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Dia: 17 de Maio, 2009

17 de Maio, 2009 Carlos Esperança

Cristo-Rei – 50.º aniversário

Nascido da megalomania conjunta da ditadura e do episcopado, com pretensão de imitar o Cristo do Corcovado, fez-se a obra, de gosto duvidoso, como destino de peregrinações para cultivar o nacionalismo e a fé. Ao sítio falta a beleza do Corcovado, ao monumento  a dignidade do original e a ambos a grandeza e a formosura que serviram de inspiração.

Assistiram à inauguração os piores daquele tempo. Salazar e os ministros, Cerejeira e os bispos, a força pública e o público à força. Passado algum tempo houve a peregrinação sob o lema «Os novos escolhem Deus», uma torrente de jovens e de oportunidades para atenuar a castidade.

O cardeal Cerejeira exortou, então, os jovens a irem para África defender a civilização cristã e ocidental. Depois vi o comportamento do exército colonial e percebi o que era a civilização cristã e ocidental, com as armas benzidas e militares assistidos por capelães para que não lhes faltassem as missas e os últimos sacramentos.

O conúbio obsceno entre o regime fascista e o clero romano levou muitos a duvidar da virtude dos padres e do martírio de deus. A cumplicidade da ditadura com o clero foi o alarme que levou muitos padres a abandonar a Igreja e muitos jovens a evitar os padres.

Cinquenta anos depois, altos dignitários da Nação, não respeitam a separação da Igreja e do Estado e vão abrilhantar o espectáculo pio com a vergonhosa presença na cerimónia beata de uma religião particular.

É difícil distinguir os que hoje frequentam as comemorações pias dos que, há cinquenta anos, perseguiam os que não se ajoelhavam. Se a ditadura se mantivesse, podiam ser os mesmos a gravitar em torno das sotainas, tal a falta de pudor republicano e a desfaçatez com que confundem as devoções particulares com as funções de Estado.

Antero de Quental tinha razão quando diagnosticou as causas da decadência dos povos peninsulares. Em relação a Portugal mantêm-se actuais.

Post Scriptum – Na designação de Cristo-Rei permanece o paradigma da Igreja católica – a monarquia absoluta, cujo chefe é o rei, assim na terra como no Céu.

17 de Maio, 2009 palmirafsilva

Não se importa de repetir – II?

O cardeal Cormac Murphy O’Connor é o presidente da conferência episcopal de Inglaterra e do País de Gales e foi até há cerca de um mês o arcebispo de Westminster. O cardeal, conhecido pelas suas posições agostinianas sobre sexo e «liberais» em relação a pedofilia no seio da igreja, ainda enquanto dignitário mor da hierarquia católica inglesa debitou esta lucubração absolutamente espantosa de que secularistas e ateus não são completamente humanos.

Embora esta posição não seja exactamente nova e tenha justificado a eliminação de inúmeros «outros não completamente humanos» ao longo da História da humanidade, a sua cândida assumpção pelo prelado é arrepiante no século XXI. Em particular, deixa-me na dúvida sobre os métodos que o cardeal considera deverem ser usados para me tornar «completamente humana» ou sobre se considera que a minha existência de sub-humano tem menos valor que a de outro «completamente» humano, aka religioso.

As nossas caixas de comentários são testemunho de um fenómeno bem mais geral; a cristianovitimização que se traduz em ululações constantes por parte dos crentes de supostos insultos de ateus – que podem ser coisas tão rudes como considerar que Fátima ou o Cristo Rei devem ser incluídos nos Horrores de Origem Portuguesa que de facto são ou descrever uma hóstia como, horror dos horrores, uma hóstia e não o corpo do cristo.

Claro que os mesmos que carpem a intolerância, catolicofobia, cristofobia, preconceito anti-religioso nos 166 comentários ao post do Miguel ou que estridentemente exigem pedidos de desculpa pelo insulto e falta de respeito dos jornalistas que se referem a uma hóstia como uma hóstia, devem achar completamente pacíficas e nada insultuosas as palavras do bispo. Ou antes, devem considerá-las como reflectindo uma «posição razoável e equilibrada» dos crentes em relação aos ateus, que contrastarão certamente com a minha atitude inadmissível, «radical» e incitadora de fundamentalismos sortidos (nos crentes) de relatar mais esta tonteria de outro responsável da hierarquia católica…

Em stereo na jugular.

17 de Maio, 2009 Carlos Esperança

Justas preocupações de um leitor

Neste momento, a RTP – a televisão paga por todos nós – está a emitir uma mensagem de obscurantismo a todos os títulos inadmissível. Li, em rodapé, que do programa do aniversário da inauguração do “cristo-rei” – pois é disso que se trata – fazia parte a “recepção a nossa senhora”.

Ora, eu não sei, ao certo, quem é essa tal “nossa senhora”; mas suponho que se trata de uma boneca a quem, contrariando a dita “lei de Deus”, se presta culto, numa imitação foleira do anacrónico politeísmo idólatra. E a RTP transmite isso!!!

Eu não sei até que ponto a Igreja tem legitimidade para, em nome de uma efeméride bacoca e medieval, inundar as ruas de Lisboa com procissões e outras manifestações de gosto mais que duvidoso; mas, como ainda acredito na boa fé dos homens, parto do princípio que foram preenchidos os eventuais requisitos legais, como se de uma manifestação pública contra a fome se tratasse. Mas não posso admitir que uma estação televisiva DO ESTADO (ou seja, nossa, paga por todos nós), dedique, através dos seus vários canais, mais de vinte e quatro horas a este espectáculo, digno dos piores espectáculos religiosos da Malásia.

Pergunto: que posição vai, a AAP, tomar?

Saudações ateístas.

a) José Moreira