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Dia: 29 de Março, 2005

29 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Tartaruga demoníaca

Depois do aparecimento de uma tosta de queijo com a cara de Jesus, o Briteiros informa-nos da existência de uma tartaruga do demo.

A tartaruga com um palmo de tamanho e que dá pelo nome de Lucky (Sortuda) foi o único animal a sobreviver a um incêndio numa loja de animais, perto de Indianapolis. O dono, Bryan Dora, afirma que vê a cara Satanás na concha do bicho: os seus olhos, uma pêra, ombros e um par de cornos bicudos.

Bryan Dora afirma que a imagem não estava lá antes do incidente e que, para ele, «é demasiada coincidência que a única coisa a sair ilesa tenha esta imagem». «A marca na concha era como se o diabo quisesse que soubéssemos que ele estava cá em baixo».

Agora, depois de ter ganho a eternidade num DVD (à venda no eBay), o destino desta tartaruga satânica é ser leiloada.

29 de Março, 2005 Carlos Esperança

O bem-aventurado J. César das Neves

No rescaldo das libações pascais, João César das Neves (JCN) fez bem em não conduzir. Escreveu.
Foi já deliciado com o Momento Zen da Segunda-feira, da responsabilidade habitual da Palmira F. Silva, que fui ler «O dom de não ver» do teólogo laico JCN, no Diário de Notícias, escrito na euforia da ressurreição do seu Deus.

JCN raramente desilude. Apenas quando escreve sobre economia, nos decepciona. JCN tornou-se o autor mais apreciado no Diário Ateísta. Eu prefiro as suas citações da bíblia às divergências e incongruências dos quatro evangelhos que o imperador Constantino seleccionou como argumento de uma religião em fase de lançamento. O inefável JCN não convence mas é motivo de assombro que ele próprio acredite.

Ou a fé lhe tolda o entendimento ou a falta de entendimento lhe exacerba a fé. Umas vezes é o talibã romano que terça armas a favor da castidade, outras é o cordeiro de Deus que se imola no altar do ridículo, sempre em sintonia com o Vaticano onde julga que o sol nasce como os velhos comunistas pensavam que nascia no Kremlin. Debita a Bíblia como os mullahs recitam o Corão. Tenho por JCN o desvelo que merecem os espécimes em vias de extinção. É o meu sentido ecológico que deseja a sua preservação.

Num artigo notável de Salman Rushdie «O problema com a religião», publicado no DN, lê-se que « São poucos os europeus que hoje em dia se consideram, a si próprios, religiosos – apenas 21%, segundo um recente estudo de valores europeus, contra 59% de americanos, segundo o Pew Forum». É pois natural que JCN tenha fé a quintuplicar para que o velho continente finja ser cristão.

Se JCN, em vez de ter estudado a Bíblia, tivesse lido o Kama Sutra, hoje seria um animador sexual. Assim, converteu-se num prosélito da fé, num soldado de Cristo-Rei, num cruzado ao serviço da moral e dos bons costumes. Mas enquanto o bem-aventurado se afadiga a defender a fé que se dissolve entre as mentiras da religião e a devassidão dos seus padres, o ateísmo vai grassando indiferente aos martírios do seu Deus e à insanidade dos seus padres.

Da prédica da última segunda-feira respigo este pensamento lapidar: «Quem vê perde a capacidade de acreditar». Nós, os ateus, há muito que nos tínhamos dado conta de que só os cegos acreditam no catolicismo. Mas JCN confirma e acrescenta: «… um dos maiores dons que Deus nos deu (…) é precisamente o dom de não vermos». Isto é teologia, da melhor, não é um ensaio sobre a cegueira, sem o brilho nem a profundidade intelectual de Saramago.

Depois pergunta: «Qual o valor dos esposos [sic] fiéis quando estão juntos?», para responder que «manter esses propósitos na ausência (…) isso é verdadeiro amor», donde se conclui que para JCN a facadita matrimonial é uma inevitabilidade na ausência simultânea do «verdadeiro amor» e do cônjuge respectivo.

Depois, conclui que «A presença de Deus é evidente». É, aliás a única ameaça que pode levar um jornal a publicar tal prosa.