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Dia: 29 de Julho, 2015

29 de Julho, 2015 Carlos Esperança

NÃO ACREDITO NO QUE REZA O PAPA FRANCISCO

Por

PEDRO TADEU , in DN

No dia 6 de outubro de 1973 deixei de acreditar em Deus. Aos 9 anos de idade perdi o meu pai, morto num fortuito acidente de automóvel. Hoje, dia 28 de julho de 2015, depois de acumular mais 42 anos de experiência em inúmeras tristezas e alegrias, estou sem acreditar em Deus.

Nem a literatura, nem a arte, nem a teologia, nem a filosofia, nem a história, nem a política, nem a ciência, nem as amizades, nem a maturidade, nem, em suma, a vida, conseguiram contrariar a retórica de negação divina associada às perguntas que formulei naquele dia, inocentes, ignorantes, infantis:

“Se Deus existe e é omnisciente, porque lhe é indiferente a guerra, a fome, a doença, a miséria?”

“Se Deus existe e é omnipresente, porque não olha para a injustiça, para a escravidão, para a violência?”

“Se Deus existe e é omnipotente, porque deixa as crianças sofrerem?”

“Se Deus existe e tudo pode, tudo controla e tudo sabe, porque matou o meu pai?”

Se a justificação para a prevalência da crueldade divina, brutalmente revelada à minha candura infantil, estava escondida por um mistério de fé, cínico na sua transcendência inumana, mais valia não procurar a sua revelação.

O egocentrismo do meu sofrimento, o abismo da minha orfandade, revelaram-me um código social: se Deus existia, então ou era mau ou era indiferente às agruras do Homem e da Mulher. Por essa razão mais valia ignorarmos Deus. Mais valia, seguramente, sermos todos e todas órfãos de Pai.

Deveríamos tentar encontrar o divino em nós, na capacidade coletiva de construirmos um presente digno para as nossas vidas e um futuro esperançoso para a perpetuação da Humanidade, guiados pela justiça, pela bondade, pela busca incessante da felicidade. Pelo bem de todos nós, não para o bem de Deus.

O papa Francisco fala arrebatadoramente como homem de justiça na Terra. O papa Francisco, porém, tem todas as suas palavras contaminadas pelos mandamentos de um Deus inviável, lá do Céu.

As apaixonadas intervenções que o papa faz contra a exploração capitalista do mundo, a defesa do acesso ao trabalho, a crítica feroz ao monopolismo ideológico, a denúncia assustada das agressões ambientais ao planeta, são um valor precioso no presente de todos os homens, pois contrariam a avalanche para o inferno na Terra em que estamos a precipitar-nos.

Estou de acordo com o que diz o papa Francisco. Não posso estar de acordo com o que o reza o papa Francisco: a fé em Deus destrói a Humanidade. O passado e o presente comprovaram-no milhares de vezes, ao longo de milhares de anos, e a minha pequena vida afirma-o, claramente, desde 6 de outubro de 1973… Lamento.