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Dia: 24 de Outubro, 2006

24 de Outubro, 2006 Carlos Esperança

O momento Zen da segunda-feira

João César das Neves (JCN) tem substituído a habitual homilia das segundas-feiras por artigos de opinião com manifesto prejuízo dos leitores que procuram nas prédicas do devoto os ensinamentos das missas a que se baldam e o tratamento para o fígado.

JCN não é um desses devotos que viajam de joelhos, de língua estendida, a caminho da eucaristia. Não se priva da rodela de pão ázimo com que lambe a comissura dos lábios como os mais glutões soem fazer com o leitão da Bairrada; não falta à confissão nem deixa de rezar o terço que a Irmã Lúcia recomendou, a rogo da Senhora de Fátima, uma Virgem voadora que fazia das azinheiras aeroporto. Mas não faz figuras tristes na rua.

JCN não estraga as calças de bom corte a fazer gincanas de joelhos à volta da capelinha das aparições, faz desporto em beatas homilias nos jornais e nos livros que publica.

No Diário de Notícias de ontem JCN dissertou sobre «A vida de Deus em mim» – salvo seja. «Hoje nas sociedades laicizadas vê-se muito Deus» – garantiu o prosélito. Onde andará o Deus dele que não aparece nos cafés, na via pública, nos escritórios, nos sítios por onde passam as pessoas normais?

Andará Deus na clandestinidade com medo de ser apanhado sem identificação ou só aparece ao padre Vaz Pinto e a ele próprio, como ambos alegam?

JCN diz que «a grande surpresa, a única Boa Nova que o mundo recebe é que Deus vem pessoalmente viver aqui no meio de nós». Será que já alugou casa, fez o contracto do gás, electricidade e água ou vai viver com o padre Vaz Pinto e o JCN?

Estes dois publicitários do divino dizem que não podem viver sem Deus. Para eles é o urso de peluche a que as crianças se agarram para vencer o medo.

Deus é uma espécie de anti-depressivo de que carecem pessoas pouco estáveis ou mais supersticiosas. É um placebo de resultados comprovados em pessoas instáveis mas pode tornar-se perigoso quando os clientes querem impor aos outros a mesma receita.

Eu já tomei óleo de fígado de bacalhau em doses suficientes. Deixo Deus só para eles. O pior é que os prosélitos não desistem de o impingir aos outros.

24 de Outubro, 2006 jvasco

Introdução à Blinologia

A blinologia é a disciplina do conhecimento e revelação que estuda os Blins, como o nome indica. Responderei aqui a algumas perguntas acerca desta visão do Universo, que abarca as questões mais profundas acerca do sentido da nossa existência.


O que são os Blins?

Os Blins são os perfeitos criadores do Universo, omnipotentes, omniscientes e omniverdes. São a Origem e o Fim, a Vida e a Morte, o A e o Ya. O blinólogo escolástico São Francisco de Alcabideche declarou em 1208 que os Blins seriam também aqueles alfinetes com cabeça em forma de joaninha que se espetam nas plantas de plástico. Historiadores modernos afirmam tratar-se de um erro na tradução do original hebraico, mas hoje em dia a adoração destes adereços é uma parte importante do culto Bliniano.

Porquê estudar os Blins?

O estudo dos Blins é o mais elevado empreendimento do intelecto humano, pois é a única via para revelar o propósito do Universo, o sentido da vida, e a verdadeira utilidade dos alfinetes com cabeça em forma de joaninha.

Mas não há evidências que os Blins existam, pois não?

A existência dos Blins é uma questão metafísica e transcendente que não pode ser abordada pela ciência, pois o método científico assume à partida uma posição exclusivamente ablínica. Mais, aceitar a existência dos Blins é um acto de fé, e a única forma de receber a Sua graça. Por isso nunca poderá haver argumentos ou evidências que demonstrem a existência dos Blins.

E se a fé não me chega para aceitar que os Blins existem?

Nesse caso, há argumentos e evidências que demonstram a existência dos Blins. Por exemplo, o argumento ontológico. Sendo os Blins os seres mais perfeitos que se pode conceber, e sendo um ser que existe mais perfeito que um que não existe, forçosamente os Blins terão que existir. Podemos também demonstrar a sua existência pelo argumento da afirmação, que diz que os Blins existem porque sim.
As evidências são também claras. O Universo é de tal forma complexo que a sua origem não pode ser explicada pelo acaso, o que prova que é uma criação dos Blins. Também a natureza humana testemunha a existência dos Blins, pois todos os povos e culturas crêem em seres sobrenaturais.

Quantos Blins existem?

O Credo Blim é bastante claro e explícito, dispensando qualquer explicação: «Creio em três Blins, e apenas três. Creio que os Blins são exactamente vinte e seis, e o seu número, que é quantos são, é trezentos e doze. Excepto às quartas feiras.»

Mas isso não é uma contradição?

Não.

Como explicar a existência do vermelho?

Este um dos grandes problemas por resolver na blinologia. Sendo os Blins omnipotentes e omniverdes, a existência do vermelho é algo surpreendente. Será talvez um mistério que ficará para sempre além da compreensão humana. Mas a hipótese mais aceite é que a existência do vermelho foi consequência do livre arbítrio humano, e da escolha que levou à expulsão do Paraíso, onde tudo era verde. Este exercício de vontade que levou a espécie humana a afastar-se da perfeição do verde é relatado com grande beleza nos escritos sagrados Blim, nomeadamente na história de Lucinda, o tremoceiro, e os três porcos cantores.

E o que faz um blinólogo?

Como investigador, o blinólogo pesquisa textos antigos de blinólogos já falecidos, num esforço incessante para rescrever as mesmas ideias em frases ligeiramente diferentes. Este trabalho de leitura e contemplação metafísica tornam-no especialmente apto para se pronunciar sobre temas como a investigação em medicina, genética molecular, contracepção, e a orientação sexual de cada indivíduo.

——————————–[Ludwig Krippahl]