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Dia: 14 de Fevereiro, 2015

14 de Fevereiro, 2015 Carlos Esperança

Laicismo, laicidade e hipocrisia

O laicismo é a doutrina que procura emancipar as instituições do seu caráter religioso e excluir a influência das religiões no estado, na cultura e na educação, sem lhes impedir os direitos de ensino e organização que confere às outras associações.

A laicidade é o modo concreto da tradução e aplicação prática da doutrina. O laicismo é, pois, a doutrina e a laicidade o modo de a levar à prática.

Dizer que se é a favor da laicidade mas contra o laicismo é a forma enviesada de afirmar o apreço pela separação da Igreja e do Estado desde que não seja praticada. É a dialética das religiões dominantes, impedidas de serem totalitárias, usada sonsamente à guisa de argumento.

Ser contra o laicismo e a favor da laicidade é o mesmo que ser a favor da heroicidade e contra o heroísmo. Só notará a diferença quem tenha um paladar, tão requintado, capaz de distinguir a água benta da outra ou a hóstia consagrada de uma rodela de pão ázimo.

Em Portugal, a Constituição exige a separação do Estado e da Igreja, isto é, defende a laicidade. Os Governos julgam que as sotainas lhes trazem votos e contrariam-na. Hoje, o bispo de Lisboa foi criado cardeal e a RTP-1 parecia a emissora eclesiástica, contra a laicidade. O contubérnio entre a Igreja e o Estado continuam.

14 de Fevereiro, 2015 Carlos Esperança

Dos Budas do Afeganistão ao Estado Islâmico

Há cerca de 14 anos, num país assolado pela miséria, minado pelo fanatismo, devastado pela guerra, as mulheres foram proibidas de aceder à educação e à saúde, compelidas a observar os mais rigorosos preceitos islâmicos e a renunciar aos direitos mais básicos, com frequência à própria vida.

Aconteceu num país com uma cultura antiquíssima, outrora pujante, onde o poder foi tomado pelos célebres estudantes de teologia, vulgo talibãs, que logo destruíram dois budas gigantes esculpidos em pedra nos séc. II e V (e. v.) com mísseis e espingardas automáticas para que não viessem adorar-se falsos ídolos que “insultam o islamismo”. Foi no Afeganistão.

Em todos os tempos e em várias religiões houve selvagens que entenderam que os livros diriam o mesmo que o livro sagrado, e seriam inúteis, ou diziam coisas diferentes e eram prejudiciais.

A inteligência, a cultura e a sensibilidade não são apanágio de uma só cultura mas são incompatíveis com a mais funesta de todas as misturas: a ignorância, o proselitismo e a fé. E é desta mistura perversa que se faz a infelicidade dos povos, a miséria das nações e a tragédia das sociedades que aniquilam em asfixiante submissão.

Apagam o património cultural da mesma forma selvagem com que anulam as liberdades cívicas e, enquanto a fome, a doença e a miséria devastaram uma população bloqueada pelo terror, o mundo civilizado assistiu incapaz, na sua raiva, a ver postergados os mais elementares valores que são a marca da modernidade.

Os povos não são donos exclusivos do património que conservam e por cuja guarda são obrigados a responder. Os governantes, sobretudo os que detêm o poder de forma ilegal, terão de responder pelos dislates e crimes que cometeram. E têm de ser os homens a julgá-los sobretudo aos que pensam ter apenas obrigações perante Deus. Provavelmente o direito de ingerência encontraria aí plena justificação.

Perante as hordas selvagens que, um pouco por todo o lado, tomam o poder com armas sofisticadas que as grandes potências nunca deixaram de fornecer, exige-se uma nova ordem que liberte do caos e do crime organizado multidões que tiveram o azar de nascer no sítio errado sob o jugo de tenebrosos trogloditas.

Infelizmente, a teologia do beduíno amoral e analfabeto, como Atatürk definiu Maomé, tem sido o escalracho que destrói as searas da cultura, do Afeganistão à Líbia, do Iémen ao Iraque, num imparável contágio rumo às teocracias e ao Estado Islâmico.