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Dia: 29 de Julho, 2006

29 de Julho, 2006 Carlos Esperança

Fátima – palco da pantomina

Santuário promove iniciativas para assinalar 90 anos das aparições de Fátima

A vida está difícil para quem vive da fé. As pessoas trocam o santuário pelo restaurante, a eucaristia pela merenda e a procissão das velas por um arraial minhoto. Mas há crentes que resistem e se julgam em dívida com Deus.

O santuário de Fátima começou a promoção do 90.º aniversário das aparições. Sabe-se que a única aparição foi a mina do ouro que os crentes tiram do pescoço e das orelhas, pepitas de dor arremessadas com lágrimas à caixa de esmolas da ganância eclesiástica.

A ICAR lembra o aparecimento de um anjo e, se for preciso, arranja penas para provar a passagem do exótico personagem da fauna divina por aquelas terras áridas onde apenas germina a superstição.

A consideração pelas pessoas devia levar a Igreja católica a respeitar a gente simples e a ter pudor. Esbulhar pobres do cordão de ouro que esteve na família várias gerações, das arrecadas que foram da avó, do anel que um padrinho brasileiro ofereceu pelo crisma a um tio-avô, não é um acto de piedade, é um assalto com ave-marias e padres-nossos.

Explorar o sofrimento e a angústia, tirar aos que não têm para dar aos que não precisam, é o negócio que há quase 90 anos floresce em Fátima, aberto para combater a República e atacar o comunismo.

Esquecido o objectivo inicial, ficou a galinha dos ovos de oiro que as viagens papais alimentam e o clero aduba com procissões, terços e bênçãos. A virgem voadora que poisava nas azinheiras e ficava à conversa com a Lúcia, regressou ao Céu para fazer o serviço doméstico enquanto os padres exploram a fantasia do voo do anjo, da aparição da virgem e das cambalhotas do Sol.

29 de Julho, 2006 Palmira Silva

Botox e o Islão

Mecanismo de acção da toxina do botulismo, BoNT. Clique na imagem para aumentar. Vídeos sobre o referido mecanismo podem ser encontrados aqui.

por várias vezes referi a crescente islamização da Malásia, apontada por muitos como um exemplo de um país islâmico com uma relação de sucesso com o mundo moderno e em que os 40% da população não islâmica são supostos coexistir pacificamente e em liberdade religiosa. Na realidade, os últimos tempos têm sido palco de um crescente poder dos clérigos islâmicos que ameaça uma talibanização deste país.

As lucubrações expressas na letra da lei do conselho islâmico sobre os mais diversos assuntos não se restringem aos seguidores do Corão, as aberrações islâmicas em matéria de direitos humanos são impostas a todos os malaios, muçulmanos ou não muçulmanos. Por exemplo, foi proibida a música «Black Metal» sob a acusação de que os seus seguidores se desviam dos princípios islâmicos. Um porta-voz do Conselho islâmico nacional justificou o seu édito afirmando que a cultura «Black Metal» pode levar quem a ouve a rituais religiosos satânicos que incluem beber o próprio sangue misturado com sangue de cabra e queimar o Corão.

De igual forma, as «leis da decência», isto é o código de conduta islâmico, foi imposto a toda a população, arriscando-se a penas de prisão, punições físicas ou pesadas multas os que não o sigam. Como uma cantora que foi acusada de «insultos ao Islão» por cantar num bar que serve bebidas alcoólicas, dois colegas de escola, um rapaz e uma rapariga, que foram condenados a 25 vergastadas cada pelo crime de falarem um com o outro em público ou um casal de chineses que foi processado, e pode ser preso, por se ter abraçado e beijado em público…

Agora os clérigos malaios decidiram ser anti-islâmico o Botox, substância que para além de ser usada em tratamentos de beleza, é muito utilizada no tratamento de uma série de condições médicas, desde o estrabismo a dores agudas de costas, passando por transpiração excessiva.

Por uma razão qualquer obscura, talvez porque o Botox foi testado em ratos e porcos, os clérigos decidiram que o Botox pode conter derivados de porco (?!), uma abominação mais execrada que o adultério ou a bebida. Assim, é expectável que esta deliberação do conselho islâmico seja transcrita em breve numa nova lei da Malásia que proibe o uso desta substância. Suponho que a ideia de consultar a comunidade científica local nem sequer tenha passado pela cabeça dos iluminados clérigos.

De facto, o Botox, o nome comercial da toxina do botulismo tipo A, uma neuro toxina produzida pelo grupo de bactérias anaeróbicas Clostridium botulinum, não tem nada a ver com os tão anatemizados suínos. A proteína é expressada pela bactéria apropriada e depois purificada sem ver porcos pelo caminho.

Existem 7 tipos da toxina, de A a G, sendo apenas utilizados como terapêutica os tipos A e B. A BoNT é o patogéneo mais tóxico que se conhece, sendo a dose fatal entre 200-300 pg/kg – um picograma, pg, são 10-12 grama, ou seja cerca de 100 g da toxina seriam suficientes para matar todos os seres humanos à face do planeta.

As amostras terapêuticas comercializadas contêm cerca de 0.005% da dose letal, pelo que a sua utilização como arma biológica é impraticável. Por outro lado, a sua produção «caseira» é extremamente difícil, por se tratar de uma bactéria anaeróbica, isto é, que cresce na ausência de oxigénio, é expressada (produzida) em quantidades muito reduzidas, o processo de purificação da proteína «wild type» é um pesadelo, o que torna a sua produção e purificação virtualmente impossível fora de um laboratório especializado.