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Autor: José Moreira

25 de Abril, 2018 José Moreira

A (in) existência de Deus

Um dos argumentos apresentados pelos crentes quando se discute a existência de Deus, é o de que os ateus não conseguem provar que Deus não existe. Claro que existe sempre o contra-argumento de que a não existência, seja do que for, nunca pode ser provada. Por exemplo, ninguém consegue provar que não existem gambuzinos ou elefantes cor-de-rosa. Mas já cheguei à conclusão que era demasiada areia para a camioneta deles. Por isso, decidi que na impossibilidade de os combater, o melhor seria juntar-me a eles. Assim, passei a concordar com o argumentário crentalho, e a assumir que, não podendo provar a não existência de Deus teria de, pelo menos, aceitar a possibilidade da sua existência. Pois. Mas a alegria dos meus interlocutores rapidamente se desvanece, quando eu acrescento que o mesmo se aplica aos deuses gregos, romanos, egípcios, etc.

18 de Julho, 2017 José Moreira

O Suave Milagre

Nota prévia: os factos relatados são verdadeiros. Vi a fotografia. Por razões óbvias, alterei o nome da personagem.

 

Adalbataberto apareceu-me, naquele dia, com ar circunspecto e algo enervado. Mais do que o costume. Sentou-se, mandou vir o habitual café com “cheirinho” e desatou a desabafar:

“Vê lá tu, que aqui há anos, o gastrenterologista fez-me uma endoscopia e detectou uma hérnia do hiato. Até tirou uma fotografia, e tudo. Logo na altura, disse-me que a hérnia, como todas as hérnias que se prezem, era irreversível. Avisou-me de que tinha de viver com aquilo, e receitou-me um medicamento para evitar o refluxo”. Sorveu mais um gole de café, e prosseguiu: “Ontem, fui fazer outra endoscopia. O médico, sim, o mesmo médico, garantiu-me que estava tudo em ordem. E a hérnia? perguntei. Que não, que não havia hérnia nenhuma. Ó sr. Doutor, mas não me disse que tinha uma hérnia do hiato? Disse. E que a hérnia era irreversível? Disse. Então, e a hérnia? Não faço ideia, não tem hérnia nenhuma. Então, como explica isto? Sinceramente, não tenho explicação.” Acabou de beber o café, e recostou-se na cadeira: “Como diria o outro: e esta, hein?” Foi a minha vez de falar: “É simples, acho eu. Tinhas uma hérnia, com fotografia e tudo. Era irreversível, mas desapareceu. O médico, ou seja, a ciência, não dá explicação. Pronto! Tens todos os requisitos para um milagre. Acho que devias sentir-te feliz.” Rematei no gozo. “Pois, mas esse é que é o problema. Imagina se alguém dá com a língua nos dentes, e algum padre vem a saber do assunto? Logo agora, que a Irmã Lúcia está na calha para a santidade, este milagre fazia-lhes cá um jeitaço do caraças, não achas? E eu é que me tramava, a aturar a padralhada toda!” Deixei sair uma gargalhada, ante a simplória preocupação de Adalbataberto: “Tem calma, pá. Tu és ateu, ninguém te passa cartão.”

7 de Maio, 2017 José Moreira

Mais católicos menos praticantes

O insuspeito “Jornal de Notícias” (JN) dava hoje à estampa um artigo segundo o qual existem, actualmente, mais católicos, mas esses são menos praticantes. Confesso que fiquei confuso, sem saber, ao certo, o que é isso de “ser católico” sem ser “praticante”.  Para mim, que não percebo patavina, “ser católico” não é limitar-se a estar inscrito na ICAR, pois se assim fosse, sem a menor sombra de dúvida que cada vez há mais católicos: à medida que nascem vão sendo inscritos e o seu número aumenta, naturalmente . Até eu estou lá inscrito. Mas ser católico, no meu entender, é, além de estar inscrito na ICAR, cumprir os seus cinco mandamentos. Isto para além, claro, de cumprir toda a sua (da ICAR) doutrina avulsa, que não se fica pelos mandamentos, já para não falar na doutrina bíblica. Por exemplo, gerar filhos fora do casamento é um pecado. E o que nós vemos é que cada vez há mais famílias monoparentais, o que é uma situação pouco católica. Claro que a ICAR, como tem vindo a ser seu timbre, vai-se “mimetizando”, e vai aceitando, no seu seio, casais divorciados, homossexuais e outros em situações pouco católicas.

