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Dia: 19 de Novembro, 2007

19 de Novembro, 2007 Carlos Esperança

José Saramago – escritor, ateu e comunista

José Saramago, o Nobel do nosso contentamento, fez ontem 85 anos, embora, segundo o registo, lhe faltassem ainda dois dias.

Era aguardado no Convento de Mafra, localidade onde tem uma escola secundária com o seu nome, à revelia do edil que nunca autorizou o preito que o Governo de Guterres acabou por impor. Há 290 anos foi lançada a primeira pedra do Convento com que D. João V agradeceu a mercê divina de um herdeiro e delapidou o ouro do Brasil que lhe sobrou das oferendas ao Papa.

Não adivinhava o «Senhor Fidelíssimo», título e prémio papal ao desperdício com que deslumbrou o Vaticano, que o Mosteiro serviria de cenário a uma das mais interessantes obras literárias do maior ficcionista português do Século XX.

Saramago deu a Mafra a fama internacional projectada pelo «Memorial do Convento», um romance em que a funda erudição se associa à fábula, as alegorias mergulham na história e Frei Bartolomeu Lourenço acaba louco por entre dúvidas metafísicas e a perseguição do Santo Ofício, havendo ainda tempo para o amor entre Baltazar Sete-Sóis, ex-soldado maneta, e Blimunda Sete-Luas, que perscrutava vontades através dos corpos das pessoas, transparentes ao seu olhar.

A beleza literária e a linguagem inovadora criaram uma obra-prima a que o Convento de Mafra serviu de pretexto. Vinte e cinco anos depois da sua publicação e de 1 milhão de exemplares vendidos em Portugal, o Memorial do Convento aí está como obra imortal do génio de um escritor que a doença impediu de estar hoje presente.

José Saramago deslocar-se-ia hoje ao Convento de Mafra se a doença o não retivesse, quiçá entregue ao desvelo de Pilar del Rio. Terá sido a última vez que Saramago perdeu a primeira oportunidade de falar do Memorial do Convento no Palácio que lhe serviu de berço.

Parabéns, José Saramago, pelos 85 anos e, sobretudo, pela obra singular, em língua portuguesa, que rivaliza em solidez e imponência com o Convento de Mafra.

19 de Novembro, 2007 Hacked By ./Localc0de-07

Espanha e a busca pela dignidade

Entre 1939 e 1975, a Igreja Católica Romana e Franco, o “Caudilho de Espanha pela graça de Deus”, governaram a Espanha em regime de repreensão brutal aos adversários, devidamente apoiados pelos déspotas Hitler, Salazar e Mussolini. Cerca de meio milhão de pessoas morreram durante a guerra civil Espanhola até à ascensão de Franco ao despotismo, no qual foram executadas milhares de pessoas, sempre com a conivência da Igreja Católica Romana.

O parlamento em Madrid decide proceder à reabilitação das vítimas do franquismo, colocando em jogo a lei da memória histórica, aprovada em 31 de Outubro com o intuito de reparação moral e a reabilitação pública da memória das vítimas de perseguições políticas, ideológicas e religiosas durante a guerra civil e das décadas de fascismo que se lhe seguiram. Perante a imperiosa escolha de clarividenciar a História e proporcionar a dignidade mínima às pessoas que sucumbiram durante a guerra e o franquismo, a Igreja Católica Romana respondeu com a maior campanha propagandística dos santinhos e anjinhos da sua História ao beatificar 498 católicos caídos do lado que lhes interessava, imiscuindo no mínimo um torturador pelo meio, facto conhecido mas aparentemente normal nas lides clericais. A apoteose da beatice e de afronta à Democracia Espanhola ocorreu poucos dias antes da aprovação da lei, provocando deliberadamente a hostilização e o sectarismo. A cerimónia foi presidida pelo cardeal português José Saraiva Martins, intelectual sublime do prosélito, das cruzadas católicas às Laicidades e da condenação de todos os não-cristãos à inexistência, conforme afirmado na propaganda católica televisiva de 14 de Outubro na RTP, “A força do espírito”, “Tudo o que é verdadeiramente cristão é verdadeiramente humano e tudo o que é verdadeiramente humano é verdadeiramente cristão”.

Na aprovação da lei surge uma alteração em cima do joelho, a excepção à regra aparece e é o que se esperava, a Igreja Católica Romana fica isenta de retirar todo e qualquer material propagandístico franquista das suas Igrejas com a possibilidade de alegação de simbologia artística e religiosa, o franquismo consegue assim sobreviver dentro das Igrejas.

Infelizmente a lei também não determina a anulação dos julgamentos sumários feitos pelos tribunais do franquismo que decretaram a execução de mais de 50 mil republicanos, apenas proclama a ilegitimidade destes órgãos e das sentenças.

Segundo a Igreja Católica Romana, pela voz do Francisco Pérez, a lei é “desnecessária” e a “história não vai mudar porque uma lei se torna “memória””, a tentativa de perpetuação da propaganda franquista e católica pelas páginas da História quando a moral Humana obriga a que nas páginas da História esteja a História, milhares de pessoas encontram-se desaparecidas, enterradas em valas comuns à espera que a dignidade e a moral se afirme e lhes proporcione a dignificação mínima, para além de se poder finalmente retirar o lixo católico e fascista e substitui-lo pelos factos, pela concretude das coisas.

Enquanto a Igreja Católica Romana tenta a todo o custo abafar a Democracia Espanhola e perpetuar a mentira, a hipocrisia e a injúria, a História começa finalmente a escrever-se, Maribel Brenes procede a estudos sobre a repressão do sistema franquista e acredita ter descoberto provas de que existem cerca de 10000 mortos enterrados em 57 valas comuns em Granada.

Enquanto o catolicismo assume as mesmas posturas relativas ao Nazismo, as negações do holocausto e dos 6 milhões de Judeus mortos, os obscurantismos e os revisionismos históricos, as verdades começam a surgir do lodo franquista, mesmo com a contínua batalha católica pela limpeza através da mentira e das cerimónias franquistas efectuadas, como a missa na Basílica do Vale dos Caídos em 17 de Novembro em homenagem a Franco na data da sua morte onde compareceram 1500 pessoas, felizmente menos 40% que no ano passado.

A Igreja Católica Romana continua com a mesma postura demencial de sempre, desde a sua fundação até aos tempos recentes, resta às Democracias saberem lidar com este estranho parasita.

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