Loading

Dia: 9 de Julho, 2006

9 de Julho, 2006 Palmira Silva

O rapto de Edgardo Mortara

A recente preocupação da Igreja de Roma com a família, que se tornou a desculpa para as manobras jurássicas de recuperação do integrismo perdido, de que este Encontro das Famílias foi palco privilegiado, seria no mínimo bizarra não fora ser evidente qua a Cúria Romana se está nas tintas para a família e que este é apenas um tema populista com que podem acirrar as hostes ululantes de fundamentalistas católicos.

De facto, se olharmos mesmo para a história recente da ICAR não encontramos esta preocupação com a defesa da família. Assim de repente lembro-me da criança judaica de 6 anos, Edgardo Mortara, que foi removida à força pela polícia papal da tutela dos seus pais numa Bolonha à época – 1858 – integrante dos Estados Pontíficios.

Os inquisidores que ordenaram o rapto da criança usaram o pretexto de que esta tinha sido baptizada in extremis por uma criada. Segundo as leis estabelecidas pelos Papas, que governavam de facto metade da Itália, era proibido judeus criarem crianças baptizadas. Apesar de raptos de crianças judias supostamente baptizadas por graça de um qualquer católico anónimo ser uma prática recorrente da Igreja-Estado, desta vez o caso teve repercussões internacionais dada a atmosfera de rebelião contra o poder temporal ditatorial da Igreja em Itália.

Assim, cerca de 20 editoriais do The New York Times foram devotados ao tema e quer o imperador Franz Joseph da Áustria quer Napoleão III de França pediram a Pio IX, beatificado em 2000 por João Paulo II* e o tal que inventou o dogma da infalibilidade papal, que devolvesse a criança aos pais.

Todos os apelos, inclusive dos pais que protestavam ser impossível o seu filho ter sido baptizado, foram infrutíferos: Pio Nono enclausurou Edgardo num mosteiro onde, ao fim de anos de lavagem cerebral, acabou por ser ordenado padre.

Para ser mais correcta os apelos dos pais tiveram alguma reacção do Vaticano: foi-lhes respondido que teriam o filho de volta no instante em que se convertessem ao catolicismo. Ao que os Mortara se recusaram e como tal o beato Pio Nono considerou que foram eles e a sua obstinação em «fechar o coração» à revelação e piedade cristãs os responsáveis por não terem recuperado o filho.

Ironicamente o rapto de Edgardo foi um factor não despiciendo no processo de unificação da Itália, o Risorgimento, que ditou o fim do poder temporal da Igreja de Roma. De facto, o destino desta criança, arrancada dos braços dos pais por uma Igreja anti-semita e déspota, simbolizou toda a campanha revolucionária de Mazzini e Garibaldi para acabar com o domínio da Igreja Católica, tirar a Itália das teias do obscurantismo e estabelecer um estado moderno, democrático e laico.

Mais recentemente, na altura em que João Paulo II, que já tinha beatificado um facínora do Holocausto, o cardeal Stepinac que ainda voltarei a abordar, pretendia beatificar Pio XII, foi divulgado – pelo historiador Alberto Melloni, professor de história religiosa da Universidade de Bolonha e um dos maiores especialistas mundiais em história cristã – que Pio XII terá ordenado à Igreja Católica francesa que não devolvesse aos seus pais ou a instituições judaicas as crianças judias baptizadas durante a ocupação nazi.

A história completa, assim como uma tradução do documento comprovativo das ordens de Pio XII pode ser encontrada no excelente Rua da Judiaria.

* O beato Pio IX é o fazedor de um dos santos mais representativos da Igreja de Roma: um dos inquisidores mais tristemente famosos de Espanha, Pedro Arbues de Epilae, apenas ultrapassado no zelo e na «eficácia» por Torquemada.

Um dos teólogos liberais da época, Johann von Dollinger, protestou aquilo que considerou a «exaltação de um homem que determinou o baptismo compulsório de judeus e depois os torturava para se convencer que as conversões eram sinceras».

