Diario de uns Ateus

  • Home
  • Contactar
  • AAP

Domingo – dia do Senhor

10 de Janeiro de 2005  |  Escrito por Carlos Esperança  |  Publicado em Não categorizado  |  Comentar

Contra a abertura do comércio ao domingo, marchar, marchar…

O Movimento pelo Encerramento do Comércio ao Domingo, onde se destaca o pio Bagão Félix, de frouxa sensibilidade social e exacerbada devoção religiosa, consegue o apoio dos sindicatos e do patronato. Não me seduz a cassete neoliberal em voga, mas irrita-me a obstinação da ICAR em apropriar-se do domingo e atribuir-se outros dias, que crismou de santos e equiparou a feriados nacionais.

Se o dogma é um insulto à inteligência mas uma vitória para a fé, se agride a razão mas purifica a alma, se fecha os caminhos difíceis da ciência mas abre as largas avenidas da salvação, é difícil haver quem o enjeite, mas a Câmara Municipal do Porto prepara-se para pecar. Parafraseando o Eça, cabe à Vereação, moderadamente jejuada, razoavelmente confessada e melhor comungada, pronunciar-se piedosamente sobre o horário do comércio.

O Governo privatizou as seguradoras e os bancos; condescendeu com a liberalização dos combustíveis e da energia; as comunicações e os cimentos entregou-os aos privados, mas chamou a si o horário das mercearias. Nos mares, nas estradas e nos ares circula a iniciativa privada mas respeita-se, na compra do sabão amarelo, o horário das repartições. Não tem horário a gasolina mas têm hora marcada a posta de pescada e o quilo de feijão carrapato.

Andou bem o Governo, há anos, em proibir às grandes superfícies a abertura de portas ao Domingo. Preferiu a santa missa à venda dos legumes; dificultou a aquisição de frescos mas facilitou a divulgação das homilias; alguns bacalhaus ficaram por vender mas promoveu-se a eucaristia, com hóstias sem código de barras, nem prazo de validade, guardadas sem rede de frio nem inspecção sanitária. Folgam as caixas registadoras aos Domingos mas agitam-se as bandejas nas santas missas.

Contrariamente ao que era de esperar, não houve, porém, festa nas sacristias, não rejubilou o episcopado, não aconteceu um lausperene. Nem uma missa de acção de graças. Nem uma novena. Provavelmente algum padre-nosso rezado na clandestinidade ou uma ave-maria balbuciada por uma beata enquanto resistia à tentação da carne e ao assédio do marido. A própria Conferência Episcopal desistiu da pastoral da mercearia.

E vem agora a Câmara Municipal do Porto com um regulamento sobre horários de funcionamento dos estabelecimentos comerciais na cidade, capaz de os encher ao Domingo, enquanto à luz mortiça das velas um padre boceja uma homilia para meia dúzia de resignados devotos.

 

Arquivo Histórico

Colaboradores

  • Abraão Loureiro
  • Associação Ateísta Portuguesa
  • Carlos Esperança
  • David Ferreira
  • Eduardo Costa Dias
  • Eduardo Patriota
  • Fernando Fernandes
  • João Vasco Gama
  • José Moreira
  • Ludwig Krippahl
  • Luís Grave Rodrigues
  • Onofre Varela
  • Palmira Silva
  • Raul Pereira
  • Ricardo Alves
  • Ricardo Pinho
  • Vítor Julião

Diário

Janeiro 2005
S T Q Q S S D
 12
3456789
10111213141516
17181920212223
24252627282930
31  
« Dez   Fev »

Commentadores:

Administração

  • Iniciar sessão
  • Feed de entradas
  • Feed de comentários
  • WordPress.org


©2021 Diário de uns ateus
Concebido na plataforma WordPress sobre tema desenvolvido por Graph Paper Press.