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Mês: Março 2014

18 de Março, 2014 Carlos Esperança

A Espanha, o fascismo eclesiástico e a IVG

Gil Tamayo, secretário-geral da Conferência Episcopal Espanhola, diz que “O debate sobre a malformação não é negociável”.

A Espanha, sob a influência tenebrosa da Opus Dei, regride nas leis da família e nega o direito ao aborto de um anencéfalo. Sob as sotainas acalenta-se o ódio e os homens que gostam de vestir roupas femininas exigem às mulheres que o seu corpo esteja ao serviço dos preconceitos deles.

Quem conhece dramas de mães de filhos com espinha bífida ou das que trazem no útero um feto incompatível com a vida, sem poderem interromper a gravidez, sabe a maldade que encerra a decisão imposta por um governo que a Opus Dei corroeu por dentro.

O rancor de celibatários, as manhãs submersas dos seminários e o veneno misógino dos livros pios conduzem a esta demência perversa a que falta um módico de sensibilidade, um resquício de compaixão, um mínimo de humanidade.

A refinada maldade que impõe à mulher a continuidade de uma gravidez teratogénica só é possível germinar em pessoas sem coração e com o cérebro embotado pela violência de uma educação castradora da sexualidade, dos afetos e da inteligência.

A IVG não é uma obrigação que se imponha, sejam quais forem os riscos, é um direito.

Criminalizar a grávida que aborte por ter rubéola ou por lhe ter sido diagnosticada uma má formação fetal, só pode sair da mente perturbada de um fascista misógino ou de um clérigo embrutecido por jejuns, abstinências e cilícios com que pensa salvar a alma.

17 de Março, 2014 Carlos Esperança

Opus Dei, Escrivá de Balaguer, Jardim Gonçalves e os milagres

O servo de Deus monsenhor Escrivá de Balaguer, depois de percorrer os degraus de Venerável e Beato chegou a Santo em 6 de Outubro de 2002 graças a dois milagres aprovados – o primeiro no campo da oncologia e o segundo do foro da dermatologia.

O apoio a Franco e a obsessão por dinheiro, poder e honrarias podem ter arredado o taumaturgo da bem-aventurança eterna mas não lhe tolheram a canonização.

O virtuoso bispo do Funchal, D. Teodoro de Faria e o impoluto ministro de Estado e da Defesa, de então, Dr. Paulo Portas, destacaram-se entre os portugueses bem formados, convidados a deslocar-se a Roma para a cerimónia. Não terão deixado de rezar para que se esqueçam as ligações da Prelatura ao mundo da alta finança e os inúmeros escândalos financeiros em que se viu atingida no passado (Rumasa, Matesa, Banco Ambrosiano, etc.).

A tentativa de criar o governo teocrático universal sonhado por Paulo, a sua aliança com a Mafia internacional e a pseudo maçonaria financeira, ou o abuso indiscriminado do negócio milagreiro, documentados por Juan G. Atienza (Los Pecados de La Iglesia), são acusações prescritas.

Aspetos negativos da personalidade de Escrivá, referidos pela colaboradora e secretária de muitos anos, Maria Tapia, no livro “Uma vida na Opus Dei”, e as acusações de Robert Hutchison em “O Mundo Secreto do Opus Dei” prescreveram também.

Regozijemo-nos, pois, por ter sido Monsenhor Escrivá “o justo entre os justos mais rapidamente elevado aos altares em toda a história da Igreja”, 17 anos exatos após a sua morte ( Ob. citada de J. Atienza, Pág. 342).

1750 sacerdotes e 80 mil fiéis – um exército de prosélitos sob a omnímoda autoridade de um prelado que dispõe de amplos recursos financeiros e sólidos apoios políticos em todo o mundo – não deixarão de proclamar a santidade do “Pai”.

Menos de 12 anos depois da canonização de monsenhor Escrivá, Jardim Gonçalves é o exemplo vivo da graça divina, por intercessão do santo predileto de João Paulo II, ao ver prescrever a elevada multa a que os tribunais terrenos tinham condenado o bem-aventurado, dedicado à Opus Dei.

Santo Escrivá, no sossego da sua defunção, vela pelos seus.

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16 de Março, 2014 Carlos Esperança

Criminosos da fé interrompidos nas orações

As polícias de Marrocos e Espanha desmantelaram a rede de um espanhol, Amaya, um dos dementes convertidos ao Islão e ao crime. A rede recrutava jihadistas europeus que iam lutar para a Síria, Mali e Líbia, locais excelentes para o treino militar que devolvem os sobreviventes, mais prosélitos e ansiosos do Paraíso.

Na Síria encontram-se mais de 2 mil jihadistas europeus cujo regresso extasiará Maomé e não deixará de causar fortes preocupações à Europa que parece esquecida de violentas guerras religiosas que a dilaceraram.

Continuo sem perceber o que leva países democráticos a aceitar a pregação do ódio e a fanatização religiosa que proíbe a uma associação ou partido político. As religiões não são mais do que associações de crentes, submetidas ao código penal dos países onde se organizam. O direito à crença é incompatível com o direito ao crime.

