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Dia: 16 de Junho, 2004

16 de Junho, 2004 André Esteves

Os 10 principais sinais de que se é um cristão fundamentalista

(Qualquer um destes sinais é suficiente para se ser um cristão fundamentalista.)

10 – Você vigorosamente nega a existência de milhares de deuses, de outras religiões, mas sente-se revoltado quando alguém nega a existência do seu.

9 – Você sente-se insultado ou «desumanizado» quando uns cientistas dizem que as pessoas evoluíram de outras formas de vida, mas não encontra nenhum problema com a afirmação bíblica de que fomos criados a partir da lama.

8 – Ri-se dos politeístas, mas não encontra nenhum problema em acreditar num deus triuno.

7 – A sua face fica púrpura quando ouve falar das atrocidades que allah realizou, mas nem sequer pisca os olhos quando ouve acerca de como deus/jeovah massacrou todos os bebés do Egipto e ordenou a eliminação de tribos e grupos étnicos completos no livro de Josué — incluindo mulheres, crianças e até as árvores!

6 – Você ri-se das crenças hindus que deificam homens mortais, e das histórias dos mitos gregos, em que os deuses fornicavam com mulheres mortais. Mas não encontra nenhum problema com a história que o espírito santo engravidou Maria, que então deu à luz um homem-deus, que depois foi morto, ressuscitou e ascendeu aos céus.

5 – É capaz de passar toda a sua vida, à procura de buracos lógicos na idade cientificamente estabelecida da terra (4,55 mil milhões de anos), mas não encontra nenhum problema em acreditar em datas gravadas por homens de tribos da idade do bronze, sentados nas suas tendas, que «adivinham» que a terra é umas gerações mais velha.

4 – Você acredita que toda a população deste planeta, com a excepção dos que partilham a sua crença — irão passar a eternidade num inferno infinito de sofrimento. E no entanto, considera a sua religião como «a mais tolerante» e «cheia de amor».

3 – Enquanto a ciência moderna, a história, geologia, biologia e física não o conseguiram convencer do seu valor prático, um idiota qualquer, a espumar-se da boca, a rolar-se pelo chão e a falar línguas é toda a prova de que necessita para «provar» a cristandade.

2 – A sua definição de sucesso é de 0.01% quando se trata de orações respondidas. Considera isso como prova de que a oração funciona. E as restantes 99,99% não respondidas são simplesmente a vontade de deus.

1 – Você, na realidade, sabe muito menos do que muitos ateus e agnósticos acerca da Bíblia, do cristianismo e da história da igreja – mas continua a chamar-se a si próprio de cristão…

Encontrado e traduzido de http://www.evilbible.com e da http://exchristian.net (em inglês)

16 de Junho, 2004 Carlos Esperança

A visita pascal – crónica piedosa

O Senhor Jesus Ressuscitado viajava, no Domingo de Páscoa, pelas casas da aldeia a recolher o ósculo e a esmola dos devotos. Onde não chegava antes do anoitecer ia no dia seguinte, com desgosto dos paroquianos que o aguardavam. A bênção valia o mesmo, é certo, mas perdia-se o tempo da espera e era diferente. Por isso, para não contrariar os mesmos, todos os anos mudava o itinerário.

Transportava-o o sacristão, que o entregava ao vigário em cada paragem, e era acompanhado por devotos que aliviavam a alma e recolhiam esmolas suplementares para os santos que exornavam a igreja local. Um garoto levava a caldeirinha de água benta que passava ao sacristão enquanto o padre se ocupava da cruz e recolhia-a depois deste despachar a tarefa e de se ocupar do hissope, num movimento de rotação, a aspergir com vigor, em cada lar, um círculo protector das investidas do demo, bênção que não deixaria de acautelar também o vivo que morava na corte, por baixo.

Era um tempo em que não havia vírus nem pneumonias atípicas, as pessoas viviam porque Deus queria e finavam-se quando o Senhor era servido, sem intromissão do médico a estorvar a divina vontade de as chamar.

Em todas as casas as vitualhas aguardavam a visita ao lado de uma garrafa de jeropiga rodeada de cálices. Entrava primeiro o padre, seguido do sacristão e do garoto que conduzia a caldeirinha. Aguardavam nas escadas os outros para depois os revezarem. Genuflectiam-se os da casa, por ordem cronológica, para beijar o pé do Jesus até chegar ao chefe de família que era o último a ajoelhar e o primeiro a soerguer-se. Borrifada de água benta a habitação, recolhida a esmola destinada ao Ressuscitado, a mais substancial, o padre bebia um trago de jeropiga e mordiscava um naco de pão-de-ló, por consideração, enquanto o sacristão aviava o cálice, de um sorvo, e se desforrava nos bolos. Às vezes demoravam-se mais um pouco para que o senhor padre rezasse uns responsos a rogo, geralmente por alma de quem tinha deixado com que pagar o latim.

Havia no séquito que aguardava nas escadas um homem por cada santo que ornava os altares da igreja, disponível para arrecadar a oferenda. Assim, enquanto o padre e o sacristão desciam, subiam eles para recolher, se a houvesse, a esmola que a cada santo cabia, consoante as posses e a devoção dos anfitriões. Creio que os turnos de acesso se estabeleciam em função do espaço e não da liturgia.

Mais de metade da paróquia percorrida, com o padre e o sacristão aguentando o múnus a pão-de-ló e regada a fé a jeropiga, a vingar-se o último, a conter-se o primeiro, a acelerarem todos para as casas que faltavam, o sacristão avaliou mal a distância que o separava das escadas na última casa onde entraram, abalroou o garoto que transportava a caldeirinha que logo a soltou, verteu a água e arremessou o hissope contra a parede. Foi grande o reboliço enquanto o sacristão e a cruz varreram enrolados as escadas sem que alguém do séquito lhes deitasse a mão, impávidos, como se evitassem estorvar se acaso fosse promessa a queda.

O padre, vermelho de raiva e da jeropiga, aguentou-se nas pernas e conteve a língua, ao cimo das escadas, enquanto, sem largar a cruz, se despenhou por entre as alas de acompanhantes o sacristão. Este recuperou rapidamente o alinho e endireitou a cruz, sem ninguém se aleijar, Deus seja louvado, e o padre despachou logo um paroquiano com uma jarra de vidro a caminho da igreja a sortir-se de água benta, com o aviso de se apressar, estava a fazer-se tarde, faltava ainda muito povo para aviar. Se recriminações houve ficaram reservadas para a discrição da sacristia.

No dia seguinte as conversas da aldeia começavam todas por Deus me perdoe, seguidas de persignações apressadas e de risos amplos, terminando em ansiedade, pelo pecado cometido ou pelo temor da desobriga, mas ninguém resistiu a contar o sucedido e a comentá-lo, sendo mais forte a tentação do que a piedade.