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  • 21 de Junho, 2008
  • Por Carlos Esperança
  • Religiões

Os conventos e a liberdade

Há direitos irrenunciáveis. O patrão que coaja os trabalhadores a abdicarem dos direitos sindicais, viola as leis do Estado e torna nulo o contrato. Não se podem recusar direitos consagrados na Constituição nem renunciar às liberdades inerentes à condição humana.

A entrada para um convento é a renúncia à liberdade e à autodeterminação individuais. Pode ser gratificante a assoalhada no Paraíso, divertidos os jejuns ou deliciosos no gozo masoquista os cilícios, mas não podem ser deixados nas mãos de uma seita, à mercê da madre superiora ou do prior de um convento.

Imagine-se uma jovem, destroçada nos afectos ou perturbada por êxtases místicos, que decide entrar num convento e renunciar à liberdade. Como pode uma decisão emocional converter-se em prisão perpétua sem que o Estado democrático indague periodicamente da sanidade mental e da ausência de constrangimentos sobre a vítima?

Claro que deus gosta de ociosos que passem a vida na contemplação. Os papas apelam a que se renuncie aos prazeres da vida para se dedicarem à castidade e à oração. Não sei quem terá ouvido deus a lamentar-se do método que os humanos descobriram para se reproduzirem ou envergonhado com o prazer que dá. Desconheço quem foram as testemunhas da obsessão divina pelas roupas femininas e quando começaram essas prisões que muitas vezes serviram para manter indivisa a propriedade transmitida ao primogénito.

O que está em causa é a possibilidade, remota que fosse, de haver no ambiente lúgubre de um convento alguém que os constrangimentos internos ou as ameaças hierárquicas impedissem de se libertar da severa pena da prisão perpétua pelo único crime de crer num deus cruel, violento e vingativo.

Não há Estado democrático sem defesa dos direitos, liberdades e garantias a que está obrigado. Os conventos devem ser periodicamente visitados por assistentes sociais, médicos e psicólogos. Os cidadãos precisam de quem os defenda, inclusive de si próprios, amortalhados em vida sob a máscara sombria do hábito conventual.

Carlos Esperança