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Dia: 19 de Fevereiro, 2005

19 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

Dilúvio da modernidade

Por mais que a comunicação social se esforce por explicar cientificamente como se forma um maremoto e por mais difícil que seja, para quem tem parcos conhecimentos na matéria, compreender o fenómeno, que se revela tão devastador, não passa pela cabeça de um cidadão equilibrado que a tragédia recente, ocorrida em países do Índico, possa ser da responsabilidade de um deus facínora, vingativo e cruel.

Todavia, em Marrocos, movimentos islamistas com representação parlamentar acreditam, e obrigam a acreditar, que Deus enviou o maremoto como castigo e até conhecem as motivações divinas: o turismo sexual. Não importa que a devastação tenha chegado a lugares onde tal turismo não exista, são efeitos colaterais de um advertência divina contra os pecados humanos que Deus não abdica de castigar.

O aproveitamento da ignorância e a exploração do medo é um hábito ancestral do clero que a humanidade, na sua difícil e penosa caminhada para o espírito científico, tem sabido combater. Desde o dilúvio às pragas, dos terramotos às epidemias, da lepra à guerra, das doenças à condenação ao inferno, o castigo divino é uma arma que as religiões usam para transformar os homens num bando de beatos, tímidos e assassinos.

Nada há mais irracional do que o julgamento religioso, mais violento do que o critério divino interpretado pelos seus padres, mais sórdido do que os castigos infligidos para agradar a Deus. Ontem matavam-se judeus por causa da usura, as bruxas pelo mau olhado, os infiéis pelo falsidade da sua religião. Já em Sodoma e Gomorra, Deus não suportou a felicidade dos seus habitantes e arrasou as cidades. Hoje os seus clérigos viram as populações analfabetas e crédulas contra as prostitutas, os homossexuais e quaisquer outros onde a violência possa exercer-se para fazer catarse do sofrimento e da miséria.

A religião é uma pandemia planetária, cruel, perversa e mentirosa.

19 de Fevereiro, 2005 Mariana de Oliveira

Abominações do abominável

No dia 18 de Fevereiro, João César das Neves, insigne intelectual e académico da nossa praça, deu uma interessantíssima entrevista ao jornal «O Independente» que merece ser divulgada e estudada.

Depois de comentar a injustiça do seu processo judicial – em que é acusado de ter equiparado «actos homossexuais ao crime de pedofilia», referindo que «os recentes casos de pedofilia são todos, mesmo todos, homossexuais», de ter comparado os homossexuais a drogados e de os ter considerado doentes -, diz que a nossa sociedade encontra-se num caminho para a destruição por estar obcecada pelo prazer.

Continuando com a questão da «doença da homossexualidade», esclarecendo o despacho de pronúncia, César das Neves diz que em lado nenhum considera os homossexuais doentes ou drogados, mas afirma apenas que existem algumas semelhanças. Ora, isto é muito mais aceitável, pois claro! E que semelhanças são essas? A anormalidade do comportamento! Daqui passa logo para a magnífica conclusão de que, se há 30 ou 40 anos a homossexualidade e a pedofilia eram consideradas iguais e se , actualmente, a primeira é aceitável, daqui a uns tempos serão ambas iguais.

Se os caros leitores já estão impressionados com o que se disse até agora, tenham em conta que isto é só o começo. Logo a seguir, o grande economista afirma que a homossexualidade é um comportamento desviado… «como o diz o catecismo da Igreja Católica»! Será que o que diz a ICAR, para o académico, é lei? O que diz a ICAR é apenas a sua opinião. Daí que entenda que as relações entre pessoas do mesmo sexo sejam imorais. Mais: qualquer dia, com estes movimentos para a legalização dos casamentos homossexuais, será a vez da poligamia, do incesto e da bestialidade! A legalização da poligamia não é muito chocante desde que funcione para os dois sexos, que as relações entre os cônjuges sejam devidamente acauteladas bem como a segurança do comércio jurídico. Quanto ao incesto, este constitui um impedimento ao casamento – e nada mais do que isso – por razões de saúde. Relativamente à bestialidade, não pode ser nunca equiparada ao casamento porque os animais não têm vontade, faltando logo, à partida, um dos requisitos – vontade livre e esclarecida – para aquele contrato.

