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Mês: Julho 2012

31 de Julho, 2012 José Moreira

Farinha do mesmo saco

Se nós dermos uma vista de olhos pelas doutrinas religiosas, não nos é difícil verificar que, com ligeiras variações, todas acabam por vender o mesmo tipo de produto. E nem sequer vale a pena estarmos a dissecar que tipo de produto vendem: nada que preste.

No entanto, numa questão todas são unânimes: a mulher está abaixo de cão.

Desta vez, foi um rabino que explicou qual o lugar que compete à mulher. Mas não se limitou a afirmar, explicou as razões da sua afirmação.

Foi um rabino. Mas poderia ter sido um “mullah”, ou um bispo. A farinha sai toda do mesmo saco.

 

31 de Julho, 2012 Carlos Esperança

Os milagres do santo

Disponho de vários quartos de hóspedes. Um sábado à tarde, chegaram alguns para assistir a uma festa na minha aldeia e pediram-me que os deixasse tomar o pequeno-almoço o mais tarde possível no dia seguinte.

Ler o que o defunto ainda faz, depois de ter sido um fascista em vida, neste depoimento.

31 de Julho, 2012 Luís Grave Rodrigues

Citações

30 de Julho, 2012 Carlos Esperança

ESTATÍSTICAS E CRENÇA

Por

ONOFRE VARELA

O meu último texto “O Bosão de Higgs” mereceu, de um tal Cínico — atento leitor do Diário de Uns Ateus  —, relativamente à parte final onde digo “é curioso notar que os países de raiz católica são os que, estatisticamente, têm uma pior opinião da Ciência”, a crítica de que não apresentei as fontes da estatística mencionada.

Tem toda a razão. Faço-o agora para sua satisfação.

Colhi a informação no jornal espanhol El País (págs. 30 e 31, da edição do dia 24 de Julho de 2012) numa notícia com o título “Ciencia: la fe del que no sabe”, onde se tornam públicos os resultados de um inquérito promovido pela Fundacion BBVA, divulgado no dia anterior, onde se reflectia a relação dos espanhóis com a investigação
científica. O inquérito entrevistou 1500 pessoas por país, em 11países (Estados Unidos da América, República Checa, Polónia, Alemanha, Áustria, Dinamarca, Itália, Holanda, França, Reino Unido e Espanha) totalizando 16500 pessoas. A notícia é complementada com um exaustivo quadro que responderá em pormenor à curiosidade científica do Cínico, pelo que lhe sugiro a consulta do jornal referido, emwww.elpais.com
(embora eu tivesse lido a edição em papel, que compro diariamente).

Feito este aditamento ao meu último texto, penso ter respondido ao amável leitor Cínico, tão interessado nas coisas da Religião e da Ciência, e aproveito o resto do espaço que me é concedido para dizer mais o seguinte, a respeito das coisas importantes como, por exemplo, a “importância das estatísticas”.

A importância das coisas tem a exacta medida que nós lhe queiramos (ou soubermos) atribuir. Dou o exemplo da arte. Um objecto de arte só é arte se os olhos que o observam assim o entenderem e descodificarem. Se o observador não estiver sensibilizado para a arte, a arte não existe (para aquele observador), embora exista o objecto.

A dimensão das coisas importantes é sempre essa. Ela tem de partir de uma base cultural, ou antropológica, que atribua importância àquela coisa, caso contrário existe a coisa, mas não existe a escala de importâncias onde a coisa pode ser medida, apreciada, catalogada e referenciada. Esta escala de valores é-nos transmitida pela cultura da
sociedade onde nos inserimos, quer seja a cultura local (antropológica) ou a cultura universal, mais abrangente, academicamente adquirida, e que faz do seu detentor um verdadeiro conhecedor… isto se, entretanto, não for atropelado por interesses
desfavoráveis ao verdadeiro conhecimento…

O que acontece com o “conhecimento” transmitido pelas religiões é coisa diferente, e pertence ao chamado “conhecimento iniciático” reservado a membros de seitas secretas ou grupos de religiosos. A escala dessa medida religiosa é-nos formatada na mente desde tenra idade por ensinamentos aferidos pela sociedade que nos concebe e produz, e é independente dos conhecimentos universais, como Matemática, Filosofia, História, Geografia ou Línguas.

Dou este exemplo: um crucifixo tem, para um cristão, rigorosamente o mesmo valor religioso que um tótem toscamente esculpido num tronco de árvore, tem para o índio norte-americano, e uma vaca para um fanático do Sri Lanka. Um católico pode considerar uma estupidez adorar uma vaca e beber-lhe a urina com fé religiosa, mas ajoelha com o mesmo fervor religioso diante de uma imagem de Fátima e de uma cruz com a representação de uma figura humana sofredora escorrendo sangue! E engole uma fina rodela de farinha, convicto de estar a deglutir o corpo do seu deus, exactamente com o mesmo fervor religioso dos fanáticos do Sri Lanka quando bebem urina das vacas consideradas animais sagrados!

