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Os ateus não acreditam em NADA?

Tenho discutido com um número razoável de pessoas (algumas delas ateias) que consideram que ser ateu «a sério» é não acreditar em nada. Nem na Felicidade, nem no Bem, nem no Amor.

Na maior parte dos casos esta ideia não vem associada a qualquer argumento: é apenas uma impressão que se tem de que o ateu «a sério» é alguém tão cétpico que não poderá acreditar nem nada que pareça pouco «científico». No entanto, recentemente tive contacto com um argumento que defendia esta ideia: sem Deus, não haveria qualquer ser ou referência sobrenatural para criar os valores referidos como valores absolutos. A Felicidade, o Bem ou o Amor seriam apenas ilusões, tal como a religião, para manter o poder vigente.

Não concordo, de todo, com esta forma de pensar. Devo dizer que acredito no Bem, na Felicidade e no Amor. Posso saber que o Amor não é algo de sobrenatural, mas sim um conjunto de reacções físico-químicas no meu cérebro (e saber isso nem decorre do meu ateísmo, mas sim do meu materialismo – há ateus que não partilham desta perspectiva), mas isso não lhe tira importância: quando vivo o amor, não estou naturalmente a pensar nessas reacções naturais, estou a agir condicionado por elas e fazer os mesmos filmes que todos fazem. Por isso, sei que existe, e que mexe com as pessoas.

O Bem também não corresponde à obediência a um conjunto de tábuas da lei absolutas, mas isso não quer dizer que não exista. A Palmira já analisou neste espaço o problema da ética, e é dessa problemática que decorre aquilo a que chamamos o Bem.

A Felicidade também não é nada de sobrenatural: surge devido à selecção natural. Mas existe e quero lutar por ela.

A religião surgiu por muitas razões, porque respondia com ilusões agradáveis a muitos anseios humanos, porque dava explicações fáceis a muitos mistérios naturais, etc. O facto de ser um meio adicional para manter e justificar a autoridade do poder vigente pode ter feito com que se espalhasse mais rápido em muitos casos, mas suponho que não foi delineada com esse objectivo. Por ser um conjunto de superstições distingue-se, e bem, destes valores em que acredito.

Um ateu é alguém que não acredita em Deus, nem no sobrenatural. É só isto. Assim sendo, qualquer pessoa que não acredite que a Felicidade, Amor e Bem decorram de Deus, pode acreditar nestes conceitos e ser um «ateu a sério».

Por fim respondi ao argumento, mas não à sensação. É difícil explicar com um texto porque é que acreditar na Ciência e na racionalidade não implica ser frio e vazio de emoções. É uma sensação muito errada que muita gente tem. Não há texto que explique isso. Posso ir repetindo esta ideia, artigo após artigo, e vou fazendo-o. Mas creio que enquanto quem assim sente não conhecer pessoalmente algum apaixonado pela Ciência e puder verificar que não está perante um ser frio e desumano, esta sensação não irá mudar.