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Dia: 25 de Fevereiro, 2004

25 de Fevereiro, 2004 Carlos Esperança

A resposta de Bernardo da Motta

Eis o que pensa um crente. Assinaladas com (>), em itálico, encontram-se as minhas afirmações, seguidas das respectivas respostas. Para se perceber o grau de tolerância de que um crente é capaz.

……………………….

Obrigado pela sua resposta.

>Depois, tenho a dizer-lhe que, não sendo o véu uma imposição do Corão, não deixa de ser uma arma que os fundamentalistas islâmicos usam para desafiar o carácter laico do Estado francês.

O Corão impõe decência e pudor no vestuário. De facto, não faz qualquer referência específica ao tipo de vestuário.

E é um facto que o fanatismo islâmico (prefiro esta palavra a “fundamentalismo”, uma vez que “fundamentalismo” deve significar “aderência a fundamentos”, o que é algo que eu aprovo) usa vezes sem conta o Corão como arma de terror.

O meu ponto de vista é o do espectador que assiste à derrocada das verdadeiras tradições.

O Islão, a par com tantos outros sistemas tradicionais, está a colapsar. O trabalho dos fanáticos dá uma grande ajuda é certo.

> Pode argumentar, caro leitor, que o Islão já foi tolerante.

Mesmo hoje em dia, há várias facetas do Islão!!

Conhece o sheik Munir, da comunidade islâmica aqui de Lisboa?

Conhece homem mais prudente, sensato, culto e tolerante?

> Mas prove-me que é capaz de:

>- Renunciar à sharia;

A sharia é parte integrante da tradição islâmica.

faz parte do terno “haquikah, tarikah e sharia”

“haquikah” é o conhecimento interior, o lado interior da doutrina, se quiser, o seu lado “esotérico”. O sufismo versa sobre a “haquikah”.

“tarikah” é a via, é o caminho.

“sharia” é o conhecimento exterior, o lado exterior ou “exotérico” da doutrina. Numa sociedade plenamente tradicional (já quase não as há), não faz sentido a separação entre religião e Estado. Essa é outra das confusões do mundo moderno.

> Permitir aos crentes que o abandonem;

Concordo consigo. Qualquer pessoa deveria poder abandonar o Islão se o quisesse fazer. Contudo, nesse caso, eu concordo que tal pessoa deveria também abandonar fisicamente o local e a cultura onde o Islão fosse tradição.

>- Defender a liberdade de ter qualquer religião e a de não ter;

Concordo!

>- Pedir perdão pela fatwa contra Salman Rushdie;

Concordo! Este é também mais um gesto fanático.

>- Enfim, se é capaz de renunciar à pena de morte, poligamia, discriminação da mulher e outros anacronismos e consentir, nas suas escolas, símbolos cristãos, judaicos ou ateus.

Aqui é que eu já acho que o Carlos está a misturar várias coisas. A mulher não é discriminada no Corão. Os homens, contudo, facilmente encontram formas de ler a seu bel-prazer o Corão. A poligamia é uma característica intrínseca ao Islão, e vem referida e legislada no Corão. é uma característica da cultura islâmica, e é óbvio que nos é estranha, a nós, ocidentais, que temos outra cultura.

Chamar de “anacronismo” algo que não se conhece não me parece correcto.

Repito, a genuína tradição islâmica, por muito que esteja em vias de extinção como as restantes tradições espalhadas por esse mundo fora, nada tem de anacrónico, visto que é uma via de Verdade, uma Verdade revelada.

A decisão do Estado Francês, cujas consequências nefastas ainda são imprevisíveis, só demonstra como aqueles que detêm o poder em França têm a sua intelectualidade e cultura reduzida a um mínimo. É um claro sinal de intolerância, e de verdadeiro terrorismo “jacobino”.

O que irá suceder é que as comunidades islâmicas em França irão regressar a escolas fechadas, tirando as suas crianças do convívio salutar com os restantes alunos. Estaremos a regressar aos bairros étnicos?

>Não basta haver crentes tolerantes, é preciso que o carácter fascista das religiões seja erradicado.

Repare, Carlos, a verdadeira religião nada tem a ver com “fascismo” nem com qualquer outra posição política. A religião tem uma natureza tanto transcendente como social, é certo, mas é social na medida em que serve como elo de coesão da sociedade e como ponte para a divindade.

Não seria correcto apelidar uma religião de “fascista”. Aliás porque o próprio fascismo é uma forma anti-tradicional e por isso mesmo, fortemente anti-religiosa.

>Cumprimentos.

>Carlos Esperança

Cumprimentos,

Bernardo

25 de Fevereiro, 2004 Mariana de Oliveira

Pê Nê Rê

Há uns tempos, através do André Esteves, tomei conhecimento da página do Partido Nacional Renovador. Não se pode saber muito sobre a sua história porque, quando carregamos no link, aparece um grande quadrado branco, vazio… quiçá sintomático da própria ideologia do partido.

Logo na primeira página, pode ser descarregada a petição Mais Vida, Mais Família cujo objectivo é travar a descriminalização do aborto e, através de um número de telefone ou de um endereço de correio electrónico é possível pedir uma brochura intitulada “Aborto: 50 perguntas e respostas em defesa da vida inocente”. Não surpreende. Como partido afecto às concepções trogloditas tomadas por sectores cripto-reaccionários da Igreja Católica é natural que defenda a criminalização de todos os comportamentos que chocam com uma qualquer moral vestida de sotainas bafientas, esquecendo princípios fundamentais do Estado de Direito Democrático de matriz europeia – o respeito pela dignidade humana, em geral, a defesa da dignidade da mulher, em particular, e o facto indiscutível de o direito penal, como direito de ultima ratio, não poder conter valorações de ordem moral e religiosa.

Quanto à ameaça da imigração – o sítio apresenta inúmeras notícias referentes a comportamentos ilícitos perpetrados por estrangeiros numa demagogia típica -, os adeptos do PNR esquecem-se que vivemos num mundo cada vez mais globalizado onde é impossível seguir uma política autista de orgulhosamente sós. Como país integrado na União Europeia – algo que eles gostariam de mudar – Portugal está necessariamente sujeito aos movimentos tanto de entrada como de saída (estes são, oportunamente, esquecidos) de trabalhadores.

Para além disso, a abertura a indivíduos vindos do estrangeiro (esse grande país) é essencial para a nossa economia: com um número de trabalhadores activos cada vez menor em virtude das baixas taxas de natalidade e, portanto, com um aumento do número de pensões, na próxima geração não haverá forma de sustentar a classe activa de hoje. Por isso, precisamos de imigrantes para compensar esta falta.

Outra coisa que estes senhores se esquecem é que, historicamente, a Europa e Portugal cresceram à custa da imigração: os celtas e os iberos foram imigrantes. Os romanos também encorajaram as movimentações espaciais. Mais tarde, as invasões bárbaras caracterizaram-se pela deslocação dos povos do norte para o sul do continente. Os árabes também deram o seu contributo para a diversidade cultural que encontramos por todo o lado. Actualmente, os imigrantes do leste e das antigas colónias europeias são apenas mais uma vaga que irá contribuir para esta manta de retalhos que é o nosso país e a Europa.

Algo preocupante que se nota, não apenas em relação a este partido minoritário, é uma onda de saudosismo que tem vindo a afectar determinados sectores da direita portuguesa. Só espero que tudo seja passageiro.