A Europa continua a considerar moderado o Irmão Muçulmano que na Turquia transpira fé e corrupção. O PM Recep Erdogan, pode antever na instabilidade política ucraniana a oportunidade para desviar a pressão a que está submetido e se intrometer no conflito que divide a União Europeia e a Rússia.

A Europa que se ajoelha perante as religiões e os seus próceres está a deixar-se infiltrar por uma onda de demência mística virada para Meca. Mas quem ontem viu os políticos portugueses a transformarem o funeral do ex-patriarca de Lisboa numa reunião política, não se admirará da falta de coluna vertebral de quem anda de rastos e viaja de joelhos.

Assim, falta autoridade para respeitar a laicidade.

16 de Março, 2014 Luís Grave Rodrigues

Realidade

15 de Março, 2014 Carlos Esperança

Já copeiam, já devedem, o pior são os ivões (Crónica)

Alguém me contou que Carvalhão Duarte, o corajoso jornalista que foi diretor do jornal República e empenhado antifascista, foi um dia recebido por Salazar na qualidade de presidente do organismo de classe dos professores primários, profissão de que viria a ser demitido por motivos políticos.

Carvalhão Duarte queixou-se de que os vencimentos dos professores não correspondiam à categoria profissional, ao que o ditador respondeu que, não podendo elevar os salários ao nível da categoria dos reivindicantes, faria com que a categoria viesse a corresponder aos vencimentos que auferiam.

Não surpreende que tal possa ter acontecido pois o encerramento das Escolas Normais e a criação dos Postos Escolares e respetivas Regentes, a quem bastavam quatro anos de escolaridade, correspondeu ao desprezo que a instrução lhe mereceu. Deve-se à ditadura o retrocesso escolar de quem temia a cultura e a julgava prejudicial à doutrina cristã e ao cuidado das almas de que Cerejeira se encarregou.

Os anos 30 do século XX foram de uma enorme regressão na formação dos professores e nas importantes inovações da I República, tragédia que só seria alterada na agonia do regime fascista, com Veiga Simão, no consulado marcelista.

O ensino obrigatório era, no meu tempo de escola, a 4.ª classe para rapazes e a 3.ª para meninas. Recordo a minha mãe a entrar nas casas das pessoas da aldeia, a dizer às mães que já lhe tinha matriculado a filha na 4.ª classe, senhora professora não me faça isso, faz-me falta para criar os irmãos, é uma boa aluna merece ir mais além, quem me fica com os outros filhos quando tenho de ir para a horta, a professora a submeter a mãe da menina que gostava da escola, a mãe a lamuriar-se, e a professora a conseguir mais um ano de escolaridade para a menina que não podia ser criança e para quem a 4.ª classe era considerada supérflua.

Em 1963, as regentes ganhavam 600$00 mensais, vencimento igual para as agregadas e as efetivas, tendo estas direito a 12 meses de vencimento anual e as outras a 9 meses e 12 dias. Para se fazer ideia da exploração e miséria a que eram condenadas, vale a pena recordar os salários miseráveis dos funcionários públicos, em geral, e os dos professores primários, em particular: 1.600$00, agregados; 1750$00, efetivos; e 2.000$00, 2200$00 e 2.400$00, após 10, 20 e 30 anos de serviço, respetivamente.

Em 1963, quando, por ser o único professor, fui nomeado Delegado Escolar, encontrei 16 regentes escolares no concelho, todas mulheres, em pequenas aldeias. Sem elas, muitas crianças ficariam desobrigadas da escola porque uma residência superior a 3 km da escola era motivo legal para isentar as crianças da frequência escolar.

Contrariamente às anedotas e humilhações a que a condição as submetia, devemos-lhes a alfabetização de muitas crianças que, doutro modo, não teriam oportunidade de, mais tarde, obter um passaporte e emigrarem, para fugirem à fome e à miséria a que estavam condenadas.

As regentes eram frequentemente ridicularizadas pela escassez de habilitações literárias e rudimentares conhecimentos, objeto de anedotas, tantas vezes injustas, quase sempre racistas, e da arrogância de professores que presidiam às provas de passagem dos seus alunos.

Era vulgar atribuir-lhes redações de ofícios onde a sintaxe e a ortografia abalavam os mais rudimentares alicerces da ortodoxia gramatical. Apareciam datilografados e eram divulgados para gáudio de quem tinha aprendido um pouco mais e subido na hierarquia rígida da função pública.

Havia muitas histórias atribuídas a regentes, que, com a miséria do vencimento, sofriam o sarcasmo de quem se julgava superior. É dessa indigência, do quotidiano repisado de «um país em “inho”» que aqui deixo a suposta afirmação de uma regente para o inspetor que a visitou: «os alunos já copeiam, já devedem, o pior são os ivões…», 3 vezes 8, 24, ‘e vão’ 2; 9 vezes 8, 72, ‘e vão’ 7», malditos ‘ivões’, a conjunção e a conjugação do presente do indicativo do verbo “ir”, a tornarem-se o plural de um absurdo substantivo.