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Dia: 29 de Julho, 2004

29 de Julho, 2004 Carlos Esperança

Há investimentos melhores e piores

José Maria Aznar, ex-primeiro-ministro espanhol, detém a mais alta condecoração dos EUA, à semelhança de Nelson Mandela ou Winston Churchill.

A distinção não se deve apenas – como se pensou – ao entusiasmo posto na invasão do Iraque pelo antigo simpatizante franquista, líder do PP, com ligações ao Opus Dei.

O seu Governo deu mais de um milhão e meio de euros a um escritório americano de advogados para fazer lóbi, nos EUA – um investimento modesto e excelente, que transformaria um papa-hóstias num governante respeitado.

O problema foi ter-se sabido da tramóia, que está a ser divulgada em todo o mundo. Em Portugal vem hoje na Visão.

O Opus Dei investiu mais, mas de forma mais rentável, para passar a «prelatura pessoal» de JP2.

A transferência de quase mil milhões de dólares para o IOR (Instituto das Obras Religiosas, piedoso nome sob o qual se disfarça o Banco do Vaticano), evitou a bancarrota e a vergonha associada às operações fraudulentas com o Banco Ambrosiano, de Roberto Calvi, amigo do peito e da missa deste Papa.

Como benefício suplementar (mil milhões de dólares dá para comprar Deus, quanto mais o papa) foram imediatamente encomendados milagres para quando se finasse Josemaria Escrivá, fundador da seita, a fim de ser canonizado em tempo recorde, excedendo todos os limites de velocidade canónicos.

29 de Julho, 2004 Mariana de Oliveira

Umbigos creacionistas

Antes de ir de férias, uma pergunta:

Adão e Eva tinham umbigos?

Pergunta pouco original enviada por SMS.

29 de Julho, 2004 André Esteves

Leituras leves de verão

Está nas bancas uma edição especial da «Science et Avenir» dedicada ao tema: «O Sentido moral nos animais».

Inclui artigos de várias perspectivas, desde a filosófica, evolucionária, etológica que permitem adquirir uma noção do estado das coisas, nesta àrea do conhecimento e da investigação das coisas.

Inclui também uma entrevista com um dos maiores investigadores do comportamento primata dos nossos tempos: Frans de Wall. As revelações fascinantes do comportamento altruísta dos grandes macacos que o seu trabalho têm revelado, demonstram por exemplo, que a moral apareceu muito antes da religião.

Uma boa leitura de férias. Para folhear e mergulhar em informação nova enquanto se relaxa numa esplanada…

Ah! E comam uma banana! Em homenagem aos nossos primos.

29 de Julho, 2004 jvasco

Uma vida sem sentido?

Quando ocorrem tentativas de conversão por parte de alguns crentes, um argumento que é o usado recorrentemente é o seguinte: «Então qual é o sentido da vida? Não é triste uma vida sem sentido, sofrendo as injustiças e o sofrimento terrestre, para depois morrer como um mero animal? Não é triste viver a acreditar apenas no vazio incontornável da morte?»

A mim impressiona-me que alguém use estas perguntas (ou suas variações) como argumento. Para mim é tão óbvio que o grau de agradabilidade de uma hipótese é completamente irrelevante para o grau de plausibilidade desta, que nunca me passaria pela cabeça argumentar assim com um cristão: «tu acreditas num Deus que, segundo a Bíblia, vai enviar a esmagadora maioria da humanidade para o Inferno, um lugar de sofrimento angustiante e eterno?». Quando muito poderia argumentar que isso não seria muito próprio de um Deus misericordioso.

Uma vez que (repito) o grau de agradabilidade de uma hipótese é completamente irrelevante para o grau de plausibilidade desta, nós devemos ver a realidade como ela é, e não como gostaríamos que ela fosse. E a discussão poderia estar encerrada por aqui. Mas não está.

Acontece que a minha forma de encarar a realidade e a vida, apesar de não necessitar de se suportar em ilusões baratas, superstições gratuitas e negações primárias, realiza-me tanto ou mais como o mito do paraíso realiza os crentes.

E isto é algo que os ateus não costumam afirmar (porque encerram a discussão nas considerações acima), mas deviam fazê-lo, para esclarecer muita gente que não compreende isso.

É que, mesmo tendo noção da realidade, nada me impede de sonhar. Desde que, claro, saiba distinguir o sonho da realidade. Todo o sentimento de ligação com o infinito, de transcendentalidade, de pertença a algo maior pode estar presente num ateu. O ateu pode sonhar com um mundo melhor, e não com o paraíso celeste. O ateu pode sonhar com o eco da sua obra através da eternidade, ao invés da imortalidade duma alminha; o ateu pode querer fazer o bem, sem ter de crer numa recompensa numa outra vida que não existe.

Os seres humanos eram (e ainda são) animais, e o sentimento religioso surge, tal como uma série de instintos primários – a agressividade, o medo, a ganância, etc. – por questões de selecção natural. Importa compreender e dominar esses instintos.

Tal como o instinto da agressividade pode dar belos resultados no desporto, sob a forma de camaradagem, competitividade, emoção, sem ter de recorrer à guerra a que esse sentimento naturalmente conduz, também o instinto religioso pode conduzir a um sentimento de pertença a algo maior, a uma preocupação com as gerações seguintes, sem ter de cair na religião, na superstição, na crendice primária.

Eu gosto de sonhar, e gosto de usar o sonho para moldar a realidade, tornando-a melhor. Confundir o sonho com a realidade não é um bom método para o fazer, e a história mostrou que pode ter consequências muito desagradáveis.