Ora, para mim, “católico” é, além do mais, cumprir “religiosamente” os preceitos religiosos. Quem não o fizer, não é católico; limita-se a estar inscrito na ICAR. Pelo que a “estatística” ou, se preferirmos, a conclusão do JN é falaciosa. Porque eu também sou trompetista, mas não toco trompete.

Falta, finalmente, dizer que esta “notícia” está em flagrante contradição com esta.

 

16 de Abril, 2017 José Moreira

Milagres com prazo de validade

A insuspeita revista “Sábado” publica, no seu último número, um artigo acerca da próxima vinda do papa de serviço a Fátima. Adianta que não se trata de uma visita de estado, mas de uma peregrinação, pelo que não se percebe muito bem por que raios vai ter um encontro com o presidente da República e com o primeiro-ministro. Ou será, apenas, com os cidadãos Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa? Bom, adiante.

A folhas tantas, aparece uma entrevista com a freira-médica (ou será médica-freira? De qualquer modo, cheira-me a oxímoro) Ângela Coelho que acumula, também o cargo de “postuladora da causa dos pastorinhos”. Bom, deixemos de lado o blá-blá, e situemo-nos naquilo que, no fim de contas, acaba por se verificar serem, os milagres: a mais monumental fraude religiosa. Digamos, também, que a freira não aprendeu nada com a ciência. A certa altura,o entrevistador pergunta: “Como se define um milagre? É um acontecimento não explicável pela ciência?” ao que a freira responde: “Sim, ou pelas leis da natureza. 90% são casos médicos. Uma cura rápida e duradoura não explicável pela arte médica actual”. O jornalista volta à carga, e a ingénua feira cai na esparrela. Jornalista: “Então um milagre no século XVI hoje não seria?” E a freira: “Poderia não ser.” Mas vale a pena continuar a ler, pois a nova pergunta, a médica acaba por referir que não levou um caso à Congregação da Causa dos Santos. Tratava-se de uma criança com diabetes tipo I com uma bomba difusora de insulina. “No fim da missa da beatificação a mãe pede aos pastorinhos que curem o seu menino e logo naquele dia começa a achar que a bomba não está a funcionar. Foi ao hospital e a criança não tinha nada. Mas foi chumbado: há um tipo de diabetes na infância que tem uma cura assim”. Ou seja: a freiramédica acabou por, sem querer, prestar um mau serviço à causa religiosa. Disse, claramente, que não há milagres; apenas factos que a ciência não sabe explicar. Porque a ciência, ao contrário da religião, não é arrogante. E eu pergunto: os “milagres” que ocorreram tempos passados e que, agora, já são explicados pela ciência, continuam “milagres”? E os “santos” respectivos, continuam “santos”?

 

11 de Dezembro, 2016 José Moreira

Eles “andem” aí…

Ao comprar, hoje, o “Jornal de Notícias” (JN), fui presenteado com um calendário para 2017. Não seria nada de especial, se o dito calendário não fosse comemorativo do… “centenário das aparições de Fátima”. Publicitar o que se sabe ser a maior fraude religiosa do Séc XX, é erguer um monstruoso monumento ao obscurantismo. Maior ainda, quando se sabe que o JN pretende ser um “jornal de referência” e é, certamente, um dos jornais com maior audiência em Portugal. A plebe, depauperada por anos de “coelhices”, está propensa a acreditar em tudo o que a possa salvar. Nem que seja o D. Sebastião, ou a “virgem” de Fátima. O JN está a dar uma preciosa ajuda. E a porra é que aqui no Norte não há grandes alternativas, em termos de leitura jornalística.

Sei, e basta ler a “ficha técnica” do JN, que os seus quadros comportam um religioso. Aliás, julgo saber que é o único jornal que contempla, com periodicidade religiosa, uma página, ou grande parte dela, dedicada à religião. Católica, naturalmente, que as outras não existem, mas aqui já é uma questão de reciprocidade. Tal é a independência do JN. Claro que não sou contra o facto de um padre ser jornalista; há padres que são muitas outras coisas, e acho bem que trabalhem. Mas, a bem da independência jornalística, sempre gostaria de ver o mesmo espaço dedicado às outras religiões. E ao ateísmo também, pois sei de ciência certa haver jornalistas ateus no JN.

Quanto ao calendário, foi direitinho para o “papelão”.

