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Dia: 20 de Outubro, 2011

20 de Outubro, 2011 Ludwig Krippahl

Em cheio, na palha.

Num texto sobre o matemático, cosmólogo e padre Georges Lemaître, o Alfredo Dinis argumenta ser errada a «tese de que quem tem uma fé religiosa não está interessado na verdade científica, nem sequer tem competências para fazer avançar a ciência, porque a fé não deixa pensar, ter espírito crítico e criativo.»(1) Concordo. Ter fé numa coisa não impede que se tenha espírito crítico acerca de outra. No entanto, o Alfredo apresenta este caso como «incómodo para muitas pessoas, sobretudo as que continuam a insistir que há uma incompatibilidade radical entre ciência e religião, e que a ciência avança tanto mais depressa quanto mais depressa se abandonar a religião.» Eu sou da opinião de que há essa incompatibilidade radical e de que a ciência avança melhor sem religião. Mas o exemplo do Lemaître não é relevante para esta posição, porque a incompatibilidade das duas abordagens não impede que a mesma pessoa seja capaz de ambas. É como fumar e fazer pesca submarina.

O Alfredo alegou várias vezes que a ciência permite aferir a verdade de hipóteses testáveis, enquanto a religião decide a verdade das outras hipóteses. Nunca percebi como se pode aferir a verdade de uma alegação, acerca dos factos, que seja impossível de testar. E, a julgar pela diversidade dos dogmas das muitas religiões, não devo estar sozinho nisto. Mas esta diferença, que o Alfredo admite, torna a religião incompatível com a ciência. O problema fundamental é que a ciência não pode aceitar como verdadeira uma alegação que não tenha sido testada com sucesso, enquanto as religiões exigem dos seus adeptos que aceitem pela fé hipóteses que não podem ser testadas ou até que foram testadas e falharam nos testes. O criacionismo, por exemplo, que o Alfredo admite ser contrário à ciência mas que esquece sempre quando fala “da religião”.

Lemaître apenas ilustra que uma pessoa pode aceitar umas hipóteses por fé e avaliar outras com ciência. Não é novidade nenhuma. A mente humana tem uma capacidade extraordinária para ser exigente e criteriosa acerca de algumas alegações enquanto isenta de qualquer cepticismo outras crenças, mais queridas. Ninguém poderia ter uma só religião sem conseguir este feito pois, caso contrário, ou não teria nenhuma ou teria todas.

O que é pertinente e esclarecedor no caso do Lemaître é o papel que a fé católica teve na formulação, compreensão e avaliação deste modelo pela comunidade científica. Absolutamente nenhum. O processo científico, enquanto tal, não recorreu à fé de Lemaître. E, se recorresse, deixava de ser científico, porque o mérito e a utilidade da ciência vêm precisamente da forma imparcial com que esta avalia as hipóteses à luz das evidências e sem o enviesamento de preferências pessoais, tradições, fés e fezadas.

E o Lemaître teve sorte por o seu modelo não ter chocado com os dogmas que a sua religião defendia nessa altura. Caso contrário, provavelmente teria de fazer como Teilhard de Chardin. Para tentar conciliar a sua fé com a teoria da evolução, Teilhard de Chardin deturpou ridiculamente esta teoria e, mesmo assim, ainda arranjou sarilhos com os representantes oficiais da sua religião. Sempre que a fé e as evidências concordam a fé é supérflua para determinar a verdade. E sempre que discordam, a fé é nefasta. Como a ciência exige uma disposição constante para rever e alterar hipóteses perante novas evidências, mais cedo ou mais tarde a fé acaba por ser um empecilho. Investigação científica baseada na fé não leva a lado nenhum. E a fé, no fundo, não precisa da ciência para nada porque está-se nas tintas para a verdade.

A meu ver, a investida do Alfredo estripou violentamente a tese de que quem tiver fé numa alegação é incapaz de avaliar objectivamente qualquer outra. Foi palha por todo o lado. No entanto, o Alfredo nem sequer mencionou o problema mais interessante, que é a incompatibilidade das abordagens em si. Perante uma afirmação acerca dos factos, podemos ter, no máximo, uma destas duas atitudes. Ou tentamos apurar a verdade de forma objectiva e imparcial, ou escolhemos acreditar por fé. Podemos fazer uma coisa para umas alegações e outra para outras, mas não é possível ter fé e manter-se objectivo e imparcial, ao mesmo tempo, acerca da mesma hipótese.