Da homossexualidade, João César das Neves passa para a obsessão pelo prazer e suas consequências: a queda da instituição familiar e, assim, a decadência da sociedade. E como se manifesta esta obsessão? Pelos livros de educação sexual que incitam à masturbação, que entendem que é algo perfeitamente normal, e à descoberta da sexualidade! Que vergonha! Que pecado! Que crime! Porquê? Porque «o sexo é uma força extraordinariamente poderosa que define a nossa vida». É um comportamento desviante que distorce a personalidade. É por isso que as sociedades «tentaram arranjar costumes, hábitos e regras para controlar esta coisa». O leitor repare que o entrevistado se refere ao sexo como «coisa», como se fosse algo de nojento que nem merece ser tratado pelo nome.

A seguir, JCN fala na única revolução sexual da História – a imposta pela Igreja – e que acabou «com o deboche absoluto, com regras muito sortidas». «Abandonar a Igreja», diz, é «voltar ao mesmo». Por isso é que diz que a pedofilia deixará de ser crime, porque na Grécia Antiga era normal. Todo este afastamento da boa doutrina da Igreja da moderação sexual e, desta forma, da família está a conduzir ao aumento do «consumo de droga, do suicídio, da desorganização das famílias, do abandono dos mais velhos».

E o preservativo? Esta questão, de acordo com o académico, não se coloca numa relação estável entre marido e mulher (como se o casamento conferisse, automaticamente, estabilidade numa relação) e que aquele pedaço de látex «é uma forma mecânica de tratar questão». Na verdade, para quem leva uma vida de deboche (o que quer que isso seja) e não conhece as regras da Igreja, isto é só um pormenor.
E se um casal heterossexual não quiser ter filhos? A solução de JCN é o fiável método do calendário!

Quanto à hipocrisia da Igreja face ao aumento da sida e à constatação de que as relações sexuais não se passam entre casais estáveis? Não há hipocrisia nenhuma! De acordo com César das Neves, a ICAR não condena o preservativo, mas sim o deboche. Se as pessoas só tiverem relações sexuais como diz a Igreja, deixa de haver sida. As campanhas de luta contra a sida deviam dizer «não ande aí no deboche» em vez de aconselharem o uso do preservativo.

Relativamente ao aborto, obviamente, João César das Neves considera que a ciência não tem dúvidas ao afirmar que existe a destruição da vida humana. Não sei a que ciência é que se refere porque se há algo onde a ciência se divide é na definição do início (e no fim) da vida humana. Assim sendo, equivalendo a interrupção voluntária da gravidez à morte de uma criança, esta devia ser proibida em todos os casos, incluindo mal-formação genética e em caso de violação.

Que conclusões podemos retirar desta esclarecedora entrevista? Como disse o Carlos Esperança:
1 – O acto sexual só é legítimo se se destinar à procriação;
2 – A masturbação e uma abominação porque dá prazer. Para fazer um espermograma
deve-se casar canonicamente, praticar o coito com vista a reprodução e fazer,
depois, uma punção no baixo ventre da mulher para recolher a amostra de sémen;
3 – A masturbação feita aos outros não foi abordada por JCN pelo que ficou sem
se saber se pecavam os dois ou só um;
4 – Deboche é qualquer prática sexual que tenha em vista o prazer. A gula é o
deboche dos hidratos de carbono;
5 – Tudo o que diz a ICAR é a verdade, a única verdade, a verdade de JCN;
6 – O Papa é o sociólogo, o psicólogo, o casto e o modelo das virtudes humanas. Se todos o seguissem acabaria a humanidade por falta de reprodução.