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Dia: 29 de Setembro, 2005

29 de Setembro, 2005 Palmira Silva

Deduções fiscais new age

As autoridades fiscais holandesas aceitaram como deductível os 2 210 euros que uma actriz de 39 anos pagou para tirar um curso de um ano sobre… feitiçaria! O curso envolve o ensino da correcta utilização de utensílios indispensáveis à profissão, tais como o perscrutar uma bola de cristal quiçá manobrar uma recalcitrante vassoura, para além do domínio de complicados hocus pocus feitiços e da arte de bem preparar mezinhas de origem vegetal.

O fisco holandês aceitou as despesas porque o curso serviu para promover a actividade profissional da ex-actriz, agora devotada a espalhar o conhecimento da mágica da terra em workshops e afins.

29 de Setembro, 2005 Carlos Esperança

O Papa regressou ao covil

Após dois meses de férias na residência de verão, em Castel Gandolfo, B16 acaba de regressar ao antro do Vaticano, o habitat natural destes espécimes únicos, que há cerca de mil anos começaram a usar o epíteto de Papa católico, cognome que atribuíram aos antecessores.

Tinha 30 mil devotos à espera, convencidos de que ver o Papa é meio caminho andado para o Paraíso, onde não os esperam rios de mel nem 70 virgens (para isso escolhessem o Paraíso islâmico), mas onde podem jogar à bisca de nove com Deus e brincar às escondidas com os anjos, desde que não assediem a virgem Maria. (Para as mulheres não há divertimentos, nem no Paraíso).

O tema da audiência concedida aos 30 mil peregrinos, escolhido pelo antigo inquisidor, foi «o amor divino», o único que o múnus e a idade ainda lhe consentem. Mas o que será isso de amor divino? O Papa Ratzinguer explica: «Deus não abandona o seu povo, mas intervém continuamente na história, manifestando nela a omnipotência».

Apesar do esoterismo das palavras é fácil pensar nas vítimas dos maremotos, dos tufões e na parafernália de instrumentos bélicos com que os devotos de um Deus assassinam os devotos do Deus concorrente. Com a indiscutível omnipotência do Deus de B16, não há dúvida do sadismo com que mata, fere e deixa sem casa, medicamentos, comida e água potável milhões de inocentes.

Com um Deus assim, só admira a clientela que resiste.

29 de Setembro, 2005 Palmira Silva

Religião e Sociedade

As religiões judaico-cristãs assentam numa concepção do ser humano naturalmente perverso, muito susceptível às tentações do mafarrico, factos que justificam a existência do Mal. Outra concepção concomitante é o mito da Queda que nos sobrecarrega com o pecado original: «o homem era inocente e bom, e o mundo era um jardim, um paraíso. Mas o homem foi tentado, sucumbiu e caiu». A tradição cristã, que influenciou indelevelmente a sociedade ocidental é assim muito veemente na condenação da natureza humana e da sua natureza intrinseca e irrevogavelmente má afirmando que não há nem salvação moral nem sociedade funcional fora do amor a Deus. Aliás essa é a arma mais frequentemente esgrimida contra os ateístas, ou seja, os crentes em geral e os católicos em especial afirmam a impossibilidade de existência de um sistema moral fora dos auspícios divinos.

Um artigo recente publicado na revista científica que dá título a este post, Journal of Religion and Society, vem liminarmente deitar por terra todos os supostos argumentos de ordem moral que, sem qualquer sustentação empírica mas apenas reflectindo o sentimento de superioridade moral que as religiões conferem, os crentes vêm falaciosamente utilizando até agora. E que apenas confirma o que Feuerbach já afirmava há cerca de 150 anos: «quando a moral se baseia na teologia, quando o direito depende da autoridade divina, as coisas mais imorais e injustas podem ser justificadas e impostas».

No artigo são analisados dados de incontáveis sondagens internacionais, nomeadamente da International Social Survey Programme, Gallup e outras, que permitem a conclusão que «Em geral, taxas mais altas de crença e reverência num Criador correlacionam com taxas mais altas de homícidio, mortalidade juvenil e de jovens adultos, infecções com doenças sexualmente transmíssiveis, gravidez adolescente e aborto nas democracias prósperas».

Reflectindo ainda que «democracias não religiosas, a favor do evolucionismo contradizem a máxima de que uma sociedade não pode gozar de boas condições a não ser que a maioria dos seus cidadãos acreditem ardentemente num criador moral». Aliás, a desacreditação desta máxima já tinha sido indicada aqui no DA com o exemplo da República Checa, a democracia ocidental mais ateia.

A conclusão retirada no artigo «O medo generalizado que uma cidadania sem Deus deve experienciar um desastre social é assim refutado» apenas corrobora as minhas lucubrações de que o progresso ético da humanidade é impedido peals religiões.

De facto, e como já escrevi, se analisarmos criticamente a História, podemos constatar que apenas depois de Petrarca e do início dos movimentos humanistas, que colocam a ênfase no Homem e não em qualquer ser transcendente, e consequentes separação da Igreja-Ciência e da Igreja-Estado se dá um avanço ético nas sociedades ocidentais. A progressão do sub-homem de Sartre para o Homem pleno, só pode de facto realizar-se através do humanismo. Apenas acreditando no Homem, repudiando a tradição cristã da sua natureza pecadora e má, e estabelecendo uma ética centrada no Homem e não em verdades «reveladas», podemos viver harmoniosamente com os nossos semelhantes.

Ou seja, a ética cristã assenta na natureza intrinsecamente má do Homem, causada pela dentadinha na maçã da pérfida Eva, e na supressão virtuosa dessa natureza humana, por obediência a ditames divinos. A ética ateísta pretende não só devolver ao Homem a dignidade que as religiões do livro lhe sonegaram como combater o antropocentrismo autista que estas promovem. E como este estudo confirma, em total oposição ao que pretendem os crentes, a ética ateísta permite o desenvolvimento de uma sociedade melhor, mais pacífica e mais justa!