da mitologia cristã permitindo assim que os crentes permaneçam no estado de santa ignorância preferido pela Igreja e pelo actual Papa, que quer os católicos longe da influência nefasta de intelectuais.

Constitui então pecado para um católico manter-se informado ou procurar informação, mais concretamente são pecados o excesso de Internet, de televisão e de jornais (em que excesso é definido em relação ao tempo que se passa a ler a Bíblia) . Aliás, a penitência agora aconselhada pela Igreja Católica, para qualquer pecado, é a leitura da Bíblia que aparentemente para os totalitários do Vaticano contém toda a informação necessária a qualquer crente.

Enfim, nada que não tivesse sido previsto há quasi um ano nestas páginas:«Direi mesmo que o dia de hoje, 19 de Abril de 2005, pode constituir um marco para um retrocesso civilizacional que será muito difícil de recuperar». Os últimos desenvolvimentos confirmam os meus receios…

13 de Abril, 2006 Carlos Esperança

O Sr. Teodoro da Madeira

Na Madeira, vai realizar-se o enterro do Senhor Jesus, funeral sem morto, uma paródia que se repete todos os anos, com o ar sorumbático dos gatos-pingados do costume e as orações que se repetem.

Apesar do funeral, o pessoal calejado nestas encenações já sabe que no Domingo pode mudar o ar sorumbático e pôr um sorriso domingueiro a que as vitualhas acrescentarão sinergia.

O morto é a fingir, tal como a ressurreição, um espectáculo encenado para manter a fé, entreter os crentes, pôr as sotainas em movimento e o bispo a passear o báculo, abanar a mitra, exibir o anel de brilhantes à fúria osculatória dos beatos e viajar debaixo do pálio com os vassalos a içar as varas.

Estas festas são um hábito sofrido que os proxenetas do morto a fingir têm o direito de viver em angústia mística até ao delírio alucinado da ressurreição do artista ausente.

Grave é a vocação totalitária do bispo, dos padres e outros parasitas de Deus que acham a sua dor, pela morte de Cristo, de sofrimento colectivo obrigatório, incompatível com festas profanas.

Vêem na música a heresia capaz de pôr de mau humor o cadáver. Consideram a alegria juvenil um pecado. A violência da fé não consente a liberdade da festa. Ainda que fosse verdadeira a morte, mesmo que a alegria dos jovens denotasse mau gosto, era um direito de cidadania.

As ameaças, intimidações e provocações à realização do «Madeira Paradise Dance Tour 2006» são uma manifestação de intolerância e de vocação totalitária.

Os apaniguados do bispo, avençados da hóstia e da procissão, têm a marca genética dos velhos padres rurais com um zero na cabeça que Guerra Junqueiro apelidava «a marca do fabricante».

Espera-se que Deus e os jovens não se envolvam em escaramuças. Dos padres sabemos que virá a gasolina que apaga os fogos – uma velha vocação pirómana de sabor cristão.

13 de Abril, 2006 pfontela

As virtudes do catolicismo liberal

Uma verdadeira cultura política independente e autónoma
Perceber o papel espiritual da Igreja
Tolerância pela liberdade de expressão, mesmo quando envolve crítica à religião
Uso de honestidade intelectual
Não usar a esfera religiosa para poder influenciar a política
Responsabilidade e seriedade dentro da actual situação global

O catolicismo liberal, tal como a ideia de catolicismo moderno, é um conceito sem sentido. A estrutura da igreja não está desenhada para seres humanos autónomos, a lógica que permeia a organização é a de obedecer ou calar. O próprio Ratzinger foi um perito durante os anos que esteve à frente da inquisição reformada em suprimir vozes dissidentes (proibindo a publicação de certos autores ou minando carreiras académicas).