3 de Dezembro, 2016 José Moreira

A Minha Confissão

Meus amigos: eu, ex-ateu me confesso. Depois de ter passado a fase católica, a que se seguiu a fase ateísta, eis que senti o chamamento de um deus, não aquele que, em tempos, venerei e temi, mas um outro que decidi inventar, quanto mais não seja porque não me sinto inferior aos outros. Também tenho o direito de inventar um deus. Em resumo, decidi passar a venerar o Pacote de Leite, e o Seu Divino Filho, o Iogurte. Podem chamar-me os nomes que quiserem, inclusivamente podem berrar que o Pacote de Leite é tão inútil como o Deus dos católicos, mas estou-me borrifando.
Todos os dias, ao acordar, elevo a minha prece de agradecimento ao Pacote de Leite, agradecendo a graça de estar vivo. Logo a seguir, impetro o Sagrado Iogurte, a quem peço protecção para o dia que começa. E deixem-me que lhes diga que, até ao momento, me tenho sentido bem, aliás, tão bem como quando era católico ou ateu, mas isso não interessa nada. Peço, também, que o Pacote de Leite promova a paz na Terra e a compreensão entre os Homens. Bom, aí, não tenho visto grandes progressos, mas a verdade é que o Deus dos católicos também não tem mostrado obra. Finalmente, e embora a sós, celebro a Sagrada Eucaristia, que consiste em beber um copo do líquido e, a meio da manhã, comer o corpo de Cristo, perdão, o Sagrado Iogurte, o que faço com veneração. Amém.

Ainda há dias, fiquei fortemente constipado. Pois bem, garanto-vos que foi o meu Pacote de Leite que me aliviou. Bem quente e com uma boa colher de mel. Mas não só: todos os dias peço ao meu Pacote de Leite que me proteja de ser atropelado. Meus amigos, querem crer que ainda não o fui? Atropelado, quero dizer. Quanto a acidentes de automóvel, também estou protegido: trago pendurado, no espelho retrovisor, uma embalagem mini de leite.
As diferenças, as grandes diferenças entre este Deus e o dos católicos são duas, fundamentais: a primeira, é que o meu vê-se e sente-se; a segunda, é o aporte de cálcio. O Deus dos católicos dá?

12 de Julho, 2016 José Moreira

O Presidente e a Fé

Há coisas que ainda (ou já?) não vou entendendo. O nosso PR proferiu um, quanto a mim, excelente discurso laudatório, quer ao engenheiro Fernando Santos quer à selecção que a FPF (?) decidiu mandar ao “europeu”. Foram palavras como, e cito de memória, que já não é grande coisa, “esforço”, “trabalho”, “dedicação”, “competência”, etc. Até aqui, tudo nos conformes, tudo muito FFF, tudo muito institucional. O que não o impediu, no entanto, de borrar a pintura toda. Tal como o seleccionador, afinal. Mas o seleccionador não é, pelo menos para já, presidente da República. Ora, parece-me que cabe, aqui, perguntar: se houve rezas de terço, qual a necessidade de tanto “esforço”, “trabalho”, “dedicação”, “competência”, etc? Se houve, e parece que sim, “esforço”, “trabalho”, “dedicação”, “competência”, etc, para quê rezar? Falta de auto-confiança, ou falta de confiança nas divindades? Por outro lado: vai a Fátima, fazer o quê? Se a selecção ganhou graças à senhora, para que raios ganha Fernando Santos tanto dinheiro? Se a selecção ganhou graças a Fernando Santos Y sus muchachos, para quê agradecer a uma boneca?

Marcelo Rebelo de Sousa, o católico, assume-se como “presidente de todos os Portugueses”. Não é, assumidamente. Não é presidente de ateus, muçulmanos, judeus, hindus, etc. Nenhum deles acredita na senhora de Fátima, nenhum deles vai à missa ou reza o terço. Marcelo Rebelo de Sousa, o católico,  confunde-se, propositadamente, com Marcelo Rebelo de Sousa, o presidente da República. E há muitos portugueses que também confundem. Essa é que é a porra.

1 de Julho, 2016 José Moreira

O ar de Fátima

Confesso que hesitei bastante antes de escrever este artigo. Afinal, o ar de Fátima é vendável e “abençoado”, seja isso lá o que for. Afinal, decidi-me, quanto mais não seja para demonstrar que, em coisas de religião, nada foi inventado. Pelo menos, nos tempos mais próximos, no passado. As religiões limitaram-se a copiar e adaptar o que já existia, incluindo tudo o que diga respeito a negócios.