1- Alfredo Dinis, Ciência e religião – o caso do P. Georges Lemaître
Em simultâneo no Que Treta!

20 de Outubro, 2011 Carlos Esperança

Ensinar os ignorantes que não conhecem a Bíblia

Os quatro Evangelhos (Marcos, Lucas, Mateus e João) e os Actos dos Apóstolos têm, na contabilidade de Daniel Jonah Goldhagen (in A Igreja católica e o Holocausto) cerca de 450 versículos explicitamente anti-semitas, «mais de dois por cada página da edição oficial católica da Bíblia».

Os comentadores que insultam e são ignorantes têm obrigação de ler os Evangelhos para conhecerem os manuais de maus costumes onde julgam que se inspiram.

20 de Outubro, 2011 Carlos Esperança

Para os que negam o anti-semitismo cristão

O nazismo, sendo um fenómeno de natureza secular, não teria levado tão longe a sua loucura genocida se o cristianismo (católicos e protestantes) não tivesse envenenado os crentes com as concepções anti-semitas que os moldaram. Quando o Terceiro Reich iniciou a vasta e metódica aniquilação dos judeus logo surgiram progroms anti-semitas na Polónia, Roménia, Hungria, Áustria, Checoslováquia, Croácia e outros países. Mas já em 1919, por exemplo, tinham sido mortos 60 mil judeus só na Ucrânia e o nazismo estava longe de ser a religião oficial do Terceiro Reich. Isto para não recordar o carácter anti-semita do concílio de Trento e da Inquisição. De algum modo os nazis foram agentes da teologia cristã para a qual os judeus são ainda piores do que simples hereges; são hereges que repudiam explicitamente a divindade de Jesus e foram autores do deicídio. O próprio Hitler, ao usar a expressão «ninho de víboras», para os judeus, tanto a pode ter ido buscar directamente ao Evangelho de Mateus (3:7) ou a Lutero, que decerto a bebeu aí, mas o anti-semitismo não pode ser alheio à educação católica que recebeu.
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Perseguições aos judeus em Espanha com os ataques às judiarias (Toledo, 1355, 12 mil mortos; Palma de Maiorca, 1391, 50 mil mortos; Sevilha, 1391, etc.; com a Inquisição (1478) milhares deles procuraram refúgio em Portugal. Outros, por medo, deixaram-se converter ao catolicismo. Uma perseguição tão cruel levou as judiarias espanholas à miséria, até que em 1492 foi declarada a expulsão dos judeus da Espanha.

Em Portugal, o anti-judaísmo provocou a revolta popular contra os cristãos-novos e os judeus ocorrida em Abril de 1506 – o infame Progrom de Lisboa. A superstição agravou o medo da peste que grassava na cidade e as dúvidas de um judeu em relação ao suposto milagre desencadeou uma onda de ódio, estimulada por um frade, que perseguiu, matou espancou e arrastou semi-vivos para as fogueiras que logo se acenderam na Ribeira e no Rossio – um massacre de 4 mil judeus, enquanto dois frades, o português João Mocho e o aragonês Bernardo, um com uma cruz e o outro com um crucifixo erguido, bradavam: Heresia! Heresia!, atiçando o ódio.

20 de Outubro, 2011 Carlos Esperança

Anti-semitismo católico – oração das sextas-feiras

“Oremus et pro perfidis Judaeis”
(oremos pelos pérfidos judeus): “Eterno e onipotente Deus, que não vos afastais nem mesmo da perfídia judaica, escutai a nossa prece, a qual elevamos pela cegueira daquele povo, para que ele conheça a luz –que o Cristo existe– e se afaste das trevas”.

Oração citada nos comentários por Stefano, oração que as catequistas me ensinaram em pequeno. Foi a maldade da Igreja que me alertou para a mentira de deus.