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Outra vez a Eutanásia

Texto de Onofre Varela, previamente publicado na imprensa escrita.

A Assembleia da República tornou a emendar, discutir e aprovar a chamada Lei da Eutanásia que permite a quem pretende sair da vida poder fazê-lo com legitimidade depois de cumpridas as formalidades que descartam o crime, afirmando a vontade do próprio que agoniza em sofrimento sem quaisquer hipóteses de retrocesso do mal que o condena a um fim doloroso que recusa… até mesmo a possibilidade de ser tratado com sedativos e morfina contra a dor… o que também recusa

Como em todas as resoluções políticas, também esta tem os seus defensores e os seus detractores. 

Porém, no caso da Lei da Eutanásia, encontro na vontade dos detractores uma prepotência e arrogância contra a minha legítima vontade de sair da vida quando ela não me interessar, exactamente porque a minha vida é minha, só minha, e esta minha propriedade não é transmissível, nem discutível ou negociável. 

Numa sociedade saudavelmente democrática ninguém é dono de ninguém e cada um tem direito à sua própria vida e à sua legítima vontade. É essa vontade que a maioria do actual Parlamento quer ver respeitada, mas parte dos deputados não respeitam. O discurso de quem não aceita a Eutanásia, não tem Humanidade… só é um discurso religioso! Diz que “a vida humana é sagrada e só Deus a dá e pode tirar”. 

É um discurso ridículo porque atribui a razão da vida a uma entidade de ficção. Deus é uma figura de estilo que não é razoável nem comprovável. O que se sabe da figura de Deus é que é uma invenção humana, à sombra da qual os crentes de um qualquer registo religioso deifico são capazes de praticar o bem, mas também o mal. Persegue-se e mata-se com intenções religiosas e políticas contra a vontade dos perseguidos e dos assassinados… e no caso da Eutanásia recusa-se o direito de sair da vida a quem o deseja e quer fazer com dignidade! 

Deus é uma falácia porque, obviamente, o Homem já existia quando lhe ocorreu a ideia de criar um deus que o criasse… sem Homem não haveria Deus!… E é com base nesta criação abstracta de um conceito configurando uma mentira, que os respeitadores de Deus desrespeitam os homens. Deus não dá, nem tira, nem quer, coisíssima nenhuma… os homens é que dão, tiram e querem, e também o fazem em nome do deus que inventaram para dele se servirem em proveito próprio. 

A minha vontade de sair da vida só a mim diz respeito e não prejudica os interesses de ninguém. Quando muito poderia chocar (e choca) a minha família mais chegada que pretende ter-me junto a si para olhar para mim, conduídamente, vendo-me sofrer e definhar até à morte… o que me parece de um egoísmo atroz esquecendo a minha dignidade e a minha vontade, em favor da sua “caridadezinha”! 

É esse sofrimento e definhamento que quem reivindica a Eutanásia não aceita… e quer sair da vida, com toda a legitimidade de Ser Humano livre e consciente, antes que tal se manifeste. 

Os cidadãos que são contra a Eutanásia, na verdade são contra a vontade alheia e pretendem impor a toda a comunidade a sua própria vontade em desrespeito pela vontade do próximo. 

A Lei da Eutanásia não os obriga a recorrerem a ela… mas querem impedir a sua concretização a quem o deseja! 

Colocar o conceito deifico no meio desta questão, é tentar fazer, hipocritamente, lei da Fé; contrariando a lei da Razão e desrespeitando a vontade e a liberdade de decisão dos outros. 

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico) 

OV

Imagem de Tesa Robbins por Pixabay