Dollinger, que considerava ser a Inquisição a mola impulsionadora do domínio mundano da Igreja e do seu poder sem limites sobre as vidas e propriedades dos homens, associava o anti-semitismo da Igreja com o poder temporal coercivo do papado e com o pretensão da Igreja que apenas ela era a detentora da «verdade absoluta». O Sílabo dos Erros e o decreto da infalibilidade papal, que não aceitou e foi por isso excomungado, foram o corolário das suas teses.

9 de Julho, 2006 Carlos Esperança

Navarro-Valls uivou contra Zapatero

O porta-voz do último teocrata europeu, Navarro-Valls, membro do Opus Dei, ululou azedume e raiva contra o legítimo primeiro-ministro de Espanha.

A anunciada ausência de Zapatero à missa, desporto que não pratica, serviu de pretexto para a ameaça, intriga e denúncia do serventuário de B16 cuja ingerência num país que julgava protectorado seu é um acto de incivilidade, ódio e provocação.

B16 foi em viagem de negócios presidir a um comício organizado pelo Partido Popular, Opus Dei e outros grupos religiosos de extrema-direita – 5.º Encontro Mundial das Famílias -, um acto de proselitismo inventado por um dos seus antecessores.

Esqueceu-se que Zapatero é um homem digno que não se ajoelha e, muito menos, se põe de rastos. Não compreendeu o enraivecido pastor alemão que já não é a ditadura de Franco que governa Espanha, em idílio com o Vaticano e em guerra com a democracia.
Desta vez ficou claro que a Espanha não aceita intromissões beatas na sua política interna.

9 de Julho, 2006 Palmira Silva

Bento XVI : guerra aberta em Espanha

Poster retirado do blog de um dos nossos leitores galegos


Por definição, toda religião – toda fé – é intolerante, pois proclama uma verdade que não pode conviver pacificamente com outras que a negam.
Mario Vargas Llosa

A deslocação em massa das cúpulas do Vaticano – vários Cardeais da Cúria Romana e de muitos dos mais próximos colaboradores de Bento XVI – ao V Encontro Mundial das Famílias organizado pela ICAR confirma o que a imprensa católica pretende ser mentira: esta é uma visita política cuja fim último é aumentar a tensão entre Igreja e Estado e demonstrar claramente a oposição da Igreja ao estado de direito.

Aliás, o título de uma das notícias da Agência Ecclesia não deixa dúvidas sobre o objectivo desta visita papal: «Bispos espanhóis recebem apoio de Bento XVI na luta contra a secularização».

Desde a sua eleição que Zapatero deixou claro que pretende ser o líder de um país europeu do século XXI, cada vez mais secular e para tal é necessário que a Igreja abdique dos (muitos) privilégios na sociedade e na política espanhola que a ditadura fascista lhe concedeu. Como seria expectável, a Igreja Católica não quer abdicar desse privilégios anacrónicos e esta visita é uma demonstração de força que, como no passado, indica que a Igreja não olhará a meios para os manter.

De facto, pouco depois de se ter esboçado, em Julho de 1936, uma rebelião contra o governo democraticamente eleito da Frente Popular, Pio XI exortou os católicos espanhóis a lutarem lado a lado com Franco na «difícil e perigosa tarefa de defender e restaurar os direitos e a honra de Deus e da Religião».

A Igreja de Espanha declarou-se imediata e entusiasticamente do lado de Franco, nomeadamente através da pastoral «Las dos ciudades» do bispo de Salamanca, Enrique Pla y Deniel (nomeado cardeal por Pio XII em 1946, sem dúvida em reconhecimento pelos bons serviços prestados), datada de Setembro de 1936.

Uma rebelião sem pernas para andar, com o apoio da Igreja Católica e do Vaticano, de Mussolini e de Hitler, transformou-se na Guerra Civil Espanhola que causou um milhão de vítimas e o exílio de centenas de milhares de espanhóis.

