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Dia: 5 de Abril, 2009

5 de Abril, 2009 Carlos Esperança

A canonização de Nuno Álvares Pereira

COMUNICADO da AAP

A Associação Ateísta Portuguesa (AAP) ficou perplexa com a canonização de Nuno Álvares Pereira, mas fica absolutamente indignada com a cumplicidade que os mais elevados dignitários de Portugal, nomeadamente o Sr. Presidente da República, emprestam ao acto que, na opinião desta Associação, é uma burla pueril.

A AAP entende que o prestígio do Condestável não se dilata com o alegado milagre e que, se deus existisse, podia mais facilmente ter evitado os salpicos do óleo que queimaram o olho esquerdo da D. Guilhermina de Jesus, enquanto fritava o peixe, do que ter de a curar para o beato virar santo.

A AAP duvida da capacidade de um guerreiro morto, apesar de ilustre, para actuar como colírio e duvida de D. Guilhermina, que se lembrou de recorrer à intercessão de um herói, sem antecedentes no ramo dos milagres, em vez de procurar um oftalmologista.

Mas o que a AAP repudia veementemente, salvo o devido respeito, é a atitude do Sr. Presidente da República, Professor Cavaco Silva, que aceitou integrar a Comissão de Honra para a canonização de Nuno Álvares Pereira, que vai ter lugar a 26 de Abril, em Roma.

O Estado laico, condição essencial de uma democracia, fica, na opinião da AAP, irremediavelmente comprometido com a participação do PR que, de algum modo, estabelece uma lamentável confusão entre as funções de Estado e os actos pios do foro individual.

Que Sua Excelência acredite na cura milagrosa do olho esquerdo da D. Guilhermina, a nível pessoal, é um direito que a AAP defende, mas que participe, em nome de Portugal, num acto de marketing e no obscurantismo religioso da Igreja católica, é uma posição que nos entristece e nos envergonha como cidadãos.

A AAP denuncia a manobra obscurantista em curso e apela ao espírito crítico dos portugueses para que não creiam em afirmações infundadas ou, pelo menos, façam a distinção entre as crenças pessoais e o reconhecimento estatal da superstição.


Associação Ateísta Portuguesa
– Odivelas, 05 de Abril de 2009

5 de Abril, 2009 Ricardo Alves

O regresso (oportunista?) do Condestável

Quem conhece a História da 1ª República e do papel que desempenhou no apressar do seu final uma organização chamada «Cruzada Nacional Nuno Álvares Pereira», não pode deixar de ficar incomodado por ver na «Comissão de Honra» da «Canonização» desse cavaleiro medieval o Presidente da República, o Presidente da Assembleia da República, o ministro dos Negócios Estrangeiros e o Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas.

Evidentemente, não se questiona o direito individual a acreditar em intercessões de além-túmulo seja de quem for, mesmo com a finalidade comezinha de curar uma queimadela de óleo de fritar peixe. Simplesmente, quem ocupa altos cargos de um Estado democrático e laico apenas deveria participar neste género de homenagem, se a consciência a isso o obriga, como cidadão privado e discreto, sob risco de estar a comprometer-se numa manobra que poderá ter aproveitamentos políticos e religiosos perigosos e indesejáveis.

Um Estado laico não patrocina crenças nem religiões; não promove igrejas nem cultos. A «canonização» de Nuno Álvares Pereira deveria ser um mero assunto privado entre os crentes católicos e a sua igreja, que decidiu certificá-lo com poderes de curandeiro post mortem, na curiosa data de 26 de Abril. Que algumas das principais figuras do Estado endossem esta campanha clerical, a pouco mais de um ano do centenário da implantação da República, demonstra que não têm memória histórica da exploração nacionalista que o Estado Novo fez desta figura, e que não compreendem que a laicidade não é a mera separação entre Estado e igreja.

[Esquerda Republicana/Diário Ateísta]