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Dia: 18 de Julho, 2014

18 de Julho, 2014 Carlos Esperança

Associação Ateísta Portuguesa (AAP) na TVI

Por

Jorge Madeira Mendes

No programa da TVI «Você na TV», de 17 de julho último, foram manifestas as contradições do «campo» pró-batismo. Desde logo, o argumento, defendido por alguns entrevistados, de que os pais devem tomar a iniciativa de batizar os filhos na sua mais tenra idade, comparando tal iniciativa com o ato de os mandar para a escola, em que não se aguarda a aprovação dos visados.

Esta comparação é descabida: a escola destina-se a incutir conhecimentos científicos e educação cívica, o que nada tem a ver com doutrinação em crenças e dogmas de fé.

Por outro lado, a afirmação do padre presente no debate (Avelino, creio) de que o batismo é um ato de amor por parte dos pais, porque assim integram os filhos na «Casa de Deus»:
Em primeiro lugar, nem sempre os pais batizam os filhos por sua livre vontade. Quantas vezes não o fazem por simples inércia, por fidelidade a uma tradição que julgam inócua… Quantas vezes não o fazem (ou, pelo menos, faziam) por pressão social, por receio de represálias: foi o meu caso, pois as freiras a quem o Estado tinha adjudicado o ensino na escola oficial da localidade do interior de Moçambique onde passei a infância ameaçaram não nos aceitarem no ano letivo seguinte se eu e o meu irmão não nos batizássemos (e o meu pai, apesar do seu anticlericalismo, preferiu não entrar em confronto com as «forças vivas» locais).

Mas, mesmo quando os pais batizam os filhos de livre vontade e em toda a boa fé (ou seja, no tal «ato de amor»), jamais essa decisão pode condicionar as futuras opções dos batizados: também há pais que, com a melhor das intenções, inscrevem os filhos, à nascença, em clubes desportivos e até em partidos políticos; faltaria que tais gestos imprimissem uma obrigação irrevogável sobre os filhos.

Ora, a qualquer cidadão que, à sua nascença ou na sua infância (mas, em todo o caso, à revelia da sua vontade), tenha sido inscrito como membro de um clube desportivo ou de um partido político, assiste, na sua maioridade, o direito de prosseguir livremente a pertença a tais agremiações ou, pelo contrário, de a repudiar; de modo idêntico, aqueles que são batizados (e, consequentemente, filiados na agremiação que dá pelo nome de Igreja Católica Apostólica Romana), numa fase da vida em que não têm capacidade para a livre formulação de escolhas, deveriam, na sua maioridade, ter o direito de anular tal inscrição.

Disse ainda o padre Avelino que o «desbatismo» é inviável porquanto, se se eliminasse a página de um registo de batismo, automaticamente se destruiria um outro registo constante do verso da mesma folha. Argumento ridículo: em qualquer situação deste género, inclusive nos livros do registo civil, há espaços para adendas, em atenção a eventuais alterações na situação do inscrito. Por isso, para «desbatizar» alguém, bastaria acrescentar, no correspondente registo, uma pequena nota do tipo «renunciou ao batismo, de livre vontade, na data de…»; ou até passar um simples risco sobre o texto, desse modo não danificando qualquer outro registo constante da página oposta e referente a outro cidadão que, de sua livre vontade, pretendesse continuar a ser ovelha no rebanho da ICAR (os termos «ovelha» e «rebanho» não são sarcasmo meu: pertencem à nomenclatura da própria ICAR).

Mas, claro, à Igreja não interessa cumprir estes mínimos de probidade, porque «desbatizar» alguém implica diminuir os efetivos teóricos das suas hostes, efetivos esses que, empolados, lhe permitem vangloriar-se como organização maioritária no seu ramo (e, por aí, reivindicar privilégios).

E se as instituições eclesiásticas do mundo ocidental, designadamente a Igreja Católica, passaram da atitude intimidatória e prepotente (o deus-ira, o temor, a submissão, o inferno de labaredas eternas, como referiu o próprio apresentador do programa, Manuel Luís Goucha) para o discurso suave e manso de agora, com tónica na «humanidade», no «perdão», no «amor», etc., essa evolução não deve ser vista como inerentemente virtuosa, mas antes como uma tática para a consecução dos fins supremos que as instituições eclesiásticas sempre visam: o controlo da massa social. Se lhes facultam poderes para tal, impõem-se, pela força, pela prepotência; quando as sociedades evoluem e os tempos reduzem as vias da discricionariedade, adotam artimanhas hipócritas (como, por exemplo, papas popularuchos, tipo João Paulo II ou o atual Francisco) — mas o fim é sempre o mesmo: dominar as mentes.

Como todas as organizações vocacionalmente totalitárias, a Igreja Católica só não continua a exercer hoje um papel idêntico ao do Islão nas sociedades onde este é maioritário porque a evolução das sociedades ocidentais lhe impôs uma delimitação (ainda que relativa) da sua ação.

18 de Julho, 2014 Luís Grave Rodrigues

Vedor