As exortações do Arcebispo de Burgos, Francisco Gil Hellín, contra os «bezerros do poder», e o apelo às famílias cristãs para que não releguem «ao baú das memórias» a recomendação de João Paulo II para que «se for preciso ir às ruas em defesa do matrimônio e da família, teremos que ir» (ênfase da Agência Católica de Imprensa na América Latina) são um aviso para uma guerra aberta que não pode passar despercebido!

Assim como não são exactamente pacíficas as acusações do secretário da Conferência Episcopal Espanhola, Juan Antonio Martínez Camino, contra a disciplina de Educação para a Cidadania, que, contrariamente ao que se passa com a Educação e (I)moral Católicas, vai ser obrigatória para todos os níveis de educação. Ou as suas prelecções contra as iníquias leis espanholas que a ICAR considera «sectárias» e que «não favorecem a liberdade verdadeira nem o exercício da liberdade religiosa contemplada na Constituição» (aparentemente os dignitários espanhóis consideram que liberdade religiosa significa impôr a todos as barbaridades debitadas pelo Vaticano).

E as declarações do sucessor de Ratzinger à frente da ex-Inquisção, o cardeal Levada, são igualmente preocupantes. O prelado apela à desobediência civil, uma prática recorrente da ICAR, contra as leis humanas e as decisões judiciais que são contrárias «à lei de Deus». Este responsável lembrou que os cidadãos têm a obrigação de «não seguir as prescrições das autoridades civis» quando tal for contra os ditames do Vaticano.

As conclusões provisórias do Congresso -que entre outras pérolas perora contra as campanhas em favor da contracepção (!) – indicam que a guerra aberta do Vaticano contra a laicidade e modernidade não se vai circunscrever a Espanha, já que ululando contra «um laicismo de raiz niilista e relativista», o documento critica a «falsa (?) concepção da sexualidade humana e da laicidade do Estado» subjacente à resolução do Parlamento Europeu que pretende acabar no espaço europeu com a discriminação com base na opção sexual.

Os direitos humano, a tolerância, a pluralidade, a liberdade de expressão, opinião e religião, em suma os valores em que assentam a cultura democrática europeia, cultura, execrada por Bento XVI, que de facto «exalta a liberdade do indivíduo», estão sob ataque cerrado dos fundamentalistas católicos!

9 de Julho, 2006 Carlos Esperança

B16 em Espanha

B16 afirmou, em Valência, que a família é uma «instituição insubstituível nos planos de Deus» e que a Igreja não pode deixar de «promover» os valores da instituição familiar, «para que sejam sempre vividos com sentido de responsabilidade e alegria».

Que sabe o eterno celibatário sobre a matéria? Enquanto os pais mudam as fraldas aos filhos os clérigos andam no negócio da fé e na aprendizagem da vontade de Deus, atrás de uma carreira profissional que B16 percorreu até ao cume.

O Papa, a quem o múnus impediu de constituir família, julga-se perito em matrimónio e bons costumes e no direito de impor as suas concepções sobre a matéria.

A presença do velho inquisidor no país dos Reis Católicos é já uma afronta ao espírito progressista do actual Governo e á democracia que a sua Igreja estorvou enquanto pôde.

O moralismo do teocrata terá de ser visto como uma censura velada à princesa Letícia que levou para a família real um casamento civil e um divórcio anteriores.

Não pode deixar de se considerar um gesto descortês a reincidência num tema que os reis de Espanha já digeriram, vindo de um hóspede a quem a educação e o respeito exigiam outra conduta.

Ao considerar-se o representante de Deus na Terra, B16 transforma um ser inexistente num biltre malcriado capaz de afrontar o Chefe de Estado de um país democrático e um provocador contra as decisões do primeiro-ministro.

B16 devia manter-se no antro para onde emigrou e reduzir o despotismo aos 44 hectares sob a sua tutela.

9 de Julho, 2006 jvasco

Ainda a IURD


Ainda a IURD, sempre a lucrar, enganando os crédulos.

Desta vez, existe quem contra-ataque, mas cabe aos tribunais decidirem se a IURD fica impune.