É nesta adoração de elementos criados por ritos e intenções religiosas, que se encontra o verdadeiro valor das acções de religiosidade e fé. Elas são matéria de estudo de sociólogos e antropólogos que as olham com o mesmo interesse intelectual com que o
entomólogo francês Jean-Henri Fabre (1823-1915) olhava para as moscas.
Para além do valor etnológico e antropológico que faz a essência e a identificação genuína de um povo, os rituais de fé só valem pela função psicológica do efeito placebo que produzem (quando produzem, e se produzirem). A importância das religiões termina aí. A sua parte mais visível fica-se nas práticas terreais, folclóricas e sazonais.

O etéreo, o encontro real com Deus ou santos num lugar excepcional, num paraíso ou num poço infernal, para além da morte, é fábula sem quaisquer resquícios da mínima realidade. Insistir na veracidade de Deus, dos santos interventores (os eternos intermediários parasitas), e na vida além túmulo, é fábula, é paranoia, é estupidez e ignorância nata, debilidade mental… ou fé!…

Mas também pode ser poesia!…
Deus é uma criação humana. De Deus apenas existe o conceito voando dentro da cabeça do crente. Fora da cabeça das pessoas religiosas não há Deus em lado algum. Não existindo Deus, os homens criaram a paranoia de falarem por ele, com a mesma convicção de uma criança que brinca aos supermercados, cobrando pelos artigos que vende, sem possuir artigos, nem caixa registadora, nem clientes.
E depois, aqueles que brincam às religiões e às ladainhas, fazem do acto de brincar aos deuses a coisa mais importante do mundo! Mas pior do que isso é quererem impor a sua brincadeira a toda a comunidade, convictos de que é verdadeira a ideia de Deus fora das
suas cabeças, e que não há no mundo nada que se lhe compare em termos de seriedade e importância!…

É obra!?…
Querem fazer-nos crer que a divindade não só existe, como nos criou, nos protege, nos guia, nos controla, nos espia, nos premeia, nos castiga… e que todos nós estamos obrigados a crer fervorosamente nestas tretas!

E zangam-se connosco se recusarmos acreditar nessas patranhas! Inclusive, apelidam-nos de “odiosos” (mesmo sem nos conhecerem pessoalmente para poderem aquilatar do nosso amor ou do nosso ódio, o que me leva a supor que nos medem pelos suas próprias escalas e estaturas mentais) só porque não dizemos ámen com eles!

Continua a ser obra!…
Pior ainda: os fundamentalistas islâmicos, quando zangados, degolam excelentes cidadãos por isso mesmo… e assassinam, através de actos terroristas, gente anónima, animados pela convicção de as vítimas serem “infiéis”, e que Deus quer vê-las mortas!…
Terrorismo e demência em nome do bom Deus!
Disto que acabei de dizer, não tenho estatísticas.
Apenas tenho raciocínio. Serve?!…

30 de Julho, 2012 José Moreira

A senhora ministra confessou-se…

Eu já andava desconfiado. A sério. Depois de ter proclamado a sua fé, a senhora ministra remeteu-se ao recolhimento esperando, talvez, que a chuva viesse. Porque a fé sempre há-de valer para alguma coisa, não é verdade? Mas o raio da chuva não veio e a senhora ministra resolveu mudar de tática, porque, certamente, alguém lá em cima não acreditou na fé da senhora ministra. Assim, e para que não restassem dúvidas, proclamou urbi et orbi que está na política porque é cristã.

Pois.

A mudança de tática é compreensível, não vá dar-se o caso de alguém, lá em cima, ter lido a Constituição da República Portuguesa e ter concluído – erradamente, claro – que estávamos num país laico. Ora, a assim ser, o S. Pedro, que é o que manda nestas coisas da chuva e do bom tempo, deve ter-se sentido desobrigado de molhar o país (se calhar, entendeu que não seria necessário, dado isto estar a meter água por tudo quanto é sítio, mas isto sou eu a pensar…), já que aquela declaração de fé pode ter cheirado a discurso político. E nós sabemos que os políticos, enquanto tais, são sérios candidatos a uma estada no Inferno. O que lhes vai valendo ainda são essas coisas da religião.

Mas não. A senhora ministra reiterou as suas convicções fortemente católicas, pelo que a sua situação é mais de apostolado do que de ministério. Ou então, é de ministério da Igreja, e assim já se compreende.