Isto quer dizer que não existem católicos que pensem e sejam sérios no seu civismo? Não. O que quer dizer é que essas pessoas não são muito ortodoxas e com o rumo que as coisas tomam (o regresso ao passado) arriscam-se seriamente a não ter um lugar à mesa. O que espero é que os verdadeiros católicos progressistas (em oposição aos publicistas do “regime”) se apercebam que estão a servir de relações públicas para uma organização que não os representa e que promove activamente a antítese de todos os valores progressistas e liberais.

13 de Abril, 2006 Palmira Silva

Vitória de Pirro dos talibans madeirenses?

«Com as fantásticas condições naturais que a Madeira oferece tão natural seria de prever um grande festival de música de dança como o que se realizará nos próximos dias 14 e 15 de Abril e que vai trazer a Portugal Dj’s mundiais de topo numa Marina onde não faltarão a cidadania e o característico fogo de artificio.»

É assim que ainda é anunciado o evento musical que tanta tinta e tanta polémica tem originado nos últimos dias. Como foi apontado pelo Boss, aparentemente houve alguma confusão na informação produzida ontem quer pelo Diário Digital quer pela RTP, isto é, o Madeira Paradise inicia-se de facto sábado, já que foi adiado uma hora das onze horas para a meia-noite de sexta-feira, ou antes, para as zero horas de sábado. A organização garantiu um cuidado especial com o volume da música até pelo menos à uma da madrugada de sexta para sábado.

A outra alteração anunciada tem a ver com o local do festival que vai decorrer no Madeira Tecnopolo, e não na Quinta do Lugar de Baixo, como estava previamente anunciado, o que se traduz numa redução na lotação do evento para 8000 pessoas.

A organização fez saber que a razão desta mudança se deve ao facto do local inicialmente previsto supostamente não apresentar condições de segurança devido a uma iminente derrocada (fica no ar a dúvida se a Marina do Local de Baixo será interditada ao público ou se a derrocada está iminente apenas este fim de semana…).

Uma pesquisa rápida pelos fóruns locais dá uma excelente perspectiva do que alguns pensam sobre a santa madre igreja. Um comentador especialmente presciente rebateu de forma magistral as barbaridades que o Bispo da Madeira debitou, dignitário que pelo que tive oportunidade de apreciar em mais locais internautas não é especialmente benquisto na comunidade cibernauta madeirense, que não esquece a sua relação intíma com o padre Frederico. Reproduzo um dos comentários desse madeirense aos dislates do bispo:

O «terrorismo» não se faz só com bombas e metralhadoras: impedir, sem qualquer motivo razoável, tantas pessoas de celebrar com dignidade um dos dias mais importantes da sua fé religiosa bem pode merecer essa designação.
«Pois não, o terrorismo faz-se através da imposição de ideias e ideologias, tal como a igreja fez e continua a fazer. Em outros tempos inclusivé através da força, da opressão e da perseguição.»

Mas o piedoso bispo que tanto se indigna contra o suposto «terrorismo» musical não tem pejo em incitar a terrorismo de facto para impedir a realização do evento. Assim, foram distribuídos panfletos a convocar os madeirenses para uma manifestação junto à entrada da Marina do Lugar do Baixo uma hora antes do início do Festival de Música Madeira Paradise. Panfletos que apelam à violência para obrigar todos ao «respeito à palavra de Deus e aos Mandamentos da mesma», porque é necessário «mostrar« que «quando os madeirenses querem, a Fé é mais forte do que todos os divertimentos».

Como se pode ler no Diário de Notícias «Um parágrafo que acaba por, indirectamente, incitar à violência tendo em conta os acontecimentos dos anos 70 naquela localidade, por motivos políticos e religiosos. Muitos se recordam do recurso a armas, nomeadamente no tempo em que a Flama – Frente de Libertação da Madeira defendia a independência da Madeira.»

Agora que a localização do evento foi alterada para um local mais «pacífico» e a procura de bilhetes está em alta , resta ver se os talibans católicos locais persistem no apelo às armas para combater o blasfemo festival e impôr a todos os madeirenses a vontade e ditames da Igreja!