Em 2011 dei à estampa um livro. Chama-se “O Alfa das 10 e 10”. Já nesse livro alguém se lembrava de vender ar da Serra da Estrela, aliás com enorme sucesso, como se pode ver pelo trecho que transcrevo: «Eis, pois, que o terno passou a deslocar-se semanalmente à Guarda, às vezes mais que uma vez por semana, donde traziam o carro atulhado de garrafas e garrafões de plástico cheios de ar puro da Serra que, depois, iam vendendo a quem tivesse dificuldades respiratórias, três euros a garrafa, dez euros o garrafão, se devolvessem o vasilhame tinham desconto de cinquenta cêntimos, meus amigos, aquilo vendia-se como pão na padaria, quando havia padarias, naturalmente, podem não acreditar mas eu posso assegurar-vos que houve pessoas que passaram a sentir-se melhor, a respirar sem dificuldade, algumas houve a quem o médico garantiu, doença pulmonar obstrutiva crónica? Nem pense nisso! Os seus pulmões estão limpos como a palma da minha mão, grande coisa é a psicologia, o terno voltou a encher-se de dinheiro, e já pensava em comprar uma carrinha (…).” Claro que não me passa pela cabeça reclamar “direitos de autor” até porque, provavelmente, já outros tinham tido a ideia antes de mim. O que importa assinalar, é: quando se vende um produto com determinadas características, não é ao vendedor que recai o ónus da prova dessas características? Não se pode vender pasta “medicinal” mas pode-se vender ar “abençoado”? “Abençoado”, por quem?  E é mesmo de Fátima? Tem certificado de garantia? O ar é vendável, seja abençoado ou poluído, passe a redundância? Será que, em nome das coisas ditas sagradas se pode burlar impunemente como, aliás a própria Igreja faz?

Pelo que vejo nas redes sociais, há quem ache “brilhante”, a ideia. Não admira: quem come uma rodela de pão ázimo julgando que é corpo e sangue de um tipo qualquer, também embarca no ar “abençoado”. Basta que goste de ser enganado.

8 de Junho, 2016 José Moreira

As Minhas Perplexidades…

…entroncam, certamente, na minha ignorância. Ou derivam dela.
Tenho seguido, com a atenção possível, o verdadeiro milagre da Ciência que foi o nascimento de um ser cuja mãe se encontrava em morte cerebral há quinze semanas. E, concomitante com o meu espanto, várias perguntas surgem no meu já cansado cérebro: o que é, afinal, a Vida? Será possível, afinal, a vida artificial? O cérebro é o centro nevrálgico de todo o corpo, sem cérebro não há vida, mas aqui houve. E a Morte, o que é a morte, afinal? Os crentes garantem que existe uma alma, que se separa do corpo quando este morre. No caso concreto, quando foi que a dita alma se separou do corpo? Foi por vontade de Deus, ou foi por vontade da Ciência? Já agora: onde é que Deus entra, nesta história? É ele o “senhor” da vida e da morte, ou deixou essa incumbência para o Homem? Ou será que, mais uma vez, se prova que essa treta de Deus é isso mesmo: uma treta?

3 de Junho, 2016 José Moreira

O Padre e a Beata

  1. O padre lamenta-se de ser perseguido por uma beata.
  2. No lugar do padre, também me lamentaria, se fosse perseguido por uma mulher de 66 anos e, ainda para mais, beata.
  3. O padre não quer nada com a beata.
  4. Logo, e pela lógica, o padre rezou a Deus para que o livrasse da beata perseguidora.
  5. Pelos vistos, Deus não ligou ao padre, porque a beata continua a perseguição.
  6. No entanto, outras ilações de podem tirar, a saber:
  7. Rezar não serve rigorosamente para nada, já que não se vislumbram resultados das rezas.
  8. Rezar dá resultado, sim senhores, mas Deus escreve direito por linhas tortas. Ou seja, Deus quer mesmo que o padre salte para a cueca da beata.
  9. No lugar do padre, eu desobedeceria a Deus, pois foi para isso que ele me atribuiu o “livre-arbítrio”.
  10. Além de desobedecer, recorreria à Justiça terrena, já que, ao que se vê, e apesar de tudo, ainda funciona melhor que a divina.