Por isso, S. Pedro, podes mandar água à vontade. Mas não muita, que isto já está a afundar-se…

 

Em simultâneo no “À Moda do Porto

30 de Julho, 2012 Ludwig Krippahl

Treta da semana: o que eles querem sei eu.

O Gonçalo Portocarrera de Almada escreveu que se deve promover, «com empenho, o direito à liberdade de todos os cidadãos» e que «um compromisso conjugal definitivo não só não é uma excepção a essa irrenunciável prerrogativa da condição humana, como uma sua excelente e muito meritória realização. Compete ao Estado garantir que a todos sejam dadas todas as condições necessárias para que as suas opções sejam verdadeiramente livres, mas não lhe cabe impedir aquelas escolhas que, mesmo não devendo ser exigidas a todos, podem legitimamente ser queridas por alguns. Um ordenamento jurídico que proíbe qualquer compromisso sério, como é o que pressupõe uma entrega definitiva, com o pretexto de assim salvaguardar a autonomia dos cidadãos, não é apenas uma lei paternalista, mas uma norma que não respeita a liberdade dos indivíduos e que, neste sentido, é potencialmente totalitária.» (1) Estou inteiramente de acordo. O Estado deve respeitar o direito das pessoas de assumir «um compromisso conjugal definitivo» e não deve proibir um compromisso sério a quem o quiser assumir.

É isso que o Estado português faz. Quando duas pessoas se casam, são só essas pessoas que decidem quão definitivo e sério é o seu compromisso. O Estado não as obriga a divorciar-se por estarem casadas há tempo demais nem o notário recusa oficializar um casamento só por os nubentes declararem que é para a vida toda. É como quiserem. É por isso estranho o Gonçalo afirmar que «Quando o Estado e as instituições internacionais […] não permitem a possibilidade jurídica de um matrimónio civil indissolúvel […] incorrem na mais insanável contradição porque, em nome da liberdade, combatem uma das suas mais nobres e altruístas expressões.» Lido à letra, isto não faz sentido porque proibir os contractuantes de dissolverem o contracto não lhes dá mais liberdade. Pelo contrário. Neste caso, tira-lhes a liberdade de serem, aos 40 ou 60, diferentes do que eram aos 18 ou aos 25.

Mas o Gonçalo é padre católico e não deve gostar de usar os termos com o seu significado literal. Neste caso, parece usar o termo “liberdade” no estranho sentido de “o Estado obrigar alguém a ficar casado, mesmo que já não queira, só porque assinou um papel”. Isto para um profissional da reinterpretação bíblica não é façanha nenhuma (2) mas, para leigos como eu, é confuso. Afinal, ser livre não é o mesmo que ser obrigado. Além disso, leis que obriguem a permanecer casado quem já não quer não trazem vantagens aos envolvidos e desperdiçam o dinheiro dos impostos. O único benefício é para pessoas como o Gonçalo.

As religiões, que não são a fé de cada um mas as instituições que a regulam, são organizações peculiares. A maioria das organizações, sejam clubes de futebol, empresas ou partidos políticos, divide os seus esforços entre os seus objectivos e os meios para os conseguir. Mas os objectivos das religiões são, literalmente, do outro mundo. Por isso, neste acabam por dedicar todos os esforços aos meios, que passam a ser os próprios fins. Dinheiro, poder e influência. É daqui que vêm as tentativas constantes de meter o bedelho na vida das pessoas. O Gonçalo lamenta o «laicismo que pretende relegar a fé cristã para a intimidade das consciências, ou os esconsos das sacristias», mas é precisamente aí que a fé pertence. Na intimidade e nas igrejas. Nunca na lei. Fazer da fé pessoal uma norma social viola o direito de ter fé, o direito de não a ter e o direito de mudar de ideias. Além disso, é um perigo. Muita gente julga que a religião é terrível no Irão, Afeganistão ou Arábia Saudita por serem muçulmanos mas que os cristãos são porreiros. Isto é um erro. Qualquer religião é tão terrível quanto puder. O cristianismo dá exemplos que baste, ao longo da história, e mesmo o catolicismo do século XXI o demonstra repetidamente com casos como a lavagem de dinheiro no Vaticano, o encobrimento da violação de crianças e a perseguição do racionalismo.

Na Índia, Sanal Edamaruku mostrou que a água milagrosa que brotava de uma estátua de Jesus não vinha de Deus mas sim de um cano entupido. Como a lei de lá pune quem “magoa sentimentos religiosos”, os bispos católicos querem mandá-lo já para a prisão enquanto aguarda julgamento (3). A diferença entre a situação na Índia e em Portugal não está no catolicismo, que é o mesmo, nem nos padres, que defendem a mesma ideologia. A diferença está na sociedade e na lei. A religião católica é menos tolerante na Índia porque pode e só é mais tolerante cá porque não tem outro remédio.

Muitos, crentes e não crentes, protestam contra o “ateísmo militante” por criticar religiões e dizer mal das crenças das pessoas. Mas é preciso. A fé é um substrato fértil para estas organizações que visam impor a todos as suas ideologias e ficções, e só uma pressão contrária constante pode manter a fé na esfera privada, onde pertence e onde só faz mal a quem quer. Por isso, e por muito repetitivo que seja, é preciso continuar a desmascarar estas demagogias. Os religiosos profissionais vão sempre lutar por mais poder, seja para obrigar uns a ficar casados, proibir outros de casar, regular a sexualidade ou o que mais conseguirem. Nunca vão reconhecer que todos temos o direito de mudar de opinião, seja no casamento, seja na fé ou religião. Se convencem a sociedade que renunciar ao direito de mudar de opinião acerca do casamento é um exercício de liberdade, é mais fácil fazerem o mesmo com a fé a tornar a apostasia num crime. Ou a blasfémia, ou tudo o que não lhes der jeito. Só param onde os pararmos.

1- Gonçalo Portocarrero de Almada, A opção por um matrimónio civil indissolúvel, via Senza
2- Por exemplo, como Deut. 21, 18-21:«Se alguém tiver um filho rebelde e incorrigível, que não obedece ao pai e à mãe e não os ouve, nem quando o corrigem, o pai e a mãe pegarão nele, levá-lo-ão aos anciãos da cidade para ser julgado. E dirão aos anciãos da cidade: “Este nosso filho é rebelde e incorrigível: não nos obedece, é devasso e beberrão”. E todos os homens da cidade o apedrejarão até que morra. Deste modo, eliminarás o mal do meio de ti, e todo o Israel ouvirá e ficará com medo.»
3- Slate, Jesus Wept e New Humanist, Sanal Edamaruku update: Indian Catholics demand apology over miracle debunking

Em simultâneo no Que Treta!

29 de Julho, 2012 Carlos Esperança

A virgem Maria (R)

A Virgem Maria, farta das companhias e do Céu, onde subiu em corpo e alma, aborrecida do silêncio e da disciplina, cansada de quase vinte séculos de ociosidade e de virtude, esgueira-se às vezes pela porta das traseiras e desce à Terra.

Traz a ladainha do costume, a promoção do terço de que é mensageira e ameaças aos inocentes. Poisa em árvores de pequeno porte, sobe aos montes de altitude moderada e atreve-se em grutas, pouco recomendáveis para a virgindade e o reumatismo, sempre com o objectivo de promover a fé e os bons costumes, de abominar o comunismo e anatematizar os pecados do mundo.

A receita é sempre a mesma: rezar, rezar muito, rezar sempre, que, enquanto se reza não se peca. Não ajuda a humanidade mas beneficia o destino da alma e faz a profilaxia das perpétuas penas que aos infiéis estão reservadas no Inferno.
Surpreende que, sendo tão vasto o mundo, a Virgem Maria só conheça os caminhos dos seus devotos e abandone os que adoram um Deus errado e odeiam o seu divino filho que veio ao mundo para salvar toda a gente.

Fica-se pela Europa, em zonas não contaminadas pela Reforma, aventura-se na América Latina, eventualmente visita a África e nunca mais voltou a Nazaré e àqueles sítios onde suportou os maus humores do seu divino filho e as desconfianças do marido. Ficando-lhe as viagens de graça, por não precisar de combustível, não se percebe que não volte aos sítios da infância, não vá em peregrinação ao Gólgota, não deambule pela Palestina e advirta aqueles chalados de que o bruto e ignorante Maomé é uma desgraça que se espalhou pela zona como outrora a peste, que a única e clara verdade é o mistério da Santíssima Trindade.

Por ter hora marcada ou para não se deixar seduzir pelas tentações do mundo, a virgem Maria regressa ao Céu, depois de exibir uns truques e arengar uns conselhos, sem dar tempo a que alguém de são juízo a interrogue, lhe pergunte pela saúde do marido e do menino e lhe mande beijos para os anjos e abraços aos bem-aventurados que estão no céu.

Um dia a Virgem Maria, com mais tempo e autonomia de voo, encontra um ateu e fica à conversa. Há-de arrepender-se dos sustos que prega, das mentiras que divulga e chegar à conclusão de que o terço faz mal às pessoas, estimula o ódio às outras religiões e agrava as tendinites aos fregueses.