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Dia: 10 de Dezembro, 2004

10 de Dezembro, 2004 Carlos Esperança

Religião combate a liberdade

Como já hoje foi assinalado pela Palmira, os muçulmanos, à semelhança do que nos habituou a ICAR, já se atrevem a combater a liberdade de expressão na Dinamarca, em nome da defesa dos seus ideais religiosos. Desta vez o pretexto é a «afronta» ao Islão pela transmissão do filme «Submissão» do assassinado realizador Theo van Gogh que pagou com a vida a denúncia que fez da violência islâmica sobre as mulheres.

Na Suíça, quarenta deputados federais assinaram uma petição pedindo ao governo para adoptar medidas de segurança e vigilância junto aos imãs que pregam uma leitura literal do Alcorão. Acontece que um dos dirigentes islâmicos, que garante a bondade da religião, declarou numa entrevista que não se pode opor ao apedrejamento de uma mulher adúltera pois esse é o ensinamento do livro sagrado, como se os livros sagrados, todos juntos, valessem mais do que a «Declaração Universal dos Direitos do Homem» cujo aniversário hoje se comemora.

Na Holanda, na Bélgica e na Alemanha a inquietação cresce contra o fascismo islâmico. Curiosamente, em vez de se limitar o poder organizado das Igrejas, há quem proponha limitações à liberdade de expressão, para não «provocar» os crentes. Em vez de se defender a liberdade, pactua-se com o medo, em vez de se insistir no laicismo, acentua-se a submissão aos delírios místicos. E os cristãos mais radicais, para quem a liberdade causa urticária, corroboram esse procedimento. Não há democracia sem laicismo.

Num artigo muito oportuno, a propósito das eleições do Iraque, Vital Moreira afirma hoje no Causa Nossa, no texto «Democracia» que os chiitas apresentaram a constituição de listas para as eleições no Iraque e tece considerações pertinentes sobre o perigo do voto religioso, para terminar com uma afirmação que merece profunda reflexão:

«Uma democracia não equivale à tirania de uma facção religiosa, por mais maioritária que seja. Numa sociedade dividida, reduzir a democracia ao triunfo da maioria eleitoral, ainda por cima com base numa hegemonia religiosa, pode ser a receita para o desastre».

10 de Dezembro, 2004 Carlos Esperança

A ICAR é notícia

O «Público de ontem dedicou à ICAR grande parte das páginas 28 e 29. Há uma foto enorme de duas Excelências Reverendíssimas, com as piedosas cabeças enfiadas num adereço com o formato da parte mais saborosa das galinhas, e a «Rosa de Ouro», uma das mais altas distinções papais, que foi conferida à Basílica do Sameiro, em Braga.

Consta que cerca de 50 mil pessoas se extasiaram com a celebração dos 150 anos do dogma da Imaculada Conceição (aquela obrigação católica de acreditar que a virgindade pós-parto passou de mãe para filha). Estiveram presentes quase todos os bispos portugueses, o legado papal, o núncio apostólico e o patriarca Policarpo, além de numerosos cónegos, monsenhores e padres. Foi uma orgia de fé testemunhada por uma multidão de clérigos.

Arreliador, para os cristãos, foi o presépio exibido no Museu de Cera de Madame Tussaud, em Londres, onde o casal Beckham, David e Vitória, representavam respectivamente S. José e a Virgem Maria. Que Tony Blair, G. W. Bush e o duque de Edimburgo fizessem de reis magos talvez não fosse tão grave como Vitória Beckham fazer de virgem, com uma anatomia de fazer corar a Virgem Maria legítima e de fazer pecar por pensamentos metade do mundo católico.

Mas o mais grave de tudo foi a indemnização recorde paga pela diocese católica de Orange City, na Califórnia, 75 milhões de euros para 87 vítimas de abuso sexual. A ICAR aguenta-se bem com os escândalos, onde tem uma larga experiência, mas dá-se mal com as indemnizações onde só recentemente começou a sentir quanto doem.

Finalmente sabe-se que a Obra da Casa do Gaiato não acredita nos relatórios demolidores dos inspectores da Segurança Social e, para restaurar o prestígio e responder às acusações, encomendou um estudo isento à…Universidade Católica.

10 de Dezembro, 2004 Palmira Silva

Direitos Humanos

Faz hoje 56 anos que a Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Infelizmente, mais de meio século passado, os considerandos desta declaração, que todos consideraríamos de senso comum, consensuais e indiscutíveis, não permearam indelevelmente as sociedades do século XXI. Em boa parte porque o espectro das religiões voltou a assombrar a humanidade com o concomitante ressurgimento de intolerâncias religiosas que ameaçam os mais fundamentais direitos humanos. Os fundamentalismos que eclodem em todos os pontos do globo, mesmo nos mais improváveis, se não forem eficazmente combatidos, corresponderão a uma regressão civilizacional imprevísivel há escassos anos. Quando todos desconsiderávamos a questão religiosa, acreditando serem crimes em nome de qualquer Deus algo de um passado que não se repetiria… Infelizmente a História recente provou o nosso engano e espero que nos tenha despertado da atitude complacente em relação às religiões e acordado para a ameaça latente que estas constituem para o modelo de sociedade preconizado na supracitada Declaração.

10 de Dezembro, 2004 Palmira Silva

Submissão

Um grupo de muçulmanos na Dinamarca apresentou queixa oficial às autoridades competentes contra uma emissora pública de televisão dinamarquesa, acusada de incitar ao ódio ao Islão.

A afronta ao Islão cometido pela Danmarks Radio reside na transmissão do filme «Submissão» do assassinado realizador holandês Theo van Gogh. O presidente da comissão de imprensa da Sociedade da Religião Islâmica, Kasem Said Ahmad, afirmou à revista Politiken que «Queremos enviar uma mensagem política aos muçulmanos da Dinamarca de que este é o caminho a ser tomado com estas coisas e aos dinamarqueses de que não desejamos que nossa religião seja ridicularizada assim.»

Depois da proibição de um número da Newsweek no Paquistão, continua a polémica associada ao filme concebido pela deputada holandesa Ayaan Hirsi Ali, natural da Etiópia e de origem muçulmana.

A Holanda foi um dos poucos países no mundo a permitir a exibição do filme de Jean-Luc Godard, «Salve Maria», considerado pelo Vaticano nos anos 80 como uma blasfémia. Blasfémia continuada pelo lançamento recente, na Holanda, do livro «Judas«, por Walter Kamp. O escritor holandês argumenta que Jesus era homossexual num livro de ficção que aqueceu ainda mais os debates sobre tolerância e liberdade de expressão num país que se orgulha da sua longa tradição de ambas.