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Teologia em tempo de SIDA

A condenação católica do uso de preservativos, «tanto como medida de planeamento familiar, como em programas de prevenção da SIDA», associada a campanhas de mentira deliberada sobre o seu uso, nomeadamente em África em que responsáveis locais, para além de organizarem orgias de fé em que tentam agradar ao Senhor queimando preservativos, asseveram que é o preservativo o culpado pela disseminação da SIDA, tem sido desde sempre alvo de críticas, inclusive da Organização Mundial de Saúde.

Agora chegam-nos notícias de que Ratzinger pediu a um grupo de teólogos e cientistas (espero que o Opus Dei Alfonso López Trujillo, o tal que diz que o vírus é suficientemente pequeno para passar pelos poros (?) dos preservativos, não esteja incluído no grupo) para prepararem um documento que analise e discuta o uso de preservativos como forma de prevenir a transmissão do HIV.

O pedido foi divulgado escassos dias depois de o cardeal Carlo Maria Martini, um candidato «liberal» – logo sem hipóteses – ao trono papal em Abril do ano passado, ter desafiado a posição oficial da ICAR sugerindo que o preservativo era um «mal menor» no combate à SIDA.

Considerando não só a posição de Ratzinger sobre o tema como também o peso que a Opus Dei , de que o actual Papa é um grande fã, tem actualmente no Vaticano e sabendo ainda que o objectivo desta sinistra seita é a imposição a todos, via a sua influência política, dos ditames mais retrógrados e inflexíveis do Vaticano no que respeita às mulheres, sexualidade e saúde reprodutiva, acho que não devemos esperar alterações radicais na posição católica em relação ao uso do preservativo na profilaxia da SIDA.

Não esquecendo ainda que na sua alocução em Junho último aos bispos católicos de África Bento XVI reiterou a posição do Vaticano (e a sua enquanto Ratzinger) quando afirmou que a abstinência era a única forma de combate à SIDA e que o Vaticano cancelou a participação da cantora Daniela Mercury no concerto de Natal, porque a cantora, embaixadora da Unicef e da UNAIDS (programa da ONU para o HIV/SIDA), participou em campanhas de combate à SIDA, em que defendeu o uso de preservativos como medida profiláctica deste flagelo.

De qualquer forma já seria uma grande vitória para a humanidade se os representantes do Vaticano no Terceiro Mundo pelo menos não disseminassem mentiras sobre os preservativos mas especialmente se permitissem não só a sua distribuição como uma educação correcta sobre o seu uso nos 100 000 hospitais e 200 000 serviços de saúde que controlam!

E pode ser que os teólogos agora convocados consigam produzir um qualquer sofisma, talvez análogo ao debitado em relação à moralidade da inoculação de crianças católicas com vacinas preparadas a partir de fetos abortados, sofisma que permita práticas «imorais», neste caso o uso do preservativo.

O que é certo é que mesmo que um «milagre» ocorra e o Vaticano adopte uma posição menos criminosa em relação ao uso do preservativo teremos de esperar uns séculos para ouvir um me(i)a culpa da ICAR em relação à sua contribuição para a disseminação do flagelo da SIDA.