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Dia: 10 de Janeiro, 2016

10 de Janeiro, 2016 Carlos Esperança

A decadência, colapso e descrédito da adoração a Deus*

*Texto do livro de Christopher Hitchens “Deus não é grande”

(enviado por Paulo Franco)
A decadência, colapso e descrédito da adoração a Deus não começam num momento dramático, como o pronunciamento histriónico e contraditório de Nietzsche de que Deus estava morto. Era impossível Nietzsche saber isso, ou presumir que Deus alguma vez tinha estado vivo, da mesma forma que um padre ou um curandeiro não poderiam jamais saber qual era a vontade de Deus. Antes, o fim da adoração a Deus revela-se no momento, que é de certa forma mais gradualmente revelado, em que se torna opcional, ou apenas uma de muitas crenças possíveis.

Convém não deixar de realçar que, para a maior parte da existência humana, essa «opção» não existiu verdadeiramente.

Pelos muitos fragmentos de textos e confissões queimados e mutilados sabemos que houve sempre seres humanos que não se deixaram convencer. Mas desde a época de Sócrates, que foi condenado à morte por espalhar um ceticismo nocivo, tornou-se imprudente seguir o seu exemplo, e para milhares de milhões de pessoas ao longo dos tempos, a questão pura e simplesmente não se colocou.

Muitas religiões surgem agora diante de nós com um sorriso afetado e insinuante e mãos estendidas, como um comerciante adulador num bazar. Oferecem consolo, solidariedade e elevação, como se estivessem a competir num mercado. No entanto, temos o direito de recordar como se comportaram de forma bárbara quando eram fortes e faziam uma oferta que as pessoas não podiam recusar. E se por acaso nos esquecermos como deve ter sido, basta-nos olhar para os Estados e sociedades onde o clero ainda detém o poder de impor as suas regras.

Nas sociedades modernas, os vestígios patéticos desta atitude podem ser vistos nos esforços feitos pela religião para garantir o controlo da educação, para não pagar impostos, ou para aprovar leis que proíbem as pessoas de insultar a sua divindade omnipotente e omnisciente, ou mesmo o seu profeta.

Na nossa condição semilaica e medíocre, até os religiosos falarão com embaraço sobre o tempo em que os teólogos discutiam problemas fúteis com uma intensidade fanática: medir o comprimento das asas dos anjos, por exemplo, ou debater quantas criaturas míticas podiam dançar na
cabeça de um alfinete.

Para reforçar a repugnância de tudo isto, claro que é horrível recordar quantas pessoas foram torturadas e mortas e quantas fontes de conhecimento foram atiradas para as chamas, em falsas discussões sobre a Trindade, ou o hadith muçulmano, ou a chegada de um novo Messias.