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É tempo de Deus entrar de baixa

Os clérigos dizem que os ateus não foram «tocados pela fé». E, sempre que podem, não deixam de tocá-los, como quem toca uma alimária que recusa estugar o passo ou um boi que pretende esquivar-se ao açougue.

Não se detêm a reflectir como é possível que, havendo um único Deus verdadeiro – como alegam -, o dito Deus seja, conforme a latitude, mais cruel, estúpido ou prepotente; de acordo com o regime político, capaz de punir os homens com a pena de morte ou ter de aguardar, cinicamente, para os condenar depois às perpétuas penas; consoante o período histórico, fomentar guerras santas ou resignar-se à liberdade e ao desprezo que lhe votam as criaturas cuja criação lhe atribuem.

Se Deus não fosse o pretexto para a intolerância, a prática de crimes e a crueldade, mereceria aos ateus a mesma simpatia dos deuses gregos ou romanos, das lendas e das fantasias que se perpetuaram de geração em geração.

Quem será capaz de explicar as idiossincrasias que levam Deus a babar-se de gozo com as penitências, as genuflexões, as orações, os jejuns, as flagelações ou as peregrinações? Que mania o leva a reprimir a sexualidade, a ofender a dignidade da mulher ou a ditar a moda no vestuário? Deus consegue ter todas as taras dos homens e nenhuma das suas virtudes.

Na coutada da Igreja Católica (ICAR) Deus era um entusiasta de churrascos para hereges, bruxas e judeus e revelou aos empregados imaginativos instrumentos de tortura com que se deliciava a observar os esgares de dor enquanto um padre os confortava com a exibição da cruz; no Médio Oriente pela-se por decapitações e amputações e atinge o divino gozo com as vergastadas públicas ou as lapidações de adúlteras; na Índia o senhor Deus lá do sítio ainda hoje não compreende que uma viúva recuse acompanhar o defunto à pira funerária.

Há quem leve Deus a sério e lhe agradeça o mal que faz.