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Dia: 20 de Agosto, 2005

20 de Agosto, 2005 Carlos Esperança

Circo romano em Colónia

Em Colónia, na Alemanha, anda à solta o pastor alemão que um bando de cardeais, com a cumplicidade do Espírito Santo e do Opus Dei, fez ditador vitalício da única teocracia europeia.

Cobre-o, até aos tornozelos, um alvo vestido, de fino tecido e delicado corte, que realça os sapatinhos vermelhos do animador do circo que levou a Colónia centenas de milhares de jovens para promoção dos interesses da Cúria Romana. Pende-lhe do pescoço a trela que termina em refulgente cruz, riquíssimo adorno do traje feminino.

A brancura do vestido, a condizer com o cabelo, destoa do modelo que o exibe.

Para este espectáculo, que não é cultural nem recomendável, foi pedido um patrocínio à presidência da Comissão Europeia. Não sei se o precedente foi aberto, para que bandas musicais, circos ambulantes e companhias de teatro venham a conseguir apoio.

B16 não tem o arrojo de JP2. Sente-se mal como charlatão de feira. Prefere organizar as pantominas no ar condicionado do Vaticano. Não verga a coluna para oscular o chão, uma espécie de felação de quem julga que Deus está em toda a parte e a Terra é a braguilha da humanidade.

Cumpre os rituais do múnus com a alegria do boi que caminha para o açougue, qual Cristo da mitologia católica a caminho do gólgota.

O barulho encomendado aos jovens há-de azucrinar-lhe os ouvidos, as lambidelas da mão hão-de causar-lhe nojo, as missas que repete há mais de meio século cansam-no e mantém aquele impenetrável rosto enquanto distribui água benta, benzeduras e hóstias consagradas, ad majorem Dei gloriem.

Vai ser uma semana infernal para o vigário de Cristo, um odioso trabalho de campo para um homem de gabinete, repetir até à náusea gestos, palavras, esgares, até ao desfazer da feira, enquanto a boa imprensa entoa hossanas ao impostor que se diz agente do divino.

20 de Agosto, 2005 pfontela

O futuro do Iraque

A imagem que começa a emergir das ruínas do Iraque começa a tornar-se mais clara a cada dia que passa. O documento legal central Iraquiano (a Constituição) vai quase de certeza ser de natureza religiosa. A teocracia está em vias de ser instaurada em tudo menos em nome.

O grande partido xiita exige como condição para a aprovação da nova constituição que se reconheça a lei islâmica como única fonte válida de legislação. As forças mais ou menos seculares e o bloco curdo opõem-se a tal medida mas, a verdade é que possivelmente não terão força suficiente para a bloquear.

Como se esta situação não fosse problemática quanto baste o líder do partido do Conselho Supremo para a Revolução Islâmica no Iraque exige que o centro e sul da nação sejam reconhecidos enquanto regiões autónomas (dando poder completo aos fanáticos xiitas que as controlam) – regiões essas com vastas reservas petrolíferas. Desta forma mesmo que o seu assalto ao poder central falhasse os clérigos xiitas continuariam a ter uma base de poder enorme. Como uma cereja no topo do bolo encontra-se a última (por enquanto) reivindicação dos xiitas: Al-Najaf e karbala (duas cidades consideradas como santas – e que geram um considerável fluxo económico) teriam de possuir estatutos de independência – criando assim estados teoricamente semelhantes ao Vaticano mas que na prática se encontrariam nas mãos dos clérigos.

Mesmo os mais fanáticos sabem que não vão conseguir alcançar todos os objectivos a que se propõem, mas sabem também que muitas destas exigências podem ser usadas como moeda de troca quando for altura de negociar a constituição. A julgar pelas acções que estes grandes partidos xiitas estão a ter nas regiões que controlam plenamente o resultado da sua ampliação de poderes (a nível nacional ou regional) só pode ser má noticia.

Neste clima todos os interessados e analistas indicam que seja qual for a disposição final dos detalhes entre xiitas, sunitas e curdos o estado Iraquiano vai sem dúvida possuir uma forte influência legal do islão. O sonho de um Iraque onde a liberdade (e não só a estabilidade repressiva) existe e é para todos não passa de uma memória algo distante.