Loading

Dia: 20 de Março, 2005

20 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Islão no feminino

Amina Wadud, professora de Estudos Islâmicos na Universidade de Commonwealth de Virgínia e autora do livro «Qur”an and Woman: Rereading the Sacred Text from a Woman”s Perspective», foi a primeira mulher presidir a uma oração islâmica onde estiveram presentes ambos os sexos.

Para a organização Muslimwakeup.com – e para o mundo – este é um evento histórico que deve ser celebrado uma vez que «as mulheres muçulmanas vão reclamar o seu direito a ser iguais em termos espirituais e líderes».

Como não podia deixar de ser, as críticas não se fizeram esperar. Talib Abdur-Rashid, imã da mesquita da Irmandade Muçulmana em Harlem, afirmou que «O islão é uma religião de fé e de crença, mas também de lei» e que «não existe nenhum precedente legal», questinonando «o que é que as pessoas da Muslimwakeup perceberam que milhares de milhões de muçulmanos ao longo do tempo não tenham percebido?». Ora, a lei não é imutável e, quando está contra a ideia de Justiça e de Direito, deve ser mudada. Para além disso, os precedentes abrem-se e este é um que deve ser aberto.

Esta é uma iniciativa que todos devemos aplaudir, muçulmanos ou não. A mulher, tanto a muçulmana como a cristã, foi relegada demasiado tempo para segundo plano. É altura de, finalmente, elas se afirmarem como titulares plenos direitos não só dentro da sua própria religião, como também na sociedade.

20 de Março, 2005 Palmira Silva

Direito a morrer: desenvolvimentos

Aparentemente os apelos do Vaticano para a revogação da ordem judicial que permitia a interrupção da manutenção assistida de Terry Schiavo foram ouvidos. Os microfones da Rádio Vaticano têm estado muito activos com o caso: o bispo Elio Sgreccia, presidente da Academia para a Vida, afirmou , na semana passada, que o «caso ultrapassa a situação individual devido ao seu carácter exemplar e à importância que os media lhe atribuíram». Já o Cardeal Martino, que preside ao Conselho Pontifício para Justiça e Paz, relembrou as palavras recentes do Papa sobre o caso «confirmando que a qualidade de vida não pode ser aferida por sucesso económico, beleza e prazer físico (já agora nem por consciência de si próprio) mas consiste na dignidade suprema da criatura feita à imagem e semelhança de Deus» e que «ninguém pode ser árbitro da vida excepto o próprio Deus».

De facto, os fazedores de leis republicanos trabalharam arduamente no sábado para produzir uma lei federal que obrigue os médicos a prolongar a vida de Terry Shiavo, a americana que sofreu um acidente cerebral muito grave e irreversível há 15 anos, que a deixou num estado vegetativo permanente.

A lei, que deve ser aprovada a curto trecho, foi produzida 24 horas após os médicos, por ordem judicial de um tribunal da Flórida, terem removida o tubo que alimentava Terry e que a manteve viva nos últimos 15 anos, já que sem suporte externo Terry teria falecido logo após o acidente que privou o seu cérebro de oxigénio.

O presidente Bush, o grande defensor da vida que todos conhecemos, interrompeu as suas férias no Texas para assinar a dita lei, que é discutida hoje numa sessão especial do Congresso americano, convocada especialmente para o efeito.

O senador Bill Frist, líder da bancada republicana e representante do Tennessee, afirmou que «O congresso dos Estados Unidos tem trabalhado ininterruptamente nos últimos três dias para manter a dignidade humana e afirmar a cultura da vida».

É pena que a invasão do Iraque não tenha merecido uma quantidade análoga de trabalho extra para manter a dignidade humana dos iraquianos e afirmar o seu direito à vida! Ou que os filhos dos crentes das muitas Igrejas cristãs que consideram blasfemos os hospitais e tratamentos médicos, considerando que o único tratamento possível é a oração, continuem a morrer de doenças facilmente curáveis ou para as quais existem vacinas há décadas. Mas, claro, obrigar alguém a tratamento médico que rejeita por questões de fé é completamente diferente de retirar esse tratamento por razões ateístas como respeitar o direito a morrer em dignidade!

É pena ainda que o tempo dos congressistas não seja dispendido a declarar inconstitucional a lei do estado do Ohio que reza na secção 2151.03(e):

«Uma criança que, em vez de tratamento médico ou cirúrgico para uma ferida, doença, incapacidade, ou doença física ou mental, está sujeita a tratamento espiritual através de oração, de acordo com os preceitos de uma religião bem reconhecida, não é uma criança negligenciada…»

acrescentando na secção 2151.421, que «nenhum relatório é necessário no que concerne a uma criança nessa situação.»

20 de Março, 2005 Palmira Silva

Massacre de Kanungu: cinco anos depois

Em 17 de Março de 2000, cerca de 1 000 pessoas foram imoladas pelo fogo na Igreja do culto Movimento para a Restauração dos Dez Mandamentos de Deus, liderado por Joseph Kibwetere, Credonia Mwerinde, Angelina Mugisha, padre Joseph Kasapurari e padre Dominic Kataribabo. O culto católico apocalíptico pregava que o fim do mundo ocorreria na passagem do milénio e que a admissão directa no Céu só era possível por restauração dos Dez Mandamentos.

O movimento teve a sua génese nas visões da Virgem Maria de Credonia Mwerinde, católica e filha de piedosos católicos que por necessidade tinha feito uma incursão pela prostituição, que a mandou fundar a Ishaatuuriro rya Maria (A Igreja de Maria Mãe de Deus). Uma versão africana do «milagre» de Fátima que, numa zona do globo de abissal pobreza, desespero e obscurantismo, teve um fim trágico. Credonia afirmava ainda que em 14 de Junho de 1980, fora instruída pela Virgem para observar o Sexto Mandamento, cujo desvio era a causa da SIDA.

Credonia era assim a colaboradora ideal para o que seria o líder do culto, Joseph Kibwetere, um político, que afirmava igualmente ter experienciado encontros imediatos com a Virgem Maria que o instruíra para reformular os Dez Mandamentos. Um dos «segredos» comunicados era o fim do Mundo na passagem para 2000…

Com um discurso salpicado liberalmente de ameaças do apocalipse, os líderes do culto manipularam os seguidores, camponeses ignorantes na sua maioria, à submissão. Todos os direitos fundamentais lhes eram negados sem serem admitidas quaisquer perguntas ou dúvidas sobre a verdade revelada aos líderes, como é prática corrente nas religiões reveladas. Toda a estrutura do culto assentava em princípios que violavam os direitos humanos e de cidadania: os pais eram separados dos filhos, as crianças que choravam à noite eram expostas aos elementos até deixarem de chorar, os casais não podiam relacionar-se sexualmente, as mulheres que engravidavam eram escorraçadas dos campos do culto pelos líderes, os membros eram encorajados a despojarem-se dos bens materiais (entregando-os aos líderes do culto, claro), etc..

Claro que enquanto os crentes eram despojados dos mais elementares direitos, bens e conforto materiais, os líderes religiosos apreciavam em grande estilo os seus!

O problema para os líderes do culto surgiu quando o Mundo não acabou na passagem de ano de 1999 para 2000. Os seguidores foram encorajados a rezar mais fervorosamente e a jejuar enquanto os líderes preparavam o golpe final para se livrarem dos agora incómodos crentes. Pensa-se que estes últimos foram envenenados num jantar preparado para emular a Última Ceia e conduzidos à Igreja que foi então incendiada. As contas bancárias do culto e seus seguidores tinham sido limpas previamente…

Cinco anos depois os (ricos) líderes do culto e responsáveis pelo massacre, continuam em liberdade em parte incerta.

20 de Março, 2005 Palmira Silva

Colónia (In)Dignidade

A Argentina expulsou para o Chile Paul Schaefer, de 83 anos, um antigo nazi depois pastor evangélico e fundador de um culto cristão sinistro, para que este possa ser julgado por crimes de pedofilia e tortura cometidos durante o regime de Augusto Pinochet. Schaefer está fugido da justiça chilena desde a emissão de um mandato para a sua captura em Agosto de 1996 para responder a múltiplas acusações de pedofilia, sendo depois condenado em 2004 juntamente com 22 pessoas responsáveis pela colónia fundada por Schaefer em 1961.

Schaefer foi capturado há uma semana na localidade de Tortuguitas, perto da capital argentina, Buenos Aires, após seis meses de investigação da polícia local.

Paul Schaefer, um paramédico no exército de Hitler, pastor evangélico depois da guerra, fugiu para o Chile em 1961 depois de ser acusado de abusar sexualmente de dois rapazes no lar que fundou, supostamente para auxiliar os orfãos de guerra.

Aí, sob os auspícios de Augusto Pinochet, com quem colaborou entusiasticamente, nomeadamente na tortura artística de opositores do ditador, ao som de Mozart e Wagner, fundou a Colonia Dignidad, «um estado dentro de um estado» como se lê num relatório do Congresso chileno, cercado de arame farpado e cercas eléctricas, onde floresceu o seu culto cristão, envolvendo muitos exorcismos de demónios e demonização do sexo. Excepto, claro, o imposto abusivamente pelo próprio Schaefer aos jovens do culto…