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Dia: 10 de Julho, 2006

10 de Julho, 2006 Carlos Esperança

B16 – O inveterado celibatário

O jurássico pastor alemão é um apóstolo da violência. Impõe o celibato indissolúvel ao clero e exige a indissolubilidade do matrimónio aos leigos, embora nunca fosse difícil dissolver um matrimónio canónico para quem tivesse dinheiro e influência.

O Vaticano não é um tribunal, é a casa de alterne onde se negoceia o direito canónico.

Quando o arcebispo Emmanuel Milingo se casou, sob os auspícios do reverendo Moon, o Vaticano envidou esforços para que o prelado zambiano rompesse o matrimónio com a esposa, María Sung, e regressasse ao múnus e à obediência a Roma. E conseguiu.

A coerência não é uma virtude apostólica mas a intolerância e a violência são apanágio da fé e o paradigma das religiões.

B16, na pouco gloriosa ofensiva prosélita em Espanha, que ainda julgava protectorado da ICAR, fingiu que foi proteger «a maravilhosa realidade do matrimónio indissolúvel entre homem e mulher, a origem da família», mas foi defender os interesses do Vaticano e o poder do clero espanhol, cooperando com a missa em comícios conjuntos do PP e do Opus Dei.

Este ataque à liberdade individual, em especial ao divórcio, é uma obsessão demente que o actual Papa interiorizou do seu predecessor. Os fanáticos das penas perpétuas não compreendem que a liberdade é um bem superior aos seus preconceitos.

10 de Julho, 2006 Ricardo Alves

Religião e terrorismo

Fez na sexta-feira um ano que quatro bombistas suicidas mataram 52 pessoas em Londres. Nesse 7 de Julho de 2005, foi divulgado um comunicado de proveniência pouco clara em que uma «Organização Secreta da Al-Qaeda na Europa» se vangloriava pela «vingança contra o governo cruzado e sionista britânico em retaliação contra os massacres que a Grã-Bretanha está a cometer no Iraque e no Afeganistão». Esse comunicado começava «Em nome de Deus…» e terminava com uma citação do Corão.

Posteriormente, foi divulgado em Setembro um vídeo em que Sidique Khan (o líder dos bombistas do 7 de Julho), clarificava que «a nossa motivação principal não vem das comodidades tangíveis que este mundo tem para oferecer. A nossa religião é o Islão, obediência ao único Deus verdadeiro, Alá, e seguir no caminho do profeta final e seu mensageiro, Maomé».

Mais recentemente, a Al-Qaeda reclamou explicitamente a autoria dos atentados de 7 de Julho, num vídeo em que Al-Zawahiri afirma que Shehzad Tanweer e Sadique Khan receberam treino com explosivos em campos da Al-Qaeda. Os objectivos da Al-Qaeda são globalmente religiosos: conseguir que os EUA retirem da Arábia Saudita (por causa dos «lugares santos» de Meca e Medina), esmagar Israel (por ser um Estado judaico mantido «com apoio de Cruzados») e derrubar os regimes árabes que não sejam suficientemente islâmicos.

E no entanto, apesar de toda a evidência de que os terroristas do 7 de Julho, como anteriormente os do 11 de Março e os do 11 de Setembro, como outros islamistas que partilham da ideologia integrista da Irmandade Muçulmana, são todos homens profundamente religiosos que dificilmente matariam se não estivessem convencidos de que existe justificação religiosa para os seus actos, a maior parte da opinião pública persiste em negar a dimensão religiosa quer dessa ideologia integrista quer desses actos terroristas. Essa visão angélica da religião, que resiste a aceitar que se mate acreditando cumprir um dever religioso, é incongruente com uma Europa que sofreu séculos de guerras religiosas, contou milhões de mortos nas inquisições, iniciou Cruzadas e também teve os seus terroristas religiosamente justificados.

A utilização de uma ideologia religiosa para fomentar o ódio de grupo e convencer a matar é, porém, uma constante da história da humanidade. Compreende-se que assim seja: as religiões reveladas autorizam os crentes a imaginarem-se num plano ético superior aos seus semelhantes, e criam a ilusão de que estão integrados numa «ordem cósmica» unindo o natural e o sobrenatural, a vida e a morte, o passado e o futuro. Quando vividas em comunidade, podem até tornar «glorioso» o sacrifício do indivíduo a favor do grupo. A religião pode assim desculpabilizar aquilo que a maioria das pessoas, e até a maioria dos crentes, consideraria, noutras circunstâncias, repulsivo.
10 de Julho, 2006 Palmira Silva

Mais leituras de Verão

The Popes Against the Jews: The Vatican’s Role in the Rise of Modern Anti-Semitism , do historiador David I. Kertzer, duas vezes galardoado com o Prémio Marraro da Sociedade para Estudos Históricos Italianos.

Depois do The Catholic Church and the Holocaust, 1930-1965, de Michael Phayer, um livro de outro historiador mundialmente reconhecido que analisa a acção da Igreja durante e após o Holocausto, este livro é essencial para se perceber como ele foi possível. Ambos especialmente recomendados como antídoto para os revisionismos históricos da ICAR. Uma análise isenta dos acontecimentos por um dos poucos historiadores não ligados à Igreja Católica a quem foi concedida autorização para consultar os arquivos da Inquisição.

Um excerto do livro:

«Este argumento [referindo-se às mentiras descaradas constantes no «Nós lembramos – uma reflexão sobre o Shoah»] , infelizmente, não é o produto de uma Igreja que quer confrontar a sua história. Se os judeus adquiriram direitos iguais na Europa dos séculos XVIII e XIX tal foi conseguido contra os furiosos, estridentes e de facto indignados protestos da Igreja e do Vaticano. (…)

O Padre De Rosa nota com pena a campanha de um século contra os judeus do jornal Civilta cattolica observando que o jornal só alterou o rumo em 1965, na sequência do Concílio Vaticano II. (…) Ele então lista algumas das acusações feitas regularmente nas páginas do jornal: «que os judeus combatiam a Igreja, que praticavam o assassínio ritual de crianças cristãs, que tinham um poder político enorme nas mãos ao ponto de controlarem governos e, acima de tudo, que possuíam uma enorme riqueza, obtido por usura, e tinham assim uma inacreditavelmente forte influência económica, que usavam em detrimento do cristianismo e dos cristãos». O padre De Rosa acrescenta, com muita correcção, que o jornal jesuíta não estava sózinho na produção destas acusações porque elas enchiam as páginas de muitas das principais publicações católicas.

De forma a ilustrar o anti-judaísmo do Civilta cattolica (por oposição ao anti-semitismo [um sofisma da Igreja Católica, que pretende nunca ter sido anti-semita, apenas anti-judaica]) ele mostra algumas passagens de artigos do jornal da autoria dos padres Rondina e Ballerini nos anos 1890. Estes contam histórias da apetência dos judeus pelo domínio do mundo, a sua fome de ouro, e a sua crença de que os cristãos não eram melhores que animais. Onde quer que os judeus vivessem, nas palavras destes autores, elas ‘formam uma nação estrangeira e juram inimizade ao bem estar das pessoas’. O que deviam os bons católicos fazer a esta terrível ameaça à sua vida e felicidade? A resposta oferecida nas páginas do Civilta cattolica era clara: A igualdade civil dos judeus devia ser imediatamente revogada, porque ‘eles não tinham algum direito a ela’ permanecendo para sempre ‘estrangeiros em todos os países, inimigos do povo de qualquer país que condescenda em os albergar’».

Aliás, como nota o autor nesta introdução, forçar os judeus a usar tarjetas de identificação amarelas e mantê-los fechados em ghettos não é uma invenção dos nazis no século XX mas uma política advogada pelos Papas – e seguida religiosamente nos estados papais e em alguns países mais obedientes ao Papa – durante centenas de anos.