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Dia: 11 de Abril, 2006

11 de Abril, 2006 Carlos Esperança

Depois de Maomé…o Papa


A Conferencia Episcopal Alemã (CEA) pediu a intervenção dos organismos que controlam a televisão e a Comissão de Protecção da Juventude para analisarem o conteúdo de um anúncio da MTV (na imagem), por entender que caricatura o Papa.

Segundo o comunicado da CEA o anúncio do canal televisivo musical contém elementos que «ridicularizam a fé cristã» e vai recorrer para o Conselho Alemão de Publicidade.

Os mullahs indignaram-se contra as caricaturas de Maomé. Os bispos insurgem-se contra a caricatura do Papa. Enfim, a liberdade de expressão colide sempre com as idiossincrasias eclesiásticas.

11 de Abril, 2006 pfontela

Os teocratas que não sabiam contabilidade

Uma das principais (senão a principal) organizações do lobby conservador na América está em graves apuros financeiros. Ao longo dos anos a “Christian Coalition” tem vindo a acumular dívidas significativas (que actualmente ultrapassam os 2 milhões de dólares) e a perder membros que sentem que com um governo conservador a organização não faz sentido ou que deixou de ter credibilidade devido aos muitos escândalos em que está envolvida.

O primeiro golpe foi dado quando a reputação dos dois fundadores (Ralph Reed e Pat Robertson) foi para o caixote, o primeiro porque tem ligações altamente suspeitosas com o corrupto mais famoso dos Estados Unidos, Jack Abramoff (entre outros comportamentos menos éticos ao longo da carreira…) e o segundo porque é um bacoco que diz asneiras a mais até para qualquer cristão ultra-conservador (literalmente destruiu a sua reputação dando entrevistas que fazem Torquemada parecer um rapazito simpático).

Para continuar a litania das desgraças existem acusações de nepotismo dirigidas à nova presidente, que curiosamente contratou a sua filha e o seu genro para trabalharem lá com direito a generosos salários… eu pensaria que a gratificação de servir o Senhor seria suficiente, mas aparentemente não é…

Isto por sua vez só veio ser agravado quando Tracy E. Ammons (o genro que era professor e que recebeu a promoção milionária) pediu um divórcio e resolveu pôr a boca no trombone. Ammons acusou claramente a organização de ter má fé nas suas relações comerciais, afirmando que era prática comum esperar até serem processados até saldar as dívidas.

A actual administração da Christian Coalition continua com muita fé [lol – é caso para rir] em que a organização se irá manter de pé mesmo depois de ter sido desmascarada como um poço de interesses sórdidos misturados q.b. com casos de demência religiosa (que bordam o patológico). Não faço previsões quanto ao futuro destes senhores mas acredito que até se safem de tudo isto já que enquanto existirem pessoas que acreditem neles cegamente, que se recusem a enfrentar os factos e se limitem a seguir em vez de pensar por si próprios (em resumo: que continuem a rever-se numa mentalidade de manada) haverá sempre um futuro dourado para demagogos, hipócritas e fanáticos de todas as espécies.

11 de Abril, 2006 Ricardo Alves

Civilizacionistas pseudo-laicos contra clericais

A emissão de ontem do programa popularmente conhecido como «Prós e Prós» foi menos desequilibrada do que eu esperava. Fátima Bonifácio e António Barreto (duas escolhas surpreendentes para representar a perspectiva laica…) estiveram razoavelmente bem, embora Bonifácio seja mais conservadora do que a generalidade dos laicistas quanto ao casamento entre homossexuais, e Barreto tenha evitado deliberadamente discutir a interrupção voluntária de gravidez. Quanto ao público, é francamente escandaloso que tenha sido escolhida «uma chusma de “Morangos com Açúcar”, a tresandar a colégio com nome de santo» para servir de claque ao Talibã das Neves, e que não tenham sido convidados ateus e agnósticos para o público, ao contrário do que acontecera em ocasiões anteriores.

Nestas condições, o cardeal Saraiva conseguiu difundir a mentira habitual segundo a qual o tratado constitucional europeu «ofendeu» de alguma forma os católicos por o Preâmbulo não conter uma referência ao cristianismo, sem que nenhum dos «laicos» lhe recordasse que a ICAR, ao garantir um direito de consulta institucional através do artigo I-52º, conseguiu uma vitória tal que em França os bispos até apelaram ao «sim» no referendo, e que em Portugal Policarpo se preparava para fazer o mesmo.

Saraiva foi também espalhando números fantasiosos sobre os muçulmanos residentes na Europa (os 35 milhões que referiu são um exagero enorme, mesmo contando com os habitantes de Istambul) e apelando implicitamente a uma «Cruzada» contra o Islão, a única religião que segundo os participantes do programa de ontem tem «fundamentalistas». Aliás, Bonifácio convergiu com Saraiva na preocupação quanto à destruição da «identidade cultural» europeia, o que é paradoxal quando se considera que Fátima Bonifácio foi impecável na defesa da liberdade individual como fundamento da nossa polis (e assim encostou César das Neves à parede de forma exemplar), liberdade individual essa que, cara senhora, acarreta o direito de abandonar a «identidade cultural» e de não ser oprimido por esta. Implica o direito de ter filhos quando se quer ou mesmo de não os ter, mas também pode resultar numa Europa que não seja branca nem cristã, o que não compreendo que a incomode se defende efectivamente a herança iluminista.

César das Neves atreveu-se a dizer que os conflitos religiosos em Portugal foram curtos, sem que ninguém lhe tivesse recordado que cristãos e muçulmanos estiveram em guerra no nosso território de 711 a 1249; que em 1496 os judeus foram convertidos à força e em 1506 massacrados no pogrom de Lisboa; que a Inquisição se estabeleceu em 1536 e durou até 1821; que em 1846 ainda se perseguiram protestantes na Madeira; e que as minorias religiosas só começaram a sair da clandestinidade em 1911, com a República.

Rendo no entanto a minha homenagem a César das Neves, que tentou explicar que a verdadeira clivagem se nota nas questões de família, e é entre laicistas e clericais (sendo estes muçulmanos ou católicos), ao contrário do que pensam Bonifácio e Barreto, que me pareceram excessivamente obcecados com a sua «guerra civilizacional». E quero destacar a intervenção de um jovem católico que se mostrou pronto para ser terrorista (e consequentemente matar milhares de pessoas) se o proibissem de usar um penduricalho que trazia ao peito. Esse jovem mostrou a quem quiser ver qual é raiz de acontecimentos como o 11 de Setembro: a imunidade ética que a religião confere aos crentes.