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O beato da discórdia

A recente beatificação do imperador Carlos I está a causar polémica na Áustria e na Madeira.

Após a cerimónia de consagração, grupos austríacos e autoridades madeirenses começaram a disputar a transferência ou permanência dos restos mortais do monarca na Igreja do Monte, no Funchal, onde está sepultado. E isto porquê? Porque as hordas de peregrinos são acompanhadas de grande circulação monetária.

A utilização do imperador como chamariz de turistas à Madeira foi criticada pelo vigário-geral da diocese funchalense, cónego Pita Andrade. Por seu turno, o bispo do Funchal, D. Teodoro Faria, sugeriu a criação de um núcleo museológico dedicado ao imperador e o presidente do Governo Regional, Alberto João Jardim, presente na cerimónia de beatificação, no Vaticano, confirmou a intenção de explorar esta nova atracção turística. «A Madeira passa a ter no seu território a sepultura de um beatificado. De um ponto de vista espiritual e religioso, é uma marca», afirmou.

Alberto João Jardim, justificou a sua presença no Vaticano dizendo que se trata «de alguém ligado à história da Europa, aos países que formaram o antigo império austro-húngaro, com ligações históricas a vários países estrangeiros, implica uma certa atenção cultural desses países ao santuário do Monte».

Tanto na Áustria como na Madeira, as opiniões sobre a beatificação do imperador divergem e a Igreja tem vindo a ser ridicularizada pelos milagres atribuídos a Carlos I. O padre José Luís Rodrigues, pároco de S. Roque diz não perceber «ainda o que teve de extraordinário este homem, nem muito menos se percebe o que tenha feito de relevante pela Igreja da Madeira». Para além de José Luís Rodrigues não encontrar «nada que prove» que a vida de Carlos I foi «tão alta e tão sublime que mereça distinção de santidade para ser venerada pelos fiéis», o milagre mais relevante seria o de uma freira brasileira que rezou ao imperador pela cura das suas varizes, o que constitui «outro aspecto que redunda em brincadeira de gosto duvidoso». E prossegue: «todos os milagres que me contam são de uma infantilidade atroz e redundam numa ofensa grave contra a inteligibilidade da fé».

A juntar a tudo isto, «não se vê entre nós uma avalanche de devotos a Carlos de Áustria nem um movimento de oração à volta da sua pessoa». Na verdade, «a maioria da população da Madeira não sabe nada desta figura ou simplesmente nunca ouviu falar dela», afirma o pároco.

Na terra natal do imperador, foi contestada igualmente a presença do presidente do Parlamento e de uma representação governamental na cerimónia papal, por violação do princípio de separação do Estado e da Igreja. Por estes lados, ninguém se queixou de um membro do aparelho estadual ter participado, nessa qualidade